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ToggleComo primeira mensagem neste início de ano, quero desejar a todos um feliz 1980. É isso. É esse o tamanho do nosso retrocesso.
Ademais, 1980 tem o aspecto simbólico de ter sido um recomeço. A população estava entusiasmada e mobilizada em torno da ideia de reconstruir a democracia: eleições diretas, constituinte, anistia, faziam parte das bandeiras agitadas.
A transição não foi bem feita. A classe política cedeu ao voluntarismo dos militares e do capital financeiro e deixaram que eles conduzissem a transição e o fizeram de maneira a preservar o status quo. A Constituição, que leva o nome da Cidadã, trazia como contrabando o pensamento único imposto pelo capital financeiro.
Nessa mesma época, Leonel Brizola trazia o sonho e a bandeira do trabalhismo de Vargas como caminho para o socialismo. Os militares, obedecendo ordens externas, vetaram e, com a conivência de intelectuais e da mídia, desenharam e executaram a estratégia de liquidar a era Vargas.
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A segunda morte de Vargas
Outro dia, li um artigo em que o autor pedia que a nação pedisse perdão a Leonel Brizola por ter perdido a oportunidade de tê-lo conduzindo o processo naquela transição. Brizola é apenas um símbolo. É o varguismo como doutrina e modelo de desenvolvimento que tinha que teve que ser destruído para dar lugar a um modelo de total submissão ao capital transnacional.
A autocrítica e o pedido de perdão têm que vir principalmente da USP, de instituições como o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), da Fundação Ford e de seu guru Fernando Henrique Cardoso, que tanto se dedicaram ao assassínio da Era Vargas.
O pedido de perdão tem que vir do sindicalismo de resultado com seus quadros formados pelo Instituto Americano para o Desenvolvimento do Sindicalismo Livre (Iadesil), um braço da Federação Americana do Trabalho e Congresso de Organizações Industriais (AFL/Cio), orientados pelos serviços de inteligência dos Estados Unidos em plena guerra cultural para impor sua hegemonia.
É hora de se fazer um balanço sobre as transições mal resolvidas, sobre a debilidade de uma intelectualidade de esquerda que não soube encontrar seu lugar na história, de partidos políticos que não honraram os compromissos com suas bases populares.
Transcorreram quatro décadas. Vejamos o que aconteceu com a economia.
Desmonte econômico
As décadas de 1980 e 1990 ficaram nos livros como décadas perdidas, não só pela sucessão de crises e períodos recessivos, como, no nosso caso, pela desmontagem do Estado, alienação dos bens públicos através das privatizações, desindustrialização acelerada, avanço predador da fronteira agrícola e saque das riquezas naturais.
No novo século, mais duas décadas de repetição do mesmo com a agravante de que as crises econômicas se complicaram com crise política em função da aplicação de estratégias de desestabilização.
Reprodução
A população estava entusiasmada e mobilizada em torno da ideia de reconstruir a democracia.
Os indicadores do PIB
O Brasil precisa e pode ter crescimento robusto, de no mínimo 10% ao ano. A China manteve, por décadas, crescimento acima de 10%. Tudo é uma questão de modelo e de gestão.
Nos últimos 40 anos, tivemos somente oito com PIB acima de 5%, com o pico em 2010, de 7,63%. A média desses anos de crescimento foi de 6,38%,
1984 |
1985 |
1986 |
1994 |
2004 |
2007 |
2008 |
2010 |
5,40 |
7,85 |
7,49 |
5,85 |
5,76 |
6,07 |
5,09 |
7,53 |
Foram 23 anos com PIB menor do que 5%. São valores muito baixos, que ficam abaixo da taxa demográfica.
Mesmo com a população crescendo nas suas mais baixas taxas históricas, ela aumentou 1,2% a cada ano. Veja que em 1982 1991 1998, 1999, 2012, 2014, 2017 2018 e 2019 o PIB não chegou sequer a igualar o crescimento demográfico. A média desses 23 anos foi de 4,33%. E isso em períodos com inflação acima de 10%.
1982 |
1987 |
1989 |
1991 |
1993 |
1995 |
1996 |
1997 |
0,83 |
5,53 |
3,16 |
1,03 |
4,92 |
4,22 |
2,21 |
3,39 |
1998 |
1999 |
2000 |
2001 |
2002 |
2003 |
2005 |
2006 |
0,34 |
0,47 |
4,39 |
1,39 |
3,05 |
1,14 |
3,20 |
3,95 |
2011 |
2012 |
2013 |
2014 |
2017 |
2018 |
2019 |
|
3,97 |
1,92 |
3,00 |
0,50 |
1,06 |
1,12 |
1,44 |
Finalmente, temos oito anos com PIB negativo. Na média, houve um decrescimento de 3% ao ano nesses anos de recessão.
1981 |
1983 |
1990 |
1992 |
2009 |
2010 |
2015 |
2020 |
-4,25 |
-2,93 |
-4,35 |
0,54 |
-0,13 |
-3,31 |
-3,55 |
-4 |
Resumindo, tivemos oito anos com média do PIB em torno de 6,38%, 23 anos de média em torno de 4,33% e oito anos de decrescimento em torno de 3%. Nesse ritmo, nem em quarenta anos sairemos do buraco em que estamos metidos.
Para efeito de comparação, nos 40 anos anteriores aos anos 1980, tivemos quatro décadas de crescimento robusto, abaladas circunstancialmente por crises políticas, crises cambiais, e fatores externos, mas sem retrocessos e tornando-se tanto mais vigoroso o crescimento quanto maior a contribuição do PIB industrial na formação do PIB.
Na década de 1940, salvo os -1% de 1940 e -2,7% de 1943, foram oito anos de crescimento médio de 6,95%. Na década seguinte, foram 10 anos de crescimento médio de 7,15; média de 6,07% nos anos 1960 e, 8,27% na década de 1970. Nesta fase, tivemos picos de 13,97% em 1973, e menos de 5% em 1977 e 1978.
Traduzindo
A consequência dessa sopa de número nós estamos sentindo na pele. Desemprego, precarização: o país funciona na informalidade e no crime organizado. São 40 anos de insistência nos mesmos erros. O problema do Brasil não é fiscal, é de gestão.
Como diz o professor e economista Ladislau Dowbor, um PIB per capita de R$ 33 mil é de fazer inveja, daria pra todo mundo viver bem.
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Segundo a revista Forbes, nesses tempos de crise econômica por conta da Covid-19, 10 bilionários aumentaram suas fortunas em 400 bilhões de dólares, enquanto 15 milhões de pessoas engrossaram o contingente de extrema pobreza, aqueles que recebem menos de 1 euro e 60 centavos por dia. Isso na União Europeia. Quantos no Brasil vivem hoje com menos de R$ 10 por dia?
O Brasil, e cá entre nós, a Nossa América, precisamos romper definitivamente com essa ditadura do pensamento único, que nos foi imposta pelo capital financeiro. Progressismo, como qualificaram períodos de inclusão não resolve. Não se sustenta. Está comprovado nos números.
E não há alternativa que possa vir desse governo de ocupação. Eles ocuparam o país com um plano e o estão executando sem oposição.
De volta ao keynesianismo
Nos Estados Unidos de Trump ainda presidente, o Congresso aprovou como verba emergencial, agora em dezembro, um pacote adicional de 900 bilhões de dólares. Se trata de um reforço dos 2,3 trilhões aprovados em março para ajudar a economia em situação de crise provocada pela pandemia. Desse dinheiro, 25 bilhões serão destinados a ajudar inquilinos que não estão conseguindo pagar aluguéis. Para o trabalhador desempregado, são destinados 300 dólares semanais, 100 dólares a mais para os trabalhadores autônomos.
Ou seja, a meca do neoliberalismo está se dando conta de que sem dinheiro no bolso do trabalhador a economia não gira. O que será que acontecerá depois disso? Não tem outra alternativa senão a volta ao keynesianismo. O Estado terá que inventar um novo New Deal, para que a economia não pare.
Durante a crise sub prime, a General Motors estava para quebrar. O Tesouro entrou como sócio, bancou a crise, ninguém foi demitido. Passada a tormenta, o Estado deixou a sociedade e tudo voltou como dantes. Não como aqui, que o Estado patrocina a quebra e a saída do mercado das maiores empresas de engenharia e construção do país.
Por que isso vale para os Estados Unidos e não vale para o Brasil? Ué. O que é bom para os Estados Unidos já não é bom para o Brasil? Faça o que eu mando, não faça o que eu faço. Essa é a lei do mais forte, a lei do império para submeter suas colônias.
Enfim, 2021
No Brasil nada disso será resolvido com a eleição das mesas da Câmara e do Senado e menos ainda com a possível eleição de 2022.
O Brasil precisa de uma ruptura e de uma Junta de Salvação Nacional que prepare a nação para uma transição que não seja tutelada, mas que seja uma transição com soberania popular.
Por isso iniciei desejando um feliz 1980. Vamos começar tudo de novo! Trabalhar nas pequenas comunidades, organizar o povo para uma transição que signifique realmente a conquista da independência e da soberania.
Paulo Cannabrava Filho é editor da Diálogos do Sul
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