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Revogaço de Lula na área ambiental é só o começo e por ora freia "máquina de destruição"

"Vai dar muito trabalho. O governo Bolsonaro trabalhava em parceria com crime ambiental”, resume Márcio Astrini, do Observatório do Clima
Leanderson Lima
Amazônia Real
Manaus

Tradução:

O revogaço na área ambiental – que foi promessa durante a campanha eleitoral que conduziu Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o inédito terceiro mandato à frente da presidência da República –, foi recebida como uma grande conquista por lideranças indígenas e especialistas ambientais.

Nesta segunda-feira (02), o Diário Oficial da União traz seis decretos assinados por Lula revogando medidas antiambientais e antiindígenas do governo de Bolsonaro. O presidente também está ciente que suas ações governamentais precisam estar atentas e atualizadas com as demandas globais, incluindo as crises climática e ambiental, a mais urgente entre os parceiros internacionais do Brasil.

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Na gestão do ex-presidente, além do crescimento exponencial do desmatamento, ambientalistas, protetores da floresta e os povos indígenas viram o executivo autorizar a prática de garimpo “artesanal” em terras indígenas; além do não pagamento de multas bilionárias para aqueles que praticaram crimes ambientais, sem esquecer o sucateamento de órgãos de fiscalização. Além dos danos irreparáveis ao meio ambiente, a política ambiental de Jair – ou melhor, a falta dela – causou sérios danos à imagem do Brasil no exterior.

“O que está acontecendo é, basicamente, uma reconstrução do zero. Vai dar muito trabalho. O governo Bolsonaro trabalhava em parceria com crime ambiental”, resume Márcio Astrini, secretário-executivo da organização Observatório do Clima, à Amazônia Real.

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Lula instituiu a criação da Comissão Interministerial Permanente de Prevenção e Controle do Desmatamento; o restabelecimento do Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm); e os Planos de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento no Cerrado, na Mata Atlântica, na Caatinga, no Pampa e no Pantanal. Também retomou o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).

Um dos programas de proteção da floresta abandonado no governo Bolsonaro, o Fundo Amazônia, foi restabelecido por Lula. O programa, um instrumento de financiamento por doação internacional, foi criado em 2008 e estava paralisado desde 2019, mesmo com uma doação de ao menos R$ 3 bilhões já repassada por Noruega e Alemanha. Com a medida, o governo da Noruega já anunciou a retomada do programa.

Imediatamente após a retomada do programa, o presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, anunciou a liberação de 35 milhões de euros para o país. Nesta segunda-feira (02), ele esteve no Amazonas, e foi recebido pelo governador Wilson Lima (União Brasil), que apoiou Bolsonaro nas eleições, e é um notório defensor de mineração, inclusive em terras indígenas, e do agronegócio.

O presidente também assinou o retorno da Agência Nacional de Água (ANA) e do do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), que farão parte do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima.

"Vai dar muito trabalho. O governo Bolsonaro trabalhava em parceria com crime ambiental”, resume Márcio Astrini, do Observatório do Clima

Foto: Marizilda Cruppe/Amazônia Real
Para o geógrafo Carlos Duriga, revogaço representa retomada de políticas de enfrentamento ao desmatamento e ao combate a crimes ambientais




Mineração “artesanal”

Uma das medidas do governo Jair Bolsonaro mais repudiadas foi o Decreto nº 10.966, de 11 de fevereiro de 2022, que instituiu o “Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala” e a “Comissão Interministerial para o Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala”, também foi revogado por Lula.

Garimpo ilegal na região do Homoxi, na Terra Indigena Yanomami, em Roraima (Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real/2021) 

O coordenador-geral do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Edinho Batista de Souza, do povo Macuxi, destacou a sensação de “conquista” com o revogaço de Lula. “Foram quatro anos de muitos desafios para os povos indígenas, para o meio ambiente e para o mundo. O meio ambiente é a coisa mais preciosa para a gente, é água, ar, terra, então o que o Lula fez é o cumprimento da Constituição. Garimpo em terras indígenas é crime”, lembra.

Edinho relembra os danos que o garimpo vem trazendo principalmente na Terra Indígena Yanomami, como contaminação, ameaças, violência, desnutrição e fome.

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“Os indígenas Yanomami hoje morrem de fome, principalmente crianças que estão desnutridas por ter uma alta contaminação causada pelo mercúrio na água, nos peixes, e tudo de ruim que está acontecendo”, expõe Edinho, que ressalta que não será fácil combater as práticas de exploração de ouro em terras indígenas, devido a participação de alguns “tubarões” (autoridades e pessoas poderosas).

“A gente sabe quem está envolvido (no garimpo em terras indígenas). Tem políticos, governadores, deputados, senadores… Um monte de gente envolvida neste ato criminoso que está acontecendo em terras indígenas”, finalizou.

