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Peru: Enquanto preocupação é economia, alimentação popular salva vida na pandemia

Os bolivianos não são comunistas, socialistas nem chavistas. São simplesmente bolivianos, embora isso arrepie as meninas da TV e seus acólitos
Gustavo Espinoza M.
Diálogos do Sul Global
Lima

Tradução:

Há determinados temas, ou propostas, que simplesmente espantam certas pessoas. Falar às apresentadoras de televisão ou a certos jornalistas, da necessidade do controle de câmbio, lhes soa como uma heresia intolerável.

Propor a necessidade de estabelecer limites aos juros bancários, lhes parece espantoso. Até se arrepiam. No fundo, é o medo à vitória do povo que os aterra.

Não sabem o que fazer, onde ficar, o que dizer. Apenas balbuciam algumas frases assegurando que isso “não pode ser”, que isso “é impossível”. Não lhes cabe na cabeça que alguém se atreva a propor algo que julgam demoníaco, sinistro, aleivoso, absolutamente inconcebível.

Lemos há alguns dias em um diário local uma afirmação no mesmo sentido: “Espantando o investimento estrangeiro”, dizia a nota na qual se comentavam declarações atribuídas a um candidato presidencial. Ele havia tido a ousadia de considerar “inviáveis” dois projetos de mineração: Tía María de Las Bambas.

Para o diário aludido, essa afirmação era inaudita e certamente intolerável. Pretender levá-la à prática, era gerar o colapso da mineração e o fim dos investimentos no Peru de hoje. Nem falar nisso!

E é que para eles, o investimento na mineração é por si mesmo símbolo de progresso, desenvolvimento, bem-estar e bonanças. Para ele deve se estabelecer, então, a prioridade das prioridades. Colocá-lo acima de tudo: a vida rural, a população camponesa, a produção de alimentos, a proteção das águas, a vida do gado. 

Nada disso é mais importante – dizem – que entregar à Southern jazidas minerais e, com elas, ouro, prata, cobre e outras riquezas. 

Não é difícil rebater tamanha insensatez: se a mineração fosse sinônimo de bonança, os povos que vivem em Cerro de Pasco, Apurímac, Huancavelica e outras regiões, gozariam do maior bem-estar.

Teriam hoje mesmo vigorosas fábricas de oxigênio, hospitais de primeiro nível, leitos de UTI em abundância, escolas e colégios altamente qualificados, moradias luxuosas e até privilégios requintados: piscinