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Montagem. Imagens: Bandeiras (Otan / Flickr) | Hitler (Timeless Moon)

Unha e carne: a íntima conexão entre o nazismo, o imperialismo anglo-saxão e a Otan

Desde a Segunda Guerra Mundial, instituições ocidentais como a Otan sustentam o ressurgimento do nazismo como ferramenta estratégica para assegurar seus interesses econômicos e políticos em tempos de crise
Ángeles Maestro
Resumen LatinoAmericano
Madri

Tradução:

Ana Corbisier

A relação histórica entre o nazismo e a formação da Otan revela uma conexão complexa e pouco discutida entre o anticomunismo, a geopolítica ocidental e a perpetuação de redes de poder autoritárias na Europa.

Após o fim da Segunda Guerra Mundial, figuras centrais do regime nazista foram incorporadas a estruturas de inteligência e defesa do Ocidente, como a Organização Gehlen, a Rede Stay-Behind e o comando da Otan. Essa aliança, com suporte direto dos EUA, resultou na integração de altos oficiais nazistas em posições de destaque nas forças armadas da Alemanha Ocidental e na própria Otan, revelando a continuidade de ideais e práticas do nazismo em novas configurações políticas e militares.

Além disso, documentos e investigações apontam para o papel central dessas redes na execução de atentados e ações de desestabilização, disfarçados como defesa contra o comunismo. A Rede Gladio, exemplo mais conhecido dessa estratégia, esteve por trás de massacres e atos terroristas que marcaram a Europa no pós-guerra, frequentemente com o aval de serviços secretos e apoio material da Otan. Casos como os atentados na Itália, atribuídos a grupos de esquerda, mas organizados por fascistas, ilustram a tática de criar o caos para justificar repressões e fortalecer regimes autoritários alinhados aos interesses norte-americanos.

Vale destacar como essas dinâmicas históricas moldam o presente, com o ressurgimento do nazismo e do militarismo em cenários de crise capitalista e conflitos, como a guerra na Ucrânia.

Conforme aponta a análise a seguir, em oito tópicos, a continuidade dessas estratégias denuncia um padrão: a aliança entre elites econômicas e forças militarizadas para controlar recursos e silenciar movimentos populares. A reflexão exposta enfatiza a necessidade de resistir a essa barbárie, resgatando ideais de justiça e solidariedade social frente à opressão.

Confira.

A equiparação entre fascismo e comunismo

Uma das conquistas mais importantes da ofensiva ideológica levada a cabo pelo imperialismo depois da Segunda Guerra Mundial é ter conseguido instalar no imaginário coletivo que o nazismo fora liquidado com o Terceiro Reich, e que os EUA e a Grã-Bretanha, como potências vencedoras do mesmo, nada tinham a ver com o fascismo.

Seu aparato de propaganda e de cooptação e suborno de intelectuais – magistralmente caracterizado por Frances Stonor Saunders (1), reforçou a selvagem perseguição a artistas e escritores da época MCCarthy e a condenação ao ostracismo daqueles que não se submeteram a seus desígnios.

O imperialismo anglo-saxão – seguido de perto por seus alunos adiantados da Europa ocidental e de “seus filhos da puta”(1), ditadores de todo calibre impostos pelo “ocidente” manu militari em centenas de golpes de Estado em numerosos países – conseguiu, mediante o anticomunismo mais feroz, impor três objetivos inter-relacionados: deturpar a URSS, apagar seu papel decisivo e o da resistência antifascista na vitória contra o nazismo e fazer aparecer os EUA como a potência que salvou a Europa do fascismo. 

Daí, à recente Resolução do Parlamento Europeu equiparando o fascismo ao comunismo(1), havia só um passo. A Resolução aprovada em 19 de setembro de 2019, quando os tambores de guerra da Otan contra a Rússia soavam já com força, utiliza o fascismo como pretexto para carregar nas tintas decididamente contra o comunismo. Diz, textualmente: “Enquanto os crimes do regime nazista foram avaliados e castigados graças aos processos de Nuremberg, continua existindo a necessidade urgente de sensibilizar sobre os crimes perpetrados pelo stalinismo e outras ditaduras [de outras ditaduras fascistas não dizem nada], avaliá-los moral e juridicamente, e levar a cabo investigações judiciais sobre eles”. E ainda, “demonstra sua profunda preocupação com os esforços dos atuais dirigentes russos de distorcer os fatos históricos e ocultar os crimes perpetrados pelo regime totalitário soviético, esforços que constituem um perigoso elemento da guerra da informação travada contra a Europa democrática com o objetivo de dividi-la, e pede à Comissão, portanto, que lute firmemente contra eles”. Passa por alto fatos tão incontroversos como que a URSS perdeu mais de 27 milhões de habitantes, mais de 10% de sua população na época, na luta contra a agressão nazista, ou que foi a URSS sozinha que aniquilou 70% da máquina de guerra de Hitler.

