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Zé Dirceu | Ataques à liberdade de imprensa não deixam dúvidas da necessidade de deter escalada golpista de Bolsonaro

Governo vem usando Lei de Segurança Nacional contra qualquer um que ousar apontar seus crimes
José Dirceu
Poder 360
São Paulo (SP)

Tradução:

Há uma crescente violação das leis, dos direitos e garantias constitucionais e do caráter republicano das instituições, colocando-as serviço do governo. Há o uso e abuso da LSN para calar a liberdade de expressão e manifestação. Crescem os ataques a jornalistas, órgãos de imprensa e comunicadores.

Nos últimos meses, e mais intensamente nas últimas semanas, assistimos a uma escalada repressiva por parte do governo Bolsonaro, que não hesita em usar a Lei de Segurança Nacional, entulho autoritário herdado da ditadura militar. O ovo da serpente é o Gabinete de Segurança Institucional. O objetivo é recriar uma polícia política sob a coordenação do ministro da Justiça, Anderson Torres, como denuncia um grupo de delegados da Polícia Federal, instituição capturada e colocada a serviço da família Bolsonaro e dos objetivos autoritários e golpistas do governo.

Há uma crescente violação das leis, dos direitos e garantias constitucionais e do caráter republicano das instituições, colocando-as a serviço do governo. No caso concreto, com o objetivo de atingir governadores, abastecendo senadores bolsonaristas da CPI da pandemia com informações de inquéritos policiais e/ou investigações nem sempre legais.

Governo vem usando Lei de Segurança Nacional contra qualquer um que ousar apontar seus crimes

Reprodução: Sérgio Lima / Poder 360
Bolsonaro com apoiadores, em frente ao Palácio do Planalto: para José Dirceu, objetivo é o golpismo

Nas iniciativas de criminalização do direito de manifestação e de opinião, os alvos são jornalistas, comunicadores e, como vemos agora, lideranças indígenas. De novo a origem da ofensiva repressiva está no GSI: seu titular, o general da reserva Augusto Heleno, em postagens nas redes sociais, acusou a líder Sonia Guajajara e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) de, por meio do que ele chama de fake news, atribuir ao presidente da República crimes ambientais.

O palavreado do general lembra aquele da ditadura militar e da guerra fria. Para ele, trata-se de crime de lesa pátria, diz que o site Rede Livre, que hospeda a Apib, e seus associados –Mídia Ninja, Fora do Eixo e Soyloporti– são comunistas e denigrem a imagem do Brasil no exterior. Tudo não passaria de uma grande piada se não fosse o pedido do presidente da Funai, Marcelo Xavier, à PF para abertura de inquérito policial contra lideranças indígenas, como Sônia Guajajara e Almir Narayamoga, líder do povo Surui de Cacoal, em Rondônia.

Perseguição a jornalistas

A 2ª frente de ataque vem sendo dirigida a jornalistas e comunicadores com o uso e abuso da LSN e de ações na Justiça. Estas vêm crescendo ano a ano desde que o STF, em 2009, revogou a Lei de Imprensa, outro entulho da ditadura, deixando a garantia da liberdade de expressão limitada aos princípios gerais da Constituição Federal, sem parâmetros para balizar as decisões judiciais. Nos últimos meses Aroeira, Ricardo Noblat, Helio Schwartsman e Felipe Neto foram ameaçados de enquadramento na famigerada LSN.

As entidades representativas dos jornalistas, como Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e Repórteres sem Fronteiras, publicaram relatórios que atestam o crescimento dos ataques e ameaças a jornalistas no governo Bolsonaro. E a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), centenária e respeitada entidade, entrou mês passado com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no STF para garantir a liberdade de expressão e coibir o aumento avassalador de ações na Justiça por dano moral e direito de imagem movidas contra jornalistas e órgãos de imprensa.

Na Justiça de 1ª Instância, e mesmo nos tribunais superiores, há uma crescente criminalização da atividade jornalística, com condenações a indenizações vultuosas que estão levando à asfixia financeira de jornalistas, sites e blogs da imprensa independente, que não têm musculatura como os veículos da grande imprensa para pagar advogados e arcar com as reparações exigidas. A profissão, sob o governo Bolsonaro, se torna cada vez mais de risco e perigo.

A escalada contra a imprensa ganhou uma gravidade tal que o MPF solicitou análise do risco de jornalistas que cobrem o presidente da República, vítimas da hostilidade do presidente, incentivo permanente à violência de seus apoiadores contra jornalistas no exercício de sua profissão. O maior exemplo é o da jornalista Patrícia Campos Mello que, depois de ser agredida verbalmente pelo presidente Bolsonaro de forma pusilânime, sofreu insultos e ameaças numa campanha orquestrada e massiva nas redes sociais.

Nos últimos dias, assistimos ao aumento da violência contra manifestantes e mesmo cidadãos nas ruas e a atos de violência contra entidades sindicais. Dois exemplos saltam à vista: a invasão, em 3 de maio, da sede do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santarém por madeireiros; e o espancamento, em 1º de maio, na praia da Boa Viagem em Salvador, do vereador do PT Lucimauro Oliveira por ativistas bolsonaristas pela simples razão de que vestia uma camiseta com a palavra de ordem “Lula Livre”.

Objetivos golpistas

Para quem ainda tem dúvidas sobre os objetivos golpistas de Bolsonaro e seu entorno militar –Braga Netto com seu discurso na posse dos novos comandantes das 3 armas e Augusto Heleno à frente do GSI–, as declarações de Eduardo Bolsonaro elogiando o presidente de El Salvador, Nayib Bukele, são mais do que um ponto de inflexão. O novo Parlamento daquele país, onde Bukele tem a maioria, aprovou a destituição dos 5 ministros da Corte Suprema e do procurador geral da República que tomaram decisões contrárias ao presidente. Para Eduardo Bolsonaro, foi “tudo constitucional”. Em seu perfil de rede social, escreveu: “Juízes julgam caso, se quiserem ditar políticas que saiam às ruas para se elegerem”. Para bom entendedor basta. Pena que ele exclui os militares de seu ditado.

O estímulo cada vez maior à violência e ao ódio, ainda que até agora malsucedido, e o apoio às manifestações, em plena pandemia, contra as instituições e pregando intervenção militar praticamente quase todos finais de semanas nos últimos meses e as repetidas falas do presidente ameaçando o país com o caos social não deixam dúvidas da urgente necessidade de união de todos democratas para deter essa escalada golpista. Não bastam apenas denúncias. É preciso exigir do Congresso Nacional e da Suprema Corte que coloquem um fim a esse atentado contra a Constituição Federal.

São bem-vindas as iniciativas de revogar a LSN e aprovar uma Lei de Defesa do Estado Democrático que, esperamos, seja uma lei que garanta, de fato, as liberdades de expressão e manifestação. E não uma nova versão da legislação da ditadura para reprimir a liberdade de expressão, organização e manifestação, as redes, o jornalismo, os movimentos sociais e sindicatos, a oposição.

Não devemos jamais subestimar Bolsonaro e seus objetivos golpistas: sua busca incessante para capturar órgãos de Estado como PF, Coaf, Receita Federal e MPF; transformar o CGI e o Ministério da Justiça em um novo SNI-Deops; e criar as condições para uma intervenção militar. E sua obstinada campanha de desmoralização das urnas alegando riscos de fraude eleitoral, sua exigência do voto impresso. São ovos da serpente do fascismo que sobrevivem e precisam ser enterrados.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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