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A violenta repressão contra mulheres mapuche e o novo abalo na base do governo argentino

“Há limites que não se podem passar”, afirmou a deputada da Frente de Todos pela província de Salta, Verónica Caliva
Stella Calloni
Diálogos do Sul Global
Buenos Aires

Tradução:

O desalojamento violento de uma comunidade mapuche de Villa Mascardi no último dia 4, na província de Río Negro, a detenção de sete mulheres com crianças e a transferência de quatro delas à prisão em Buenos Aires, foi a gota que transbordou o cálice e levou à renúncia da advogada Elizabeth Gómez Alcorta, como Ministra de Mulheres, Gêneros e Diversidade da Nação, além de uma reação em cadeia de organismos de direitos humanos, setores sociais e políticos da governante Frente de Todos. 

Nesse dia, quatro mulheres mapuche da Comunidade Lafken Winkul Mapu, detidas por ordem da juíza federal Silvina Domínguez, em Villa Mascardi,  levadas a distintos lugares de detenção para terminar no penal de Ezeiza, foram transferidas por outra ordem judicial de regresso a Rio Negro, ao entender que haviam sido separadas de seus filhos, além de negar o contato com seus advogados.

Domínguez ordenou às forças de segurança que deviam terminar “com o delito”, sem especificar qual, e que fossem detidas todas as pessoas que estavam em diferentes lugares onde se haviam assentado os mapuches reclamando suas terras, sob a ordem de buscas por armas, celulares e outros aparelhos eletrônicos.

A ministra Gómez Alcorta criticou desde o início o operativo montado, de acordo com o novo Comando Unificado de Forças de Segurança, a cargo do ministro de Segurança, Aníbal Fernández, a partir da ordem judicial que pedia o desalojamento da comunidade mapuche do lugar.

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Em um documento oficial ante a justiça, para poder monitorar como eram tratadas e o estado de saúde, além de cuidar da integridade das mulheres detidas pela Polícia Federal e pela polícia de Río Negro, Gómez Alcorta, e outros organismos, conseguiram que finalmente fossem transferidas de volta à sua província. Por outro lado, Alcorta advertiu a gravidade que significava a detenção de sete mulheres indígenas, uma delas líder espiritual da comunidade.

A transferência para Buenos Aires foi ordenada pela juíza federal Silvina Domínguez no caso de Martha Luciana Jaramillo, Andrea Despo, Florencia Melo e Débora Vera. Entretanto, Betiana Ayelén Colhuan e María Celeste Ardaiz Guenumil continuam detidas em dependências da Polícia de Segurança do Aeroporto de Bariloche.

Por outro lado, Romina Rosas, que está grávida, encontra-se internada no hospital Ramón Carrillo, de San Carlos de Bariloche.

O desalojamento de alguns poucos hectares em Villa Mascardi esteve nas mãos de 250 uniformizados das forças federais e provinciais. Os advogados defensores apelaram à transferência das quatro mulheres, as quais se agregou uma “pena adicional” ao serem levadas a 1,6 mil km de onde estão suas famílias.

É insólito ademais que a justiça federal as acuse por “incêndio ou outro estrago, por atentado contra a autoridade e usurpação”, de suas próprias terras ancestrais. 

“Há limites que não se podem passar”, afirmou a deputada da Frente de Todos pela província de Salta, Verónica Caliva

David Suazo Quintana – Flickr

Ex-ministra de Segurança do ex-presidente Mauricio Macri, Patricia Bullrich, tratava povo mapuche como delinquentes e terroristas

O presidente Alberto Fernández aceitou a renúncia de Gómez Alcorta, a qual agiu em defesa de Milagro Sala, a dirigente da organização Tupac Amaru, detida ilegalmente desde 16 de janeiro de 2016 por ordem do governador Gerardo Morales, do Juntos por el Cambio, na província de Jujuy, sob acusações de corrupção.

Depois de recordar os tempos difíceis que foram vividos desde a chegada de Fernández, Goméz Alcorta esclareceu em sua carta de renúncia: “Os fatos de conhecimento público dos acontecimentos desatados em Villa Mascardi pelo desalojamento ordenado contra a comunidade LafkenWinkulMapu (…) me resultam incompatíveis com os valores que defendo como projeto político”.

Agregou que “está convencida de que o encarceramento, a negativa da soltura para todas elas e ainda mais a uma mulher grávida de 40 semanas, a incomunicação e a transferência a mais de 1,5 mil km de seu lugar de residência constituem violações evidentes aos direitos humanos”. 

Por outro lado, ela valorizou tudo o que foi realizado em políticas de gênero e diversidades até a atualidade.

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“O que conseguimos nos gera um enorme orgulho, mas sem dúvida é insuficiente enquanto sigam existindo os níveis de violência e desigualdade com os que convivemos todos os dias. (…) Como militante política, sei que ocupamos estes lugares no Estado com o único objetivo de transformar a vida das pessoas. Por isso, sempre estaremos na rua, junto ao povo e nossas convicções, para assegurar-nos de não retroceder nunca e sempre ir por mais”. 

O caso dos mapuches, os quais a ex-ministra de Segurança do ex-presidente Mauricio Macri, Patricia Bullrich, tratava como delinquentes e terroristas, produziu uma severa crise no governo.

A denúncia do Centro de Estudos Legais e Sociais (CELS) esclarece que a detida Romina Rosas “está em um quarto de um hospital com dois uniformizados e com uma câmera que a grava permanentemente. A cena só pode ser lida “no marco da violência obstétrica, da tortura e do tratamento humilhante”, sustentou o organismo, citado pelo diário Página/12.

Por outro lado, em entrevista ao periódico Tiempo Argentino, a deputada da Frente de Todos pela província de Salta, Verónica Caliva, expressou sua solidariedade com as mulheres e com o povo mapuche e disse que este tema será tratado no Encontro Plurinacional de Mulheres e Diversidades, que se realiza na província de Jujuy. 

Caliva assinalou que na próxima semana “vamos seguir discutindo dentro do bloco porque há limites que não se podem passar e deve-se reparar urgentemente tanto dano que o Estado e os governos fazem às comunidades indígenas”. 

Stella Calloni | Correspondente da Diálogos do Sul em Buenos Aires, Argentina.
Tradução: Beatriz Cannabrava.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Stella Calloni Atuou como correspondente de guerra em países da América Central e África do Norte. Já entrevistou diferentes chefes de Estado, como Fidel Castro, Hugo Chávez, Evo Morales, Luiz Inácio Lula da Silva, Rafael Correa, Daniel Ortega, Salvador Allende, etc.

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