Uma das bases dos argumentos da Resolução do Parlamento Europeu é a assinatura do Pacto Molotov-Ribbentrop, em maio de 1939, assinado entre a URSS e a Alemanha nazista, como precedente imediato do começo da Segunda Guerra Mundial. Esta afirmação desmorona se leva-se em conta os numerosos pactos anteriores firmados por potências europeias com a Alemanha nazista, tais como os que o acadêmico australiano Tim Anderson reuniu em seu artigo “A história fascista da Otan”(1), e que reproduzo a seguir: 

A tudo isso há que acrescentar o Pacto de Não Intervenção, promovido por França e Inglaterra, ao qual aderiram 27 estados europeus que concordaram em proibir qualquer tipo de ajuda ao governo legítimo da República Espanhola, ameaçada por um golpe de Estado fascista, apoiado decididamente com todo tipo de ajuda armamentista e intervenção militar direta pelos regimes fascistas de Itália, Alemanha e Portugal. Concretamente ficava estabelecido: abster-se rigorosamente de toda ingerência, direta ou indireta, nos assuntos internos deste país, ao mesmo tempo que ficava proibida “a exportação… reexportação e o trânsito para a Espanha, possessões espanholas ou zona espanhola de Marrocos, de todo tipo de armas, munições e material de guerra”. Enquanto os povos do Estado espanhol se dessangravam pela falta de armas, as fronteiras terrestres e marítimas foram fechadas e o apoio militar da URSS — único país do qual recebia ajuda militar — tinha grandes dificuldades para chegar.

Este infame pacto contribuiu decisivamente para a vitória do regime fascista e para o aniquilamento da República Espanhola. Pouco após terminada a guerra, em 1939, França e Alemanha reconheceram a ditadura do General Franco. Em 1953, o Vaticano e os EUA fizeram o mesmo, dando lugar ao estabelecimento de bases militares na Espanha.

Nada disso está mencionado na resolução do Parlamento Europeu, que passará à história como um destacado expoente de manipulação a serviço de uma mal dissimulada conivência com o fascismo, como se verá a seguir e que está tendo sua expressão mais clara com o apoio manifesto da UE ao regime nazista da Ucrânia.

Não vou analisar a “distorção dos fatos históricos” sobre a época de Stalin, mostrada magistralmente, entre outros, por Jean Salem(2) e Domenico Losurdo(3), nem o aniquilamento do direito à informação levado a cabo pela “Europa democrática” bloqueando o acesso a meios de comunicação russos e censurando publicações que contradizem o discurso imperialista. A este respeito, há que mostrar que estão utilizando os mesmos mecanismos de censura e descrédito utilizados contra aqueles que contradisseram a versão “oficial” da pandemia da Covid(4).

O objetivo deste artigo é mostrar a continuidade histórica entre o imperialismo anglo-saxão, com a UE como obediente lacaio, e o nazismo, desde os estertores da Segunda Guerra Mundial, e que agora se reproduzem em todo seu esplendor na Ucrânia.

A colaboração direta de empresas dos EUA com a Alemanha nazista

Apesar da entrada dos EUA na guerra contra a Alemanha em dezembro de 1941, depois do ataque a Pearl Harbor, as grandes petroleiras estadunidenses, sobretudo a US Standard Oil Company, propriedade da família Rockefeller, forneceram ao Estado nazista grande quantidade de petróleo, sem as quais teria sido impossível o ataque à URSS. De fato, a importação alemã de produtos petrolíferos procedentes dos EUA aumentou de 44% em julho de 1941 (a operação Barba Ruiva contra a URSS começou em junho de 1941), a não menos de 94% em setembro daquele mesmo ano(5).