Para Márcio Astrini, o que o governo está fazendo agora, com essas medidas, é frear o que ele descreve como uma “máquina de destruição”, que se instalou durante o governo Bolsonaro.

“É colocar uma mínima ordem para voltar a funcionar a governança de meio ambiente no nosso país. Veja que são coisas absolutamente básicas. Ações como, por exemplo, voltar a cobrar multa ambiental no Brasil. Voltar a utilizar o dinheiro de combate ao desmatamento, regulamentar, por exemplo, o Fundo Nacional de Meio Ambiente. Então, você tem uma série de ações que é para você frear o que estava errado e voltar a ter gestão ambiental no nosso país”.

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Astrini analisa que, para além das revogações e novos decretos, há ainda muito a ser feito, como a desintrusão em áreas indígenas, a retomada de demarcação de unidades de conservação, e dos próprios territórios indígenas. O secretário lembra ainda da necessidade de refazer um pacto com os governadores da Amazônia, para que se tenham ações conjuntas de combate ao desmatamento.  Para ele, o Brasil ainda precisa pensar em alternativas econômicas para as áreas que são afetadas pela economia ilegal, a economia do crime.

“Vai ter que colocar alternativas econômicas nessas áreas porque não basta apenas tirar o crime, você tem muito pai e mãe de família, nessas regiões, que hoje infelizmente dependem dessa atividade do crime para poder colocar um prato de comida na mesa do seu filho”, diz, Astrini, que sugere o retorno do programa Bolsa Floresta.


Relatório de transição

O geógrafo e ecólogo, Carlos Durigan, lembra que o relatório da transição governamental já apontava o cenário de terra arrasada na área socioambiental em todas as frentes da gestão pública. Um dos órgãos mais afetados é o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), esvaziado no governo de Bolsonaro.

Foco de incêndio ao longo da via de acesso à Terra Indígena Baú, do povo Kayapó, em Novo Progresso, Pará (Foto: Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real/2022) 

“Na área socioambiental, em especial a desestruturação das agências de estado e de comitês e colegiados como o Conama, além do abandono das políticas ambientais e o sinal verde a crimes ambientais geraram premeditadamente caos, perseguições e degradação em escala nunca vista”, analisa Durigan.

Para o geógrafo, o revogaço representa a retomada de políticas de enfrentamento ao desmatamento e ao combate a crimes ambientais.

“Dá um firme e importante passo na reconstrução das políticas e estruturas necessárias para a retomada das agendas voltadas à conservação e o desenvolvimento sustentável de nossos biomas e ainda reposiciona o Brasil no seu papel de protagonismo nas agendas globais”, concluiu.


Vem mais por aí

O coordenador-executivo da Articulação dos Povos Indígenas (Apib), Kleber Karipuna, também concorda que ainda há outras medidas a serem tomadas pelo novo governo, com base nas reivindicações apresentadas no Relatório Final do Grupo Técnico dos Povos Indígenas. Segundo Kleber Karipuna, a medida que acaba com o “garimpo artesanal” em território indígena foi um dos pedidos feitos neste relatório.

Área de desmatamento no município de Careiro da Várzea, Amazonas (Foto: Alberto César Araújo/Amazônia Real/2021) 

“Há outras medidas como a Instrução Normativa n° 9/2020 (que trata sobre a confrontação de imóveis rurais em terras indígenas), e algumas instruções normativas conjuntas entre a Funai e o Ibama, como a instrução normativa 01, que fala sobre a questão do licenciamento em terras indígenas, principalmente”, diz ele.


Fundo já pode ser utilizado

Um ponto importante levantado por Márcio Astrini diz respeito à PEC da transição, que retirou recursos internacionais do Teto de Gastos do governo. “Quer dizer, o que a gente tem hoje no Fundo Amazônia é dinheiro que pode ser utilizado para retomar as operações de campo, de comando e controle, então isso daí é fundamental”, comemora.

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O secretário executivo do Observatório do Clima sugeriu o uso dos recursos para operações conjuntas com Ibama, com o Icmbio, para refazer os modelos de cooperação com a Polícia Federal, Agência Brasileira de Inteligência (Abin), entre outros.

“A inteligência toda para se detectar quem que é o criminoso, onde está ocorrendo o crime, para ter punição, para (combater) essas máfias que se formaram durante o governo Bolsonaro. Essa possibilidade de utilização do Fundo Amazônia pelo governo federal é extremamente importante é fundamental”, finalizou.

Leanderson Lima | Graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pelo Centro Universitário Nilton Lins. Tem MBA executivo em Gestão de pessoas e coaching, pelas Faculdades Idaam.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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