Um dos sentimentos mais dolorosos e prejudiciais é a impotência diante da injustiça. Vivemos isso desde a infância, cada vez que recebemos um castigo por uma ação que não cometemos. Às vezes, o que parece um simples detalhe a ser esquecido de tantas outras experiências, fica gravado como uma dor latente e um perigoso germe de rancor, sentimentos capazes de contaminar as relações interpessoais, mas também nossa visão das autoridades e da sociedade à qual pertencemos.
À medida que vamos crescendo e acumulando conhecimentos, de maneira instintiva criamos um pequeno universo pessoal a partir do qual definimos nosso modo de comunicarmos com os demais.
Esse núcleo íntimo, a partir do qual se consolida uma ampla gama de formas de relacionar-nos com o mundo que nos cerca, já foi marcado pelas experiências vividas desde que fomos lançados no mundo. A importância da primeira infância, portanto, não só é decisiva no desenvolvimento da personalidade e da autoestima; também deixa sua marca no nosso presente e no nosso futuro, de maneira indelével.
A partir desta perspectiva, é muito mais real e humana a visão do que acontece com nossos povos e, com especial ênfase, em tudo aquilo que determina a conduta e a atitude das novas gerações, nascidas em um contexto de egoísmo, injustiça, fome e carências vitais.
Gerações perdidas — somo são definidas sem maior empatia — sobre cuja situação somos, se não culpados diretos, somos cúmplices por nossa forma de aceitar sua condição de marginados e evitar envolver-nos na exigência de uma mudança radical nas políticas vigentes.
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A injustiça está presente desde a infância, cada vez que recebemos um castigo por uma ação que não cometemos
Os sistemas de governança, fundados desde sempre sobre a busca do poder absoluto e a preeminência da riqueza material sobre o bem-estar dos povos, nos transformaram em recursos materiais de diferente valor e, desse modo, somos definidos por categorias em escalas descendentes. Esta ordem social condiciona nossa visão do mundo porém, mais grave ainda, nossa visão sobre os demais e aprofunda não só o divórcio entre estratos sociais, mas também nossa incapacidade de empatia com aqueles que foram relegados à base menos beneficiada de nossas comunidades humanas.
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Aquilo capaz de dividir-nos em categorias — uma valiosa ferramenta para o neoliberalismo — não passa de um recurso antidemocrático para consolidar a força econômica e política daqueles que detêm o poder. Este mecanismo destruidor de nosso tecido social, no entanto, é aceito sem reservas por uma grande maioria de habitantes de nosso continente.
Isso porque também os sistemas de informação — e os meios de comunicação em mãos das elites — enfatizam as duvidosas bondades de um sistema que nos arrasa. Nunca foi mais acertado o lema “divide e impera” utilizado por Júlio César, o imperador romano, como base de sua política para fazer de seu reinado uma fortaleza indestrutível.
Aqueles que possuem uma visão completa e profunda deste grande conflito que nos coloca o mundo no qual tentamos viver, estão sumidos em uma batalha interna entre a urgência de uma verdadeira revolução — capaz de transformar a estrutura de poder a partir de suas bases — e o temor à violência que esta poderia provocar a partir dos âmbitos de privilégio, os quais se encontram solidamente assentados no sistema atual.
No meio dessa dicotomia ficam essas novas gerações privadas de recursos materiais e intelectuais, criadas em um entorno de violência doméstica e social e, portanto, submetidas às decisões daqueles que se beneficiam de suas carências.
Transformar este cenário de injustiças é uma tarefa urgente que coloca enormes desafios. Entre esses, a necessidade de proporcionar aos mais jovens alguma visão de esperança sobre seu futuro, uma tarefa vital para endireitar o rumo de nossas jovens democracias, mesmo que se oponha a isso nossa atávica indiferença: um sério problema a ser resolvido.
*Colaboradora de Diálogos do Sul da Cidade da Guatemala
Tradução: Beatriz Cannabrava
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