Pesquisar
Pesquisar

"A América está sob ataque": mirando Biden, republicanos aumentam hostilidade ao México

Conversadores acusam governo democrata de relaxar patrulhamento fronteiriço; hostilidade contra López Obrador também se intensificam
Jim Cason
La Jornada
Washington

Tradução:

Alguns políticos republicanos descobriram um tema que lhes garante manchetes nos meios, e não o estão soltando: “Digam ao presidente mexicano que perceba: ou trabalha conosco ou teremos que fazer as coisas de modo diferente”, advertiu o senador Lindsey Graham, um dos políticos que mais retoma o tema do México a cada semana, se não for a cada dia. 

“A América está sob ataque. Nossa nação está sendo atacada por poderes estrangeiros chamados cartéis de droga no México”, continuou Graham durante uma audiência do Comitê Judicial na câmara alta. “Perdemos o controle operacional de nossa fronteira”, afirmou, e dirigindo-se ao convidado da audiência, o secretário de Segurança Interna, Alejandro Mayorkas, lhe perguntou “Temos controle operacional de nossa fronteira sul agora mesmo, sim ou não?”

Assista na TV Diálogos do Sul

O secretário de Segurança Interna, obrigado a comparecer ao Congresso, tentou explicar que pela primeira vez desde 2011, o governo de Joe Biden está incrementando em outros 300 o número de agentes da Patrulha Fronteiriça. Indicou que no caso de se definir controle operativo como frear todos os ingressos ilegais aos Estados Unidos, “nenhum governo jamais teve controle operacional” da fronteira sul. 

Essa resposta não satisfez nem a Graham nem o seu colega republicano do Texas, John Cornyn, o qual continuou com esta linha de interrogatório: “Sr. Secretário, o senhor entende que tem um problema de credibilidade com o Congresso e com o povo estadunidense? (…) E como o senhor não responde a nossas perguntas e não reconhece responsabilidade… quem presta contas, quem paga o preço, quem é despedido? Bem, o senhor não foi despedido. Deveria ser despedido, mas não se fez isso porque o senhor está implementando as políticas do governo de Biden”.

Entidades apontam papel dos EUA e México em incêndio de prisão mexicana para migrantes

Numa audiência em 28/03 sobre orçamento e operações do Departamento de Segurança Interna, muitas das perguntas foram sobre o México, mas o alvo real dos republicano foi o governo democrata de Biden. Tal como indicou Graham no início, registrou-se uma redução de cruzamentos fronteiriços “ilegais” durante o último ano do governo de Donald Trump comparado com 2021 e 2022. Graham explicou que a resposta é simples: “controle nossa fronteira” disse a Mayorkas. “Regressem às políticas de Trump, que o Congresso trabalhe de maneira conjunta para compor a migração… recuperem o controle da fronteira, persigam os cartéis”.

Mas em uma audiência que, desafortunadamente para Mayorkas, se alongou durante horas, houve alguns temas em que havia um acordo entre os dois partidos, sobretudo em repudiar os comentários recentes do presidente mexicano de que o fentanil não é produzido no México. “O presidente mexicano, o Sr. Obrador, negou que há partes de seu país sob o controle de cartéis. O senhor está de acordo com ele?”, perguntou Graham ao secretário de Segurança Interna. “Não estou”, respondeu Mayorkas. O senhor está de acordo com o secretário Blinken que há partes do México controladas pelos cartéis de droga”, perguntou Graham. “Sim estou”, respondeu Mayorkas.  

Em torno ao tema do fentanil, vários senadores democratas afirmaram que é produzido no México. Mas defenderam o governo democrata e buscaram desarmar a ofensiva unilateral dos republicanos que buscam culpar só o México. 

O senador liberal Cory Booker declarou que “este problema não começou com Joe Biden. De fato, Sr. Secretário, durante os anos do governo de Trump, as mortes por fentanil se incrementaram nos Estados Unidos, correto?”. “Sim”, respondeu Mayorkas.

Confrontados por López Obrador, EUA alegam respeitar direitos humanos a nível global

“Este problema surgiu tanto sob presidentes republicanos como democratas. Não é um tema de partido, é um tema estadunidense. Esta é uma crise estadunidense”, afirmou Booker, que se atreveu a ressaltar que segundo os fatos e dados, “esse problema é impulsado por criminosos dentro do nosso país. Os dados mostram que cidadãos estadunidenses representam 86% dos condenados por tráfico de fentanil, 86%”.

