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Foto: Vanessa Martina-Silva

Yousef Saif, refugiado palestino no Brasil: “Palestinos viram estatística, mas têm vidas, histórias”

Yousef Saif vive em São Paulo desde 2017 e participou nesta quinta-feira (12) do 1º Encontro Internacional de Territórios e Saberes (EITS), em Paraty (RJ)
Vanessa Martina-Silva
Diálogos do Sul Global
Paraty

Tradução:

O refugiado palestino Yousef Mozahem Yousef Saif estava no ônibus, a caminho da cidade de Paraty, no Rio de Janeiro, quando recebeu a notícia de que a casa onde vivia, na Cisjordânia, Palestina, foi bombardeada pelo exército sionista de Israel.

Ele se diria à cidade fluminense para participar, nesta quinta-feira (12), do debate “Como a vida pode florescer aos genocídios contemporâneos”, uma das atividades do 1º Encontro Internacional de Territórios e Saberes (EITS), que começou no dia 9 e segue até domingo (15).

O palestino vive em São Paulo desde 2017 na condição de refugiado, mas sua família permaneceu na Palestina. Todos os dias recebe informações de que pessoas próximas ou de sua própria família foram assassinadas. “Eles viram estatística, mas são pessoas, têm histórias!”. Após um longo silêncio, diz: “tenho um mar de palavras e não consigo dizer nada”.

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Hoje com 30 anos, nasceu em Jeddah, na Arábia Saudita, onde seu pai trabalhava. Ali ficou até os três anos, quando foi para a cidade palestina de Tulkarm, onde de fato cresceu e foi criado. Teve que deixar sua terra em busca de asilo em razão da pressão e violência impostas por Israel. Músico, toca bouzouki, instrumento da família do alaúde, e participa da Orquestra Mundana Refugi, dirigida pelo músico Carlinhos Antunes.

Sua experiência como alvo do genocídio começou ancestralmente. Sua família está na Palestina há pelo menos 900 anos, ele ressalta. Após a Segunda Guerra Mundial, a Europa se viu no dever moral de ajudar os judeus perseguidos pelo regime de Adolf Hitler, que então foram levados à Palestina. No entanto, acabaram usando a causa dos judeus para realizar a ocupação do território palestino.

“Os britânicos começaram a bombardear as casas porque diziam que aquela era a ‘terra dos judeus’”, afirma. Saif conta ainda que muitos palestinos aceitaram o povo que chegava. Sua bisavó, que era professora, deu terra, comida e dinheiro para alguns deles. Depois de sete anos, “eles queriam matar a minha bisavó porque disseram que eles não tinham mais direito àquela terra. Ou saíam, ou morreriam”.

Então, em “dois dias, eles mataram 20 mil palestinos. Em uma semana, mataram quase um milhão. Minha família teve que fugir, mas minha avó estava grávida do meu pai e, no meio da fuga, embaixo de uma oliveira, ele nasceu”.

Quando tinha 8 anos, o exército israelense invadiu Tulkarm. Fizeram um cerco completo, com corte de água e luz e proibição de acesso de ambulâncias e profissionais da saúde. “Eles entraram com helicópteros e tanques. De repente, a casa do vizinho foi bombardeada. Bombardearam todo mundo na rua, que virou um rio de sangue, um mar de sangue. Foram mais de 13 horas de terror”, recorda Yousef Saif.

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Tulkarm fica localizada a apenas 10 km do litoral. “Eu sempre senti o cheiro do mar, mas nunca pude vê-lo porque existe um muro que nos impede de ir até lá”. Dessa memória surge uma forte conexão com a cidade de Ubatuba, no litoral norte de São Paulo:

“Quando fui fazer uma apresentação com a Orquestra Refugi, eu vi o mar pela primeira vez. Fiquei louco, pedi na hora para parar o ônibus e fui correndo, desesperado. Quando entrei na água eu chorei, chorei muito”.

O plano de Yousef Saif, destruído por Israel

Semanas antes da viagem a Paraty, Saif pediu a um amigo que enviasse produtos palestinos para vender no evento que participaria. Os itens chegaram e o dinheiro arrecadado seria enviado a Gaza para ajudar a família do amigo. Porém, isso não será mais possível. Na última terça-feira (10), ele recebeu a notícia de que a casa do colega foi bombardeada pelo exército sionista, assassinando seus nove familiares:

“Ele agora não tem família, e isso aconteceu há dois dias. Eu fico muito chateado porque agora dizemos que são nove, depois são 20 e, no fim, são números. As pessoas não são números, elas têm vida, têm história”, reforça.

Como não poderia deixar de ser, a fala de Yousef terminou sua fala com o grito de guerra: “Palestina Livre, do Rio ao Mar”.

* * *

O Encontro Internacional de Territórios e Saberes (EITS) também contou com a participção de Débora Silva, do Movimento Mães de Maio; Rose Firmino, do Museu Sankofa, da Comunidade da Rocinha; Mara Lucia Sobral Santos, embaixadora da Frente Parlamentar de Mulheres Catadoras e liderança do Movimento Negro Unificado; Renata Gracie, pesquisadora da Plataforma Potencialidades Periféricas, da Fiocruz; Valcler Rangel, do Ministério da Saúde. A mesa foi mediada pela líder caiçara da Comunidade paratiense de Trindade Vera Lucia de Oliveira, conhecida como Vera da Trindade.

Edição: Guilherme Ribeiro

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Vanessa Martina-Silva Trabalha há mais de dez anos com produção diária de conteúdo, sendo sete para portais na internet e um em comunicação corporativa, além de frilas para revistas. Vem construindo carreira em veículos independentes, por acreditar na função social do jornalismo e no seu papel transformador, em contraposição à notícia-mercadoria. Fez coberturas internacionais, incluindo: Primárias na Argentina (2011), pós-golpe no Paraguai (2012), Eleições na Venezuela (com Hugo Chávez (2012) e Nicolás Maduro (2013)); implementação da Lei de Meios na Argentina (2012); eleições argentinas no primeiro e segundo turnos (2015).

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