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Foto: Ilia Pitalev / Sputnik

Combates próximos à usina nuclear de Kursk são situação “muito grave”, diz órgão internacional

"Sob nenhuma circunstância uma central atômica deve ser atacada", destacou Rafael Grossi, diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)
Juan Pablo Duch
La Jornada
Moscou

Tradução:

Beatriz Cannabrava

Depois de inspecionar na terça-feira (27) os reatores e a sala de controle da central nuclear de Kursk na cidade russa de Kurchatov, a 70 km da fronteira com a Ucrânia, Rafael Grossi, diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), mostrou sua preocupação pelos combates que tropas russas e ucranianas travam nas proximidades da usina.

“Acreditamos que é muito grave que uma central dessa classe esteja tão próxima de uma frente de batalha”, declarou Grossi à imprensa internacional ao final de sua visita. Ele também indicou que os reatores estão expostos a um possível ataque e fez um apelo para que russos e ucranianos adotem medidas de prevenção para evitar uma catástrofe.

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“Sob nenhuma circunstância uma central atômica deve ser atacada” e esta, além disso, carece das “estruturas de defesa e contenção que usinas mais modernas possuem”, enquanto “o núcleo dos reatores se encontra debaixo de um teto normal”, o que o torna “frágil” e “extremamente exposto” a um eventual ataque.

Na opinião do chefe da AIEA, a Rússia e a Ucrânia devem se comprometer a garantir a segurança da central de Kursk, já que um impacto poderia ocasionar “um incidente nuclear, possivelmente com vazamento radioativo”. Grossi, que anunciou que viajará a Kiev para manifestar às autoridades a mesma preocupação, visitou a usina quando se completaram na terça passada três semanas desde que as tropas ucranianas cruzaram a fronteira, no dia 6 de agosto passado, para combater em território russo.

Combates nas regiões de Kursk e Sumy

Enquanto isso, o ministério russo da Defesa admitiu também na terça que o exército ucraniano “continua seus esforços para avançar na região de Kursk” e informou que as forças armadas russas repeliram pelo menos 11 ataques nesse setor da frente de combates.

De acordo com o relatório diário emitido por esse ministério, “continuam as operações de reconhecimento e busca para aniquilar grupos de sabotagem inimigos nos bosques da região de Kursk”, ao mesmo tempo em que a aviação e a artilharia desferiram novos golpes na zona fronteiriça da região ucraniana de Sumy.

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Em seu avanço gradual em direção a Pokrovsk, na parte de Donetsk sob controle ucraniano, o exército russo anunciou na terça que “libertou a localidade ucraniana de Orlivka”, a cerca de 30 km do ponto logístico, o que, segundo analistas militares, sugere que prossegue alargando a frente na tentativa de cercar as tropas ucranianas no local, da mesma forma que estas não descartam cercar as unidades russas no distrito de Glushkovo (Kursk).

Aqueles que acompanham de perto o que está acontecendo nos campos de batalha consideram que a Ucrânia, sem comprometer mais tropas além dos reforços que já enviou, praticamente já não está em condições de avançar mais em Kursk, enquanto a Rússia – que deslocou cerca de 20 mil efetivos de outras frentes, e em menor grau da de Donetsk – também não consegue expulsar os ucranianos de seu território, necessitando de mais 20 mil soldados que no momento não tem disponíveis.

“Ucrânia-2024: Independência”

De alguma forma, isso foi confirmado na terça pelo comandante em chefe do exército ucraniano, Oleksandr Syrskyi, ao participar por videoconferência no fórum “Ucrânia-2024: Independência”, realizado em Kiev, onde disse que o país “continua fazendo progressos”, ocupando “1.294 km² de território inimigo” e “100 localidades russas” em Kursk. Há uma semana eram 92 localidades e 1.250 km².

Segundo Syrskyi, a operação em solo russo evitou que a Rússia lançasse uma nova ofensiva em território ucraniano. “Eles tinham planos de realizar uma ofensiva na região nordeste de Sumy, por isso necessitamos criar uma zona de segurança para impedir uma incursão russa e proteger os habitantes da zona”, explicou.

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No mesmo sentido, manifestou-se o presidente da Ucrânia, Volodymir Zelensky, ao oferecer uma coletiva de imprensa em Kiev, transmitida ao vivo pela plataforma YouTube. “Temos que defender nosso território e, para isso, usamos todos os meios a partir do território da Rússia para que ela não ocupe o nosso”, afirmou Zelensky, após reiterar que não tem intenção de se apropriar de territórios alheios.

O mandatário ucraniano enfatizou que “(o presidente russo, Vladimir) Putin está dando prioridade a tomar mais território no leste da Ucrânia do que defender seu próprio território em Kursk”, o que – em sua opinião – deveria ajudar a comunidade internacional, sobretudo o Sul Global, a entender que “a guerra da Rússia contra Ucrânia não é de caráter defensivo como assegura o Kremlin”.