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A colaboração entre o regime nazista e a multinacional estadunidense IBM começou desde a chegada ao poder de Hitler em 1933, manteve-se até maio de 1945 e proporcionou a base tecnológica indispensável para levar a cabo o genocídio nazista(6). A IBM facilitou a geração e tabulação de cartões perfurados com os dados do censo nacional de 1933 que permitiram a identificação e repressão massiva de militantes políticos e sindicais e de minorias étnicas, como a judia. Já em 1933, 60 mil pessoas tinham sido identificadas e encarceradas. Além disso, tais técnicas foram aplicadas à logística militar, gestão de periferias e campos, etc. À medida que a máquina de guerra nazista ocupava sucessivas nações da Europa, a capitulação foi seguida por um censo da população de cada nação subjugada, com vistas à identificação e repressão, com a colaboração das filiais alemã e polaca da IBM. A Alemanha nazista logo se tornou o segundo cliente mais importante da IBM depois do lucrativo mercado estadunidense(7)

Que valham estes dois significativos exemplos, aos quais se somam os de grandes corporações estadunidenses como Coca-Cola, Ford, General Motors e outras, para mostrar o alto grau de colaboração econômica dos EUA com o nazismo. Estes antecedentes também contribuem para explicar como – assim como ocorreu na Comuna de Paris ou no ataque de todas as nações que se enfrentaram na Primeira Guerra Mundial – os interesses da burguesia unificam inimigos de guerra contra revoluções operárias.

“Lutar contra o inimigo equivocado”: a Operação Impensável

O general Patton, que comandava o Terceiro Exército dos EUA, firmemente partidário a continuar a guerra atacando a URSS, disse pouco antes da entrada do Exército Vermelho em Berlim: “Pode ser que estejamos lutando contra o inimigo equivocado o tempo todo. Mas já que estamos aqui, deveríamos perseguir estes bastardos agora, porque no fim teremos que lutar contra eles. Direi isto: o Terceiro Exército sozinho, com muito pouca ajuda e muito poucas baixas, poderia acabar com o que resta dos russos em seis semanas. Lembrem-se de minhas palavras. Nunca as esqueçam”(8).

Patton foi destituído, mas sua proposta já germinava em outras mentes. O Primeiro-Ministro britânico Winston Churchill, considerado pela propaganda oficial um dos heróis da vitória contra o nazismo, deu ordem ao Estado Maior de Planejamento da Guerra do Reino Unido de projetar no mais absoluto segredo a “Operação Impensável” para atacar a URSS imediatamente após acabar a Segunda Guerra Mundial. O plano previa invadir novamente a União Soviética e destruir totalmente suas principais cidades e instalações industriais, bombardeando-as com armas nucleares. 

A Operação deveria ser realizada em 1° de julho de 1945, antes que os maiores contingentes de tropas estadunidenses se retirassem da Europa, e previa um ataque de surpresa de Hamburgo até Trieste. A ofensiva deveria ser executada pelas 64 divisões estadunidenses destacadas na Europa, as 35 britânicas, quatro polacas e dez alemãs. Estas divisões alemãs eram mantidas pelos “aliados” em Schleswig-Holstein e no sul da Dinamarca e eram treinadas diariamente por instrutores britânicos e preparadas para a guerra contra a URSS. 

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A Operação foi rejeitada diante da superioridade do Exército Vermelho, que contava com 264 divisões na Europa e sua potência encouraçada, com o dobro de unidades e de mais qualidade. A potência da aviação soviética também era esmagadora: os anglo-americanos e seus aliados contavam com 6.714 caças e 2.464 bombardeiros contra 9.380 e 3.380 da parte soviética, respectivamente(9)

A este respeito, é de vital importância indicar que os serviços secretos soviéticos, que operavam em Londres, tiveram acesso a todos os planos da Operação Impensável. O alto comando político e militar da URSS recebeu uma informação em 18 de maio de 1945 que revelava as intenções dos chefes da Wehrmacht e da Alemanha nazista, assim como dos aliados da coalizão “anti-hitleriana”. Informava-se sobre as negociações secretas operadas na Suíça por Allen Dulles, do Departamento de Serviços Estratégicos dos Estados Unidos (Inteligência Militar e Política), com o general das SS Karl Wolff(10)

Além da inferioridade militar anglo-saxã, a moral de suas tropas, fartas de guerra e cientes dos crimes nazistas, tornava enormemente arriscado convencê-las de que tinham lutado contra “o inimigo equivocado”. A tudo isso, é preciso acrescentar a importância da resistência antifascista que lutou na maior parte dos países europeus e do enorme prestígio da URSS entre a classe operária de seus países. Estes fatos foram determinantes para a inesperada e esmagadora vitória do Partido Trabalhista britânico nas eleições gerais que se realizaram em 5 de julho de 1945.

