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Natalia Keller Trajber*
Há dias me sinto incomodada com um dos temas que, de tempos em tempos, emerge de maneira sangrenta, trazendo consigo dores intensas, dramas insuportáveis e, para mim, um sentimento imenso de impotência, injustiça, desumanidade e aparente abismo intransponível. Vou tentar explicar, mas peço paciência e, antes de mais nada, a suspensão dos apressados pré-julgamentos, pré-linchamentos e afins, ok?!
Os que conhecem minha história sabem de minha origem judaica, origem esta que embora não seja oficialmente reconhecida, pois não nasci de ventre judeu, marca (assim como outros tantos elementos) a constituição do meu ser, em função principalmente da história de sofrimento e luta do povo judeu que se desdobrou, mais tarde, em outras tantas lutas…
Não sou nenhuma especialista em história judaica, nenhuma conhecedora muito “expert” a respeito do processo de constituição do Estado de Israel, mas tenho pequenos elementos que se entrelaçam com essa história. Entre outras coisas, na época da ditadura militar, foi esse o refúgio de parte muito querida da minha família, que fez um movimento de “regresso” àquilo que se configurava como um lar para os judeus de todo o mundo.
Esse regresso se fez necessário por novos episódios de medo e dor; um instinto de preservação de uma família que, por mais de uma vez, via a sobrevivência dos seus ameaçada, por perseguições e arbitrariedades muitas. Eu ainda não existia, mas essa era já parte de minha história… Essa parte da família ali foi acolhida, se reestruturou, trabalhou, cresceu, viveu suas dores e alegrias (e foram muitas, tanto dores quanto alegrias!!!!), sempre, sempre, sempre sofrendo com os conflitos que todos temos ouvido ao longo de tantos anos.
Estive por lá, e lá vivi experiências incríveis, inesquecíveis, muitas alegrias e também alguns momentos de tensão. Um aprendizado valioso foi o de compreender que boa parte das pessoas que vive ali não concorda com as polarizações e com as ofensivas militares, e que estas mesmas pessoas estão constantemente sujeitas a todas as consequências que esse tipo de conflito inevitavelmente produz.
O israelense comum, o cidadão, não pode nem deve ser responsabilizado e pré-julgado, pré-condenado apenas por ser judeu ou às vezes nem isso, apenas israeli.
Também ao longo de minha vida estive presente em encontros cujas finalidades eram a busca pelo diálogo, a tentativa de estabelecer uma convivência pacífica entre os diferentes povos; essa vivência, inclusive, responde por esse lado que predomina em mim, mais afeito ao diálogo e ao respeito, à resolução de conflitos e ao aprendizado permanente, à construção…
E digo estas coisas todas porque também não concordo com uma política bélica e expansionista à custa de vidas, vidas, vidas, vidas… mas é importante lembrar que há vidas de ambos os lados!
Há dias estou apreensiva, pois a minha família ali está, e são pessoas que dedicaram suas existências a também defender a vida, o diálogo, o respeito, a paz! Há dias não tenho notícias…
Como seria impossível para mim olhar apenas um lado dessa tragédia toda, também confesso que me é impossível dormir depois de ver uma imagem como a que tem circulado aqui pela rede, com uma série de corpos de crianças palestinas mortas pelos recentes ataques do exército de Israel, entre outras…
Dor!! Dor é o que sinto!! Sinto dor por todos os lados, por todos os poros e por todas as perspectivas!!!
Deste conflito não pode sair nada de bom, nada de construtivo, pois temos humanos matando a humanos, irmãos matando irmãos; representantes dignos de um povo sendo mortos por extremistas de outro (e isso vale para os dois lados). É a humanidade matando a si mesma, objetiva e subjetivamente…
Defendo o diálogo e o respeito mútuo como única perspectiva de convivência, de sobrevivência e de desenvolvimento destes dois povos!! Desejo a paz para todos!!!
*bióloga e educadora – colaboração espontânea a Diálogos do Sul