Ucrânia testa novo míssil balístico

Sem fornecer detalhes, Zelensky anunciou que, por ocasião do recente Dia da Independência, comemorado em 24 de agosto, a Ucrânia “testou com sucesso seu primeiro míssil balístico de produção própria”, o que permitirá atacar alvos na Rússia mais afastados da fronteira. A esse respeito, o vice-chanceler russo, Serguei Riabkov, disse na terça que os Estados Unidos perderam “o que lhes restava de bom senso” ao apoiar a ofensiva ucraniana em solo russo e seus ataques com drones no interior do país.

“O curso da escalada de Washington está se tornando cada vez mais provocativo. Dá a impressão de que nossos colegas (estadunidenses) perderam o que lhes restava de bom senso e acreditam que tudo está permitido. Sua clientela em Kiev opina o mesmo”, assinalou Riabkov à agência noticiosa TASS, advertindo que as consequências para Washington podem ser “muito graves”.

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As notícias que chegaram dos campos de batalha na última quarta-feira (28) não mostraram grandes mudanças desde que as tropas da Ucrânia cruzaram a fronteira e levaram a guerra à região de Kursk: os russos avançaram algumas centenas de metros em direção ao seu objetivo mais importante no momento, que é a cidade de Pokrovsk, na parte de Donetsk sob controle ucraniano, e os ucranianos continuaram consolidando suas posições no território russo ocupado.

Enquanto isso, as agências de notícias relataram vários episódios isolados ocorridos também na quarta-feira e que, por si só, não alteram o curso deste conflito armado nem para o bem, nem para o mal: Kiev seguiu sua estratégia de danificar com drones depósitos de combustível e refinarias em áreas da Rússia distantes da fronteira, e Moscou continuou lançando mísseis, drones e bombas guiadas por aviões contra cidades da Ucrânia.

Ataques atingem depósitos de combustível

Assim, os meios de comunicação ucranianos divulgaram as primeiras imagens dos impactos causados por drones em um depósito de combustível na região de Kirov, o primeiro ataque ucraniano nesta área russa a 1.100 km da fronteira, e em uma refinaria na região de Rostov, que ocasionaram fortes incêndios, confirmados pelos respectivos governadores.

No outro extremo da mesma região de Rostov, um ataque anterior com drones em uma grande refinaria causou um incêndio que, dez dias depois, ainda não podia ser apagado, de acordo com as agências de notícias.

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A Rússia respondeu com bombardeios em cidades ucranianas, sendo o mais grave na quarta-feira e que destruiu com uma bomba guiada um prédio administrativo no centro da cidade de Kupiansk, na região de Kharkiv.

Por volta da uma da manhã da quinta-feira (29), as sirenes foram ativadas nas regiões ucranianas de Kherson, Mykolaiv, Kirovohrad, Dnipropetrovsk, Poltava, Sumy e Kharkiv quando a defesa antiaérea detectou a trajetória de voo de 30 a 40 drones disparados pela Rússia, no que meios de comunicação ucranianos antecipam que seria outra madrugada de muita tensão e horas em refúgios.

Derrubada de caça-bombardeiro Su-25

O comandante das forças terrestres do exército ucraniano, Oleksandr Pavliuk, escreveu em sua conta no Telegram que “nossas unidades de defesa antiaérea voltaram a demonstrar sua perícia ao derrubar um caça-bombardeiro Su-25 perto da cidade de Kramatorsk em Donetsk, que, segundo a agência ucraniana UNIAN, seria o segundo aparelho desse tipo que a Rússia perde desde o final de julho passado”. O ministério da Defesa russo não se pronuncia sobre esse tipo de notícia, mas os blogueiros que apoiam a operação militar especial colocaram em dúvida as palavras de Pavliuk.

O canal do Telegram Operação Z – Enviados da Primavera Russa assegura que o caça-bombardeiro não foi derrubado, mas que ao ser atacado “lançou iscas térmicas” que os ucranianos “em um vídeo incompleto apresentaram como parte da explosão” do avião. Dentro de alguns dias surgirão evidências que confirmem uma ou outra versão.

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Por outro lado, as autoridades russas, levando em consideração as recomendações do diretor do Organismo Internacional de Energia Atômica, Rafael Grossi, que na terça-feira inspecionou a usina nuclear de Kursk em Kurchatov, decidiram “proibir temporariamente o acesso” a esta cidade, pois “as tropas ucranianas não desistiram de sua tentativa de entrar em Kurchatov”, informou o governador de Kursk, Aleksei Smirnov.

Seu colega da região contígua de Belgorod, Vyacheslav Gladkov, resolveu evacuar todos os habitantes de quatro localidades e adiantou que, em todos os municípios que estão a 20 km da fronteira, “as escolas darão aulas à distância”.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Juan Pablo Duch Correspondente do La Jornada em Moscou.

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