Não obstante, Churchill não desistiu. O historiador norte-americano Thomas Mayer, em seu livro “When Lions Roar” revelou um documento desclassificado do FBI segundo o qual Churchill, em 1947, buscou convencer Truman, por meio do senador Styles Bridges, a lançar uma bomba atômica sobre o Kremlin e destruir Moscou. Desta forma, “seria um problema muito fácil manejar o equilíbrio da Rússia, que não teria direção”(11)

Os planos da Operação Impensável se desenvolviam enquanto o Kremlin recebia felicitações públicas de Churchill pela “brilhante vitória que o Exército Vermelho e os povos da URSS tinham conquistado ao expulsar os invasores de sua terra e derrotar a tirania nazista”, ao mesmo tempo em que declarava que “o futuro da humanidade depende da amizade e do entendimento entre os povos britânico e russo”.

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O ataque à URSS não se realizou, estritamente, porque a correlação de forças militar e política não permitiram, além de outras questões como a ocupação de Berlim pelo Exército Vermelho e porque os EUA precisavam da URSS para encerrar a guerra contra o Japão. Convém não esquecer disso. Mas imediatamente após terminar a Conferência de Yalta, na qual ficara acertado respeitar as zonas de intervenção de cada potência, a aviação anglo-saxã, descumprindo flagrantemente suas estipulações, arrasou Dresden e suas pontes sobre o rio Elba para bloquear o avanço da URSS, a zona industrial da Eslováquia – que devia ficar sob influência soviética –, a cidade romena de Ploiești e seus campos de petróleo quando o Exército Vermelho estava às suas portas, Potsdam e Oranienburg, onde os alemães já trabalhavam com jazidas de urânio.

As bombas nucleares lançadas pelos EUA sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki, provavelmente um dos maiores crimes contra a humanidade da história, e absolutamente impune, deviam mostrar ao mundo, e em especial à URSS, que nenhuma consideração moral deteria o imperialismo anglo-saxão.

Com este ato criminoso, terminava a Segunda Guerra Mundial. A partir de então, seus objetivos de dominação iriam desenvolver-se fundamentalmente por meio da Otan.

Os crimes de guerra nazistas e o Código de Nuremberg

O mundo ficava sabendo, horrorizado, em 1946, durante os Processos de Nuremberg, das atrocidades cometidas pelos nazistas nos campos de trabalho escravo e de extermínio, assim como os crimes contra a saúde pública cometidos pelos médicos alemães – a metade deles filiada ao partido nazista – para conduzir experimentos de diversos tipos. Estes experimentos, que mostraram o mais absoluto desprezo pela vida e dignidade das pessoas, tampouco trouxeram avanço algum para a ciência médica em geral, ainda que, segundo o psiquiatra estadunidense Teo Alexander – um dos criadores do Código de Nuremberg –, tenha trazido significativas inovações para a ciência do assassinato(12).

O horror e a consciência de que semelhantes monstruosidades foram possíveis e que podiam se repetir levou à elaboração do Código de Nuremberg(13), o primeiro código internacional de ética para a pesquisa com seres humanos, publicado em 19 de agosto de 1947 sob o preceito hipocrático primum non nocere, isto é, “primeiro, não prejudicar”. 

Entre seus dez pontos, destacam-se: o imprescindível consentimento informado da pessoa submetida à experiência, a ausência de coerção, o requisito prévio da experimentação prévia com animais, a possibilidade de interrompê-la em qualquer momento se forem observados efeitos adversos e que seus resultados sejam benéficos para as pessoas envolvidas. 

Todos e cada um destes princípios foram, e estão sendo, absolutamente vulnerabilizados pela vacinação em massa contra a covid, que está provocando dezenas de milhares de mortos e milhões de efeitos adversos graves em pessoas sadias de todo o mundo(14).

5. A cooptação de cientistas nazistas pelos EUA, a Otan e os laboratórios de armas biológicas

Antes de terminar a Segunda Guerra Mundial e em plena batalha de Berlim, Allen Welsh Dulles, trabalhando para a OSS (Oficina de Serviços Estratégicos dos EUA), antecessora da CIA e da qual seria seu primeiro diretor civil, desenvolveu a Operação Paperclip(15).  Esta Operação secreta começou a ser implementar em 1943 e tinha o objetivo de recrutar cientistas e militares nazistas, especialistas em armas biológicas e químicas, para levá-los aos EUA, encobrindo seus crimes.

