Na madrugada entre a última sexta (19) e sábado (20), Inácio da Costa foi celebrar a formatura da sua noiva na concorrida Universidade Central da Venezuela (UCV), na qual ele mesmo é aluno e bem conhecido, já que tem ali uma ampla trajetória política como liderança estudantil.
O dia, planejado para ser festivo, no entanto, se transformou em uma tragédia que, por centímetros, não foi fatal. Da Costa, que é deputado na Assembleia Nacional da Venezuela, pelo partido oposicionista Cambiemos Movimiento Ciudadano e apoia a candidatura de Antonio Ecarri, foi covardemente atacado com uma garrafa quebrada e, por pouco, não ficou paraplégico, como indica investigação preliminar.
Durante o ataque foi ofendido, xingado e difamado. O agressor, ligado à candidatura de Edmundo González (e Maria Corina Machado, inabilitada pela Justiça do país) o acusava de ser diversionista e de fazer uma espécie de linha de apoio da candidatura oficialista de Nicolás Maduro, do Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), que concorre à sua segunda reeleição. No país, a reeleição é constitucionalmente permitida indefinidamente.
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Esses fatos já seriam alarmantes, sobretudo por ocorrerem em meio a uma campanha eleitoral. Mas tem mais! O cidadão que o atacou saiu recentemente da prisão, onde cumpria pena por ter sido considerado um dos responsáveis pelo assassinato, em 2014, do deputado do PSUV Robert Serra e de sua assistente María Herrera, fato que comoveu a sociedade venezuelana na época.
Além de Inácio da Costa: o histórico de violência política na Venezuela
Para nos deter apenas nos 25 anos em que o chavismo está no poder na Venezuela, foram registrados diversos episódios violentos no país entre sanções econômicas, sabotagem e campanhas de desinformação.
Quatro episódios, porém, se destacam pela ocorrência de vítimas fatais: Golpe de Estado de 2002, que deixou ao menos 19 mortos; Protestos de 2014, com 43 falecidos, e de 2017, com 120 mortes, e a tentativa de golpe de 2019, com número indefinido de vítimas.
O que esses momentos têm em comum? Todos foram articulados, idealizados e concretizados por ação da oposição venezuelana que, ao invés de disputar politicamente o poder, optou por ações violentas para destituir o chavismo e destruir as forças relacionadas a ele.
A eliminação do outro na política é a expressão mais tangível do fascismo e, enquanto a mídia brasileira — fazendo coro da campanha internacional contra Maduro — fala em um virtual banho de sangue (a ser perpetrado por chavistas caso o atual presidente perca o poder), é a oposição que comete atos extremos de violência.
Confira a entrevista realizada pela ComunicaSul com Inácio da Costa, diretamente de Caracas:
Vanessa Martina-Silva: Deputado, pode nos contar o que aconteceu no fatídico dia?
Inácio da Costa: Claro! No sábado (20), de madrugada, eu estava saindo da formatura da minha namorada na UCV, em Caracas. Fui atacado por vários indivíduos, entre eles Anthony Vega e John Álvarez. Ambos tiraram uma foto, no mesmo dia, com o candidato presidencial da Plataforma Unitaria (PUD), Edmundo González. Esses indivíduos me atacaram vilmente com garrafas e quebraram uma na minha cabeça.
Depois de me atacar e me derrubar no chão, tentaram me esfaquear várias vezes no rosto e no pescoço. Consegui me proteger com o braço, mas recebi três facadas nele. Eu não estava em um ato político e não conhecia os agressores.
John Álvarez, no entanto, é conhecido por estar envolvido em um caso de conspiração e terrorismo. Após as investigações, descobriram que Anthony Vega é militante de Vente Venezuela e John Álvarez pertence à Bandera Roja, mas também se disse associado ao [partido] Un Nuevo Tiempo, de Manuel Rosales.
Estes indivíduos estão ligados à candidatura da Plataforma Unitaria.
Quão grave foi esse episódio?
Tudo está registrado na promotoria, que está investigando o caso. Segundo o relatório da polícia científica, a facada nas costas quase me matou. As fotos mostram a profundidade dos ferimentos, especialmente no braço, que evitou cortes no pescoço e rosto.
Recebi toda a atenção médica necessária. A promotoria agiu rapidamente e está fazendo um excelente trabalho. O preocupante é que Anthony Vega, recentemente libertado, foi denunciado pelo presidente em rede nacional há 10 anos pelo assassinato do deputado Robert Serra. Este cidadão está livre e é ativista político de um partido da oposição venezuelana extremista. Mas tem viajado o mundo falando de paz e de presos políticos.
E como você vê essa confrontação política e agressão física, que chega ao extremo de tentativa de assassinato? É prática comum na política venezuelana, como dizem ser na política dos Estados Unidos, por exemplo?
Este cenário político de dois blocos em confronto, com mensagens de ódio e extrema violência, afeta os cidadãos e aqueles que pensam diferente, que acreditam em uma nova oportunidade e caminho para restaurar a institucionalidade na Venezuela e promover a paz.
Somos uma terceira via, nossa coalizão nasceu para a paz e o diálogo. Não é a primeira vez que somos atacados, mas seguimos firmes com convicções claras. Esses agressores não são presos políticos, são criminosos na política.
Nós, do partido Cambiemos, buscamos tirar o país do conflito. Somos o partido do pós-conflito e é isso que queremos oferecer. Seguiremos o caminho da democracia, paz e entendimento, mesmo que nos ataquem.
Finalmente, vocês e eles são da oposição, por que eles te atacaram?
Existem várias vertentes no país: dois polos em confronto e nossa posição é moderada, de entendimento. Não pedimos sanções para sufocar o povo nem intervenções estrangeiras. Queremos resolver nossos problemas aqui, dialogando, por via eleitoral.
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Eles têm uma visão política diferente, são anos de abstenção e de protestos. Nós sempre seguimos a rota democrática e eleitoral. Eles não compartilham nossa visão e nos atacam, nos chamando de divisores de votos. Acreditamos na paz e que os venezuelanos merecem uma paz, que deve ser construída por todos. Somos consequentes com nossas ações e continuaremos na nossa rota pacífica e democrática.