Booker, ajudado por Mayorkas, afirmou que armas de fogo estadunidenses entram no México de maneira ilegal e alimentam a violência do crime organizado do outro lado da fronteira. “Então, apresentar isto só como um problema do México e não discutir o fato de que as armas que estão sendo usadas pelos cartéis, a maioria, segundo o seu testemunho [de Mayorkas] provêm dos Estados Unidos, e que a maioria das pessoas que estamos prendendo ao cruzar a fronteira traficando entra pelos pontos de ingresso, implica que temos que buscar soluções que atendam aos fatos da crise, correto?”. Mayorkas respondeu que “isso é correto”. 

Ao mesmo tempo, os senadores democratas expressaram preocupação sobre algumas das iniciativas da Casa Branca. O senador Richard Blumenthal interrogou Mayorkas sobre versões de que o governo de Biden está contemplando ressuscitar medidas que existiam durante o governo de Trump para a detenção de famílias imigrantes que foram suspensas em março de 2021. Mayorkas respondeu que “não se tomou uma decisão” sobre isso.  

Tudo sugere que o México e a relação bilateral continuarão gerando manchetes para os políticos estadunidenses ao se aproximarem as eleições de 2024. 

Conversadores acusam governo democrata de relaxar patrulhamento fronteiriço; hostilidade contra López Obrador também se intensificam

Yahoo Notícias
"Estados Unidos e México deveriam pôr fim às políticas desumanas que castigam os migrantes", alerta Eleanor Acer, da Human Rights First




Políticas dos EUA violam direito ao asilo e são em parte responsáveis pela tragédia no México

Segundo defensores de imigrantes, advogados e analistas, as políticas migratórias de Estados Unidos violam o direito ao asilo de refugiados e o México é cúmplice em anular esse direito, ao aceitar milhares de refugiados expulsos na fronteira, tudo o que alimentou as condições para a tragédia no centro de detenção de migrantes em Cidade Juárez.

“O incêndio na Estância Provisória de Cidade Juárez na madrugada de 28 de março, no qual pelo menos 40 migrantes faleceram, é consequência das restritivas e cruéis políticas migratórias que compartilham os governos do México e Estados Unidos”, declarou a Anistia Internacional na última quarta-feira (29).  

Assista na TV Diálogos do Sul

O órgão agregou que as políticas migratórias dos Estados Unidos e outros países da região “são cada vez mais desumanas, tornando quase impossível o acesso ao direito de solicitar asilo” e que, em colaboração com Estados Unidos e Canadá para tentar frear a migração, “as autoridades mexicanas estabeleceram faculdades à Guarda Nacional em matéria migratória e militarizaram as fronteiras”.

A política migratória estadunidense durante os últimos anos, tanto sob o governo de Donald Trump e agora com Joe Biden, continua enfocada em frear o fluxo migratório pela fronteira dos Estados Unidos, levando a uma série de incidentes trágicos e violações de direitos humanos de ambos os lados da fronteira.  Porém, aspectos destas políticas, incluindo as que colocaram dezenas de milhares de imigrante e refugiados em acampamentos e centros de detenção do lado mexicano da fronteira, violam os direitos de refugiados, argumentam especialistas e defensores legais. 

Se EUA querem acabar com narcotráfico, devem invadir Wall Street, não o México

“A política estadunidense sob o chamado Título 42 [medida empregada para expulsar refugiados de regresso ao México] viola a lei sobre o asilo”, afirmou a La Jornada Katrina Eiland, advogada do Projeto de Direitos de Imigrantes da União Americana de Liberdades Civis (ACLU), a organização nacional que encabeçou o esforço legal contra a prática de negar o ingresso a solicitantes de asilo sob o governo de Biden, e antes de Trump.


Fechamento do sistema de asilo

“A razão porque há tanta gente aprisionada no norte do México é porque os Estados Unidos fecharam o sistema de asilo”, agregou. 

Mas também sublinhou que “a razão pela qual os Estados Unidos lograram ampliar o número de nacionalidades a quem tem negado o asilo foi o consentimento do México na expansão desse programa. Os Estados Unidos não poderiam tê-lo conseguido sem a cumplicidade do México em ampliar essa medida”. 

Eiland indicou que a ACLU continuará batalhando contra o programa “ilegal” de Biden, incluindo novas versões com outros nomes das mesmas inciativas que se espera que sejam implementadas em maio e que, segundo ela, se parecem às do governo de Trump. 