1.600 cientistas nazistas foram recrutados em segredo para produzir armamento para os EUA “a um ritmo febril e paranoico”. Muitos deles, membros do Partido Nazista, oficiais das SS e criminosos de guerra, tinham participado diretamente de experimentos médicos que ocasionaram a morte de milhares de prisioneiros nos campos de Dachau e Ravensbrück e foram julgados em Nuremberg por elas, mas os EUA buscaram sua absolvição. Os EUA consideraram-nos vitais para sua segurança nacional.

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A existência de mais de 400 laboratórios de armas biológicas dos EUA, vulnerabilizando a Convenção sobre a Proibição do Desenvolvimento, a Produção e o Armazenamento de Armas Bacteriológicas (Biológicas) e Toxínicas(16), supostamente vigente, indica uma inquietante continuidade dos experimentos nazistas condenados em Nüremberg.  

Em abril de 2022, o cientista estadunidense Francis Boyle, redator da lei promulgada pelo Congresso de seu país para cumprir a Convenção de Armas Biológicas de 1972, declarou: “O programa de armas biológicas dos Estados Unidos, avaliado em 100 bilhões de dólares, é uma ‘empresa criminosa’ que emprega dezenas de milhares de ‘cientistas da morte’ na Ucrânia e em outros países”(17)

Mas não se trata só de projetos. Os EUA levaram a cabo ataques com armas químicas e biológicas na Coreia e no Vietnã. Também, em 1981, armas biológicas estadunidenses provocaram uma epidemia de dengue hemorrágico em Cuba(18).

O Ministério de Defesa da Rússia denunciou a realização de experimentos realizados com pacientes psiquiátricos ucranianos na cidade de Kharkiv. De tais experimentos, desenvolvidos em laboratórios de armas biológicas dos EUA, também participavam outros países da Otan, como Alemanha e Polônia, assim como “empresas farmacêuticas como Pfizer, Moderna, Merck e a empresa Gilead, filiada ao Exército estadunidense, para provar novos medicamentos, eludindo normas de segurança internacionais”(19).

A Organização Gehlen

Em abril de 1946, a Organização Ghelen foi formada pelas forças aliadas na zona da Alemanha ocupada pelos EUA, baseada nas redes dos serviços secretos nazistas na Europa oriental e liderada pelo general nazista Reinahard Gehlen. Em março de 1945, sabedor de que o fim do Terceiro Reich estava próximo, Gehlen e um pequeno grupo de oficiais microfilmou os arquivos do Fremde Heere Ost acerca da URSS e os pôs em embalagens herméticas. As embalagens foram enterradas em vários lugares dos Alpes austríacos. 

Em 22 de maio de 1945, Gehlen se rendeu ao Corpo de Contrainteligência (CIC) dos EUA na Baviera e lhe entregou seus arquivos. 

A Organização Gehlen está na origem da Rede Stay Behind, que analisaremos mais adiante, e que, criada e dirigida pela Otan, vincula com ela serviços secretos militares e organizações nazistas de diferentes países europeus, como a Rede Gladio. A Organização Ghelen também é a precursora do atual Serviço Federal de Inteligência (BND) do governo alemão, do qual Gehlen foi o primeiro presidente. 

A Conferência de Yalta, a RFA na Otan e os altos cargos nazistas no exército alemão e na Otan

A Conferência de Yalta, realizada em 1945 com a participação dos máximos dirigentes da URSS, da Grã-Bretanha e dos EUA, estabeleceu, no que se refere à Alemanha, seu desarmamento, desmilitarização e divisão entre as potências vencedoras.

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A Otan foi criada em 1949 e, em 1955, vulnerabilizando flagrantemente os acordos de Yalta, a RFA entra na Otan. Como resposta, cria-se o Pacto de Varsóvia. Em 1951, cria-se a Base de Rammstein na RFA, a maior base militar dos EUA na Europa. O rearmamento da RFA se faz sob a batuta dos EUA e com a participação de altos chefes militares nazistas, tanto no novo exército alemão, como na direção da Otan na Europa.

