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ToggleO Peru violará o direito internacional se aprovar uma lei que deixará de julgar aqueles que cometeram crimes de guerra e de lesa humanidade antes de 1º de julho de 2002, advertiram especialistas em direitos humanos das Nações Unidas em uma declaração divulgada nesta sexta-feira 14.
“A aprovação do projeto de lei 6951/2023-CR, pendente de aprovação no Congresso peruano, impediria o processamento, condenação e sanção penal de pessoas que cometeram tais delitos antes de julho de 2002, impedindo o acesso à justiça, e o direito à verdade e reparação das vítimas”, disseram os especialistas.
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Paralelamente, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CorteIDH) pediu ao Estado peruano que “suspenda imediatamente o trâmite legislativo do projeto de lei número 6951/2023-CR”, para “garantir o direito de acesso à justiça das vítimas dos casos Barrios Altos e La Cantuta”, que este tribunal hemisférico está julgando.
Casos arquivados e Fujimori beneficiado
No Peru, a Junta de Procuradores Supremos no Ministério Público afirmou que se a lei for aprovada, cerca de 600 casos deverão ser arquivados e encerrados. “Deixar na impunidade fatos tão graves que afetam o núcleo duro dos direitos humanos passa uma mensagem errada, lamentável, contrária às normas vigentes, nacionais e internacionais”, afirmaram os procuradores em uma declaração.
No caso Barrios Altos, por exemplo, em 3 de novembro de 1991, um comando do grupo Colina do exército irrompeu em um edifício de Lima onde se realizava uma festa, forçou os presentes a lançarem-se ao solo e massacrou pelo menos 15. Em La Cantuta, setor da capital peruana, o grupo Colina sequestrou e assassinou um professor e nove estudantes universitários em 18 de julho de 1992. Em 2007, o ex-presidente Alberto Fujimori (1990-2000), depois de ser extraditado do Chile, foi julgado e condenado a 25 anos de prisão por sua responsabilidade no massacre.
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Fujimori, de 85 anos, solto em dezembro passado ao amparo de um indulto concedido por razões humanitárias – a Corte Interamericana se opôs –, e cujos seguidores contam com uma importante bancada parlamentar, seria beneficiado pela lei que está prestes a ser aprovada definitivamente.
Os procuradores também mencionam o caso dos cárceres El Frontón, Lurigancho e Santa Bárbara, onde em função de motins em junho de 1986 foram executados extrajudicialmente mais de 250 internos que eram acusados de terrorismo.
Estatuto de Roma como marco legal
Esses e outros crimes ainda em processo na justiça peruana e internacional ocorreram no contexto da luta entre as forças do Estado peruano e movimentos guerrilheiros de extrema-esquerda. Mas a “Lei que detalha a aplicação e o alcance do delito de lesa humanidade e crimes de guerra (6951/2023-CR)” estabeleceria que podem ser julgados delitos deste tipo só a partir da entrada em vigor no país do Estatuto de Roma que criou a Corte Penal Internacional, isto é, julho de 2001.
O parlamento peruano adotou o texto em primeira leitura em 6 de junho, com 60 votos a favor, 36 contra e 11 abstenções, e sua adoção definitiva poderia ocorrer em segunda votação em questão de dias.
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Os especialistas que agem sob o guarda-chuva do Conselho de Direitos Humanos da ONU, na Suíça, afirmaram que “a adoção do projeto de lei poria o Peru em flagrante contravenção de suas obrigações em virtude do direito internacional”. “Os prazos de prescrição não podem deixar de ser aplicados a violações flagrantes do direito internacional dos direitos humanos e a violações graves do direito internacional humanitário que constituem crimes”, afirmaram.
Lembraram que “a imprescritibilidade dos crimes de lesa humanidade é uma norma de ius cogens (que não admite nem exclusão nem alteração de seu conteúdo, razão pela qual anula qualquer ato contrário) e do direito internacional consuetudinário, à qual não se permite nenhuma derrogação e à qual o Peru deve aderir”. Em resumo, o projeto de lei “choca-se com os valores básicos da comunidade internacional, fomenta a impunidade e está em patente contradição com o Estado de direito”, afirma-se na declaração.
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Os especialistas da ONU que a assinam são Bernard Duhaime, relator sobre a promoção da verdade, justiça, reparação e as garantias de não repetição, e Morris Tidball-Binz, relator sobre execuções extrajudiciais, sumárias ou arbitrárias.
Com eles, as integrantes do grupo de trabalho sobre desaparecimentos forçados ou involuntários: Aua Baldé (presidenta), Gabriella Citroni, Grażyna Baranowska, Ana-Lorena Delgadillo Pérez e Angkhana Neelapaijit.
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A organização humanitária Human Rights Watch (HRW) garante que o projeto de lei “se enquadra em um padrão de ações do Congresso que fomentam a impunidade e desmantelam o Estado de direito” no país sul-americano. “O Congresso do Peru, em que a metade dos congressistas estariam sob investigação penal, tomou uma série de decisões que socavam a independência judiciária, debilitam a luta contra a corrupção e o crime organizado e desmantelam os processos democráticos e as salvaguardas de direitos humanos”, criticou HRW.