Outros especialistas coincidem com essa avaliação. “Negar o ingresso de refugiados na fronteira é uma violação da letra e espírito da lei estadunidenses e da lei internacional sobre o status de refugiados”, comenta ao La Jornada a advogada especializada em migração e professora na Universidade de Chicago, Susan Gzesh. “A lei estadunidense sobre refugiados de 1980 estabelece que os refugiados podem solicitar asilo ao chegar aos Estados Unidos entrando ou não por uma porta de ingresso legal. Também estabelece que não podem ser devolvidos ao seu país nem a qualquer outro país onde poderiam ser perseguidos ou inclusive torturados”, agregou. 

Assista na TV Diálogos do Sul

A professora Gzesh indicou que embora a lei permita que as autoridades estadunidenses possam enviar refugiados a um “terceiro país seguro”, o México não comprovou que pode manter condições seguras para refugiados e outros migrantes”. Ainda mais, disse que uma pergunta pendente é se não é tempo para que intervenha a comunidade internacional nesta crise: “onde está o escritório do Alto Comissariado de Refugiados da ONU?”

Ao mesmo tempo, perguntou se os “Estados Unidos não têm responsabilidade pelo fluxo crescente de migração desde as Américas” ao haver criado algumas das condições que expulsam as pessoas de seus países, por exemplo na Venezuela com as sanções econômicas.  

EUA: ataques de republicanos ao México vão impactar eleições em 2024, adverte ativista

Ariel G. Ruiz Soto, analista político no Instituto de Política de Migração (MPI) em Washington, indicou ao La Jornada que por ora o México continua aceitando pessoas às quais se negou a possibilidade de solicitar asilo dentro dos Estados Unidos sob a medida do Título 42, e que isso é possível porque as autoridades de ambos os lados da fronteira afirmam que os migrantes expulsos nunca estavam sob custódia dos Estados Unidos.

Mas Ruiz alerta que não se sabe que justificativa usará o México para receber um grande número de expulsos dos Estados Unidos sem uma audiência sobre seus casos de asilo uma vez que caduque o Título 42 no início de maio. A lei mexicana, afirma, permite à Secretaria de Relações Exteriores determinar caso por caso quais não mexicanos aceitam de outros países, mas se os Estados Unidos expulsarem toda classe de pessoas, “não tenho certeza que será fácil serem aceitos pelo México”.

“Em lugar de culpar os solicitantes de asilo, migrantes ou a “migração irregular”, os Estados Unidos e o México deveriam pôr fim às políticas desumanas que castigam os migrantes e negam acesso ao asilo a pessoas que buscam refúgio”, declarou Eleanor Acer, da organização nacional de direitos humanos Human Rights First. “As pessoas que buscam asilo não deveriam ser criminalizadas e encerradas em cárceres”, concluiu. 

O governo de Joe Biden reiterou que está preparado para oferecer assistência às vítimas do incêndio em Cidade Juárez, mas evitou fazer qualquer referência às políticas que os especialistas citam como responsáveis pelas condições que provocaram a tragédia. 

Por sua parte, o Escritório de Direitos Humanos da ONU declarou hoje que o “incêndio no centro migratório em Cidade Juárez foi uma tragédia evitável: “Uma vez mais, instamos a todos os Estados a adotarem alternativas à detenção de migrantes”.

Jim Carson e David Brooks | Correspondentes do La Jornada em Washington e Nova York.
Tradução: Beatriz Cannabrava.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

Assista na TV Diálogos do Sul


Se você chegou até aqui é porque valoriza o conteúdo jornalístico e de qualidade.

A Diálogos do Sul é herdeira virtual da Revista Cadernos do Terceiro Mundo. Como defensores deste legado, todos os nossos conteúdos se pautam pela mesma ética e qualidade de produção jornalística.

Você pode apoiar a revista Diálogos do Sul de diversas formas. Veja como:


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Jim Cason Correspondente do La Jornada e membro do Friends Committee On National Legislation nos EUA, trabalhou por mais de 30 anos pela mudança social como ativista e jornalista. Foi ainda editor sênior da AllAfrica.com, o maior distribuidor de notícias e informações sobre a África no mundo.

LEIA tAMBÉM

Vox-Abascal-Milei
Xenofobia e delírios ultradireitistas: Vox reúne asseclas em Madri
Xi Jinping - Putin
Encontro de Xi e Putin fortalece relação histórica e aliança contra ofensiva “dupla” dos EUA
Alvaro-Uribe
Colômbia: Uribe pode ser condenado a 12 anos de prisão em julgamento por suborno e fraude
Gustavo Petro
Violação dos acordos de paz: entenda por que Petro vai denunciar a própria Colômbia na ONU