A lista de dirigentes nazistas em altos cargos militares ocidentais, além de Reinhard Gehlen, é longa, segundo a informação reunida e documentada por Beatriz Talegón no Diario 16(20):

  • O coronel da Wehrmacht durante o Terceiro Reich, Albert Schnez, chegou a ser chefe do Estado Maior durante o governo do social-democrata Willy Brandt. Segundo informação desclassificada em 2014, teria organizado um exército secreto de veteranos da Segunda Guerra Mundial (40 mil efetivos) que estariam preparados para defender a Alemanha de uma suposta e eventual invasão soviética. 
  • Adolf Heusinger, general e chefe de operações do exército nazista, foi depois agente da CIA, general do exército da RFA e presidiu o Comitê Militar da Otan até 1964.
  • Hans Speidel, tenente-general nazista e chefe de gabinete de um dos mais destacados marechais de campo, Erwin Rommel, passou a fazer parte do exército alemão de Adenauer como assessor e supervisionou a integração das tropas alemãs à Otan. Posteriormente, foi nomeado comandante supremo das forças terrestres aliadas da Otan na Europa Central entre 1957 e 1963. 
  • Johannes Steinhoff, destacado piloto da aviação militar nazista, passou a ser chefe do Estado Maior e comandante das Forças Aéreas Aliadas da Europa Central entre 1965 e 1966. Posteriormente, foi chefe do Estado Maior da Luftwaffe Bundeswehr entre 1966 e 1970 e, finalmente, foi nomeado presidente do Comitê Militar da Otan, entre 1971 e 1974. 
  • Johann von Kielmansegg, coronel do Alto Comando do exército nazista, após ascender a general da armada alemã, foi nomeado comandante-chefe das forças especiais da Otan na Europa Central em 1967.
  • Ernst Ferber, tenente-coronel no Estado Maior da Wehrmacht e condecorado com a Cruz de Ferro, foi comandante-chefe das Forças Aliadas da Europa Central da Otan entre 1973 e 1975. 
  • Karl Schnell, major e primeiro-oficial do Estado Maior do exército nazista, condecorado também com a Cruz de Ferro, substituiu o general Ferber como comandante-chefe das Forças Aliadas da Europa Central da Otan entre 1975 e 1977. 
  • Franz Joseph Schulze, alto oficial das forças aéreas nazistas e condecorado com a Cruz de Ferro, passou a ser general da RFA e depois comandante-chefe das Forças Aliadas da Europa Central da Otan entre 1977 e 1979. 
  • Ferdinand von Senger und Etterlin, destacado oficial nazista, participou da invasão da URSS (Operação Barba Ruiva) e da Batalha de Stalingrado, sendo condecorado com a Cruz de Ouro. Passou a ser general e comandante-hefe das Forças Aliadas da Europa Central da Otan entre 1979 e 1983. 

Que valha esta longa, mas seguramente incompleta lista, para ilustrar a profunda penetração de militares nazistas nos mais altos cargos da Otan e, o que seguramente é menos conhecido, nos postos de direção do exército alemão, para passar dali a dirigir a Aliança Atlântica.

A maior parte das bases militares dos EUA e da Otan na Europa está na Alemanha, país que, junto de Itália, Países Baixos, Bélgica e Turquia, abriga armamento nuclear.

Esta linha de continuidade política e ideológica entre o nazismo e a Otan, com o anticomunismo como eixo vertebral, e a subjugação da Europa, sendo submetida aos interesses dos EUA, para cortar suas naturais relações econômicas, comerciais, culturais, etc. com a Rússia, explicam sobejamente uma boa parte dos acontecimentos políticos ocorridos desde a Segunda Guerra Mundial no continente europeu e no presente.  

A Rede Stay-Behind, exército secreto da Otan

A colaboração da Otan com grupos fascistas e com serviços secretos militares com objetivos terroristas em diferentes países europeus, explicitamente contra o comunismo, ao mesmo tempo que implementavam uma aliança que agora se reedita com a guerra da Ucrânia, contribuíram decisivamente para desestabilizar governos e desencadear a repressão mais feroz contra organizações revolucionárias.

Em 2005, Daniele Ganser, historiador suíço, especialista em relações internacionais e professor da universidade de Basileia, publica um livro intitulado “Os exércitos secretos da Otan”(21), resultado de um extenso trabalho de pesquisa sobre as relações entre a Aliança Atlântica, as redes de organizações nazistas e os serviços secretos de muitos países – muitos deles europeus – com o conhecimento e a colaboração de seus governos. O resultado foi uma extensa lista de atentados terroristas destinados à desestabilização de governos e, em geral, à “luta contra o comunismo”.

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O elemento que desencadeou sua investigação foi a confirmação realizada em 1990 por Giulio Andreotti, Primeiro-Ministro da Itália, ante uma Comissão de Investigação do Parlamento Italiano, da existência da Rede Gladio. Nela, os serviços secretos italianos atuavam sob as ordens da Otan. Indicava ainda que a Rede continuava ativa e que existiam redes semelhantes em muitos outros países.

Em seu informe, Andreotti dizia que a Rede Gladio possuía uma grande quantidade de armamento, facilitado pela CIA, que se escondia em 139 lugares, situados em bosques, campos, igrejas e cemitérios e que incluía: “armas portáteis, munições, explosivos, granadas de mão, facas, adagas, morteiros de 60 milímetros, fuzis sem retrocesso calibre .57, fuzis com miras telescópicas, transmissores de rádio, binóculos e outros tipos de equipamento diverso”. Estas armas foram utilizadas em atentados que sistematicamente eram atribuídos às Brigadas Vermelhas e davam lugar a numerosas detenções e medidas repressivas contra as organizações operárias.

Os terríveis atentados da Piazza Fontana de Milão, da estação de Bolonha, da Piazza della Loggia de Brescia e vários mais, que ocasionaram a morte de 491 pessoas e ferimentos e mutilações em outras 1.891, junto aos assassinatos de juízes e jornalistas que buscavam investigá-los, mostraram a autoria da organização fascista Ordine Nuovo, em colaboração estreita com a Otan, a CIA e os serviços secretos italianos, com a conivência dos governos de turno.

No marco de grandes mobilizações operárias e populares contra a guerra do Vietnã, o objetivo dos atentados era, nas palavras de um terrorista arrependido, “pressionar o governo italiano para que declarasse Estado de Emergência e promovesse um regime autoritário na Itália”.

Ferdinando Imposimato, presidente honorário do Tribunal Supremo de Cassação, análogo ao Tribunal Supremo, resume os resultados das investigações realizadas por ele, nas quais estabelece o papel da Otan, de Ordine Nuovo e dos serviços secretos militares nos massacres que ensanguentaram a Itália. Transcrevo suas palavras, que podem ser consultadas aqui(22): “No decorrer das investigações que realizei sobre as tragédias que assolaram a Itália, desde os atentados da Piazza Fontana, ao do trem Italicus Express que liga Roma a Munich, ao da Piazza della Loggia em Brescia, à tragédia de Bolonha, e no decorrer de cujas investigações foram assassinados meus colegas Giovannni Falcone, Paolo Borsellino e outros, ficou confirmado que o explosivo utilizado procedia das Bases da Otan. (…) Tudo isto eu escrevi em um livro e ninguém desmentiu. Nestas bases reuniam-se “terroristas obscuros”, junto de representantes da Otan, mafiosos, políticos italianos e maçons na véspera dos atentados. Tudo isto foi confirmado por testemunhas diretas e ocorreu de forma ininterrupta. (…) O problema é que o silêncio da imprensa impede a opinião pública de conhecer esta tremenda verdade: é a Operação Gladio que ameaça a paz e a segurança e ameaça desencadear uma grande guerra”.

A lista de ações dos chamados Stay-Behind, fórmula utilizada para estabelecer a citada colaboração entre a Otan, os serviços secretos e as organizações fascistas locais para elaborar ações terroristas, em muitos casos consumadas, com o objetivo geral de luta contra o comunismo e a desestabilização de governos, é longa: França, Áustria, Suécia, Alemanha, Noruega, Turquia, Argélia, Itália, Portugal, Grécia, Moçambique, Dinamarca, Espanha (massacre dos advogados trabalhistas de Atocha), Holanda, Bélgica, Suíça(23).

Daniele Genser destaca que a primeira intervenção em um massacre popular ocorreu na Grécia ainda durante a Segunda Guerra Mundial. A resistência antifascista grega, assim como na França e na Itália – destaca Daniele Ganser – era impulsionada pelos comunistas. Após ter derrotado definitivamente as tropas fascistas, em 1944 foi convocada uma grande manifestação pacífica, prelúdio de uma greve geral, em apoio ao poder popular vitorioso. As forças armadas britânicas, junto com a polícia e as organizações de extrema-direita massacraram a manifestação, deixando dezenas de mortos e feridos. Depois disso, Churchill impôs a monarquia da família da rainha Sofia, que foi expulsa definitivamente da Grécia depois do referendo popular de 1974.

No momento do escândalo desencadeado por Andreotti em 1990, o canal de televisão privado RTL comoveu a opinião pública alemã ao revelar em uma reportagem sobre a Rede Gladio que ex-membros da temida Waffen-SS tinham sido depois membros da Rede Stay-Behind alemã.

Um documento do Estado-maior estadunidense intitulado Overall Strategic Concepts (Conceptos Estratégicos Gerais) de 28 de março de 1949 corrobora isso(24): “A Alemanha dispunha de um excelente potencial em homens treinados para formar as unidades clandestinas e as reservas do exército secreto [unidades stay-behind]. Uma resistência eficaz pode e deve ser organizada”. 

O nazismo que hoje ressurge tem uma continuidade histórica inegável. O apoio militar, organizativo e econômico do imperialismo dos EUA e das potências europeias, por meio da Otan, ao regime foi uma constante histórica que, hoje, como na primeira metade do século 20, representa o recurso mais brutal de um capitalismo em crise para impor seu domínio. Também responde aos mesmos objetivos: apropriar-se das riquezas dos povos e impedir que, arrebatando-lhes o poder, construam uma sociedade que responda às necessidades humanas. Socialismo ou barbárie é hoje, mais do que nunca, a tarefa que enfrentamos.

1. https://espanol.almayadeen.net/articles/1585977/la-historia-fascista-de-la-otan
2. https://espai-marx.net/elsarbres/review/lenin-y-la-revolucion-jean-salem
3. https://www.lahaine.org/b2-img09/stalin_urbano.pdf
4. En este documento de la Coordinación de Núcleos Comunistas puede encontrarse información detallada acerca de la TNI, Iniciativa de Alerta Temprana, liderada por la BBC para coordinar la censura o la declaración como “fake” de las opiniones e informaciones enfrentadas al discurso imperialista. https://cnc2022.files.wordpress.com/2022/03/el-covid-como-pretexto-organizaciones-revolucionarias_web-1.pdf
5. Pawels, J.R. (2.000) El mito de la guerra buena. Ed. Hiru. Pág 80
6. Black, Edwin (2009) [2001]. IBM y el Holocausto: la alianza estratégica entre la Alemania nazi y la corporación más poderosa de Estados Unidos
7. Ibid.
8. https://www.globalsecurity.org/military/world/war/operation-unthinkable.htm
9. https://www.muyinteresante.es/historia/32302.html
10. Alexander Pronin, “churchil quería destruir la URSS en 1945”. A. Pronin fue piloto militar de honor de la URSS, participante en la Gran Guerra Patria. Su artículo puede econsultarse aquí: https://www.tercerainformacion.es/articulo/memoria-historica/10/05/2022/la-operacion-impensable-la-traicion-de-churchill-contra-la-urss/
11. https://www.washingtonpost.com/opinions/book-review-when-lions-roar-churchills-and-kennedys-by-thomas-maier/2014/11/28/55d0e32e-6388-11e4-836c-83bc4f26eb67_story.html
12. https://www.ucjc.edu/2020/04/el-codigo-de-nuremberg-el-amanecer-de-la-bioetica-tras-los-crimenes-del-nazismo/
13. https://web.archive.org/web/20080221005221/http://www.ushmm.org/research/doctors/Nuremberg_Code.htm
14. https://cnc2022.files.wordpress.com/2022/03/el-covid-como-pretexto-organizaciones-revolucionarias_web-1.pdf
15. https://www.nytimes.com/2014/03/02/books/review/operation-paperclip-by-annie-jacobsen.html
16. https://es.wikipedia.org/wiki/Convenci%C3%B3n_sobre_armas_biol%C3%B3gicas
17. https://www.newstarget.com/2020-02-24-prof-francis-boyle-13000-death-scientists-hard-at-work-destroying-humanity.html
18. https://www.granma.cu/hoy-en-la-historia/2021-06-03/dengue-hemorragico-terrorismo-bacteriologico-de-ee-uu-contra-cuba-03-06-2021-11-06-52
19. https://es.sott.net/article/82793-Laboratorios-de-armas-biologicas-y-experimentos-con-seres-humanos-realizados-por-el-Pentagono-y-la-OTAN-en-Ucrania-con-participacion-de-Pfizer-Moderna
20. https://diario16.com/la-otan-y-sus-vinculos-con-el-nazismo/
21. Ganser, Daniele (2005) Los ejércitos secretos de la Otan. El título original es Nato´s Secret Armies: Operation Gladio and Terrorism in Western Europe.
22. https://www.lahaine.org/mundo.php/ha-muerto-un-valiente-ferdinando
23. Stay-Behind: Cómo controlar las democracias. Las redes estadounidenses de desestabilización y de injerencia. https://www.voltairenet.org/article120005.html#nb5
24. https://es.wikipedia.org/wiki/Red_Stay_Behind

Edição: Guilherme Ribeiro

Otan coordena diretamente ataques de alta precisão contra civis russos, denuncia Lavrov


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Ángeles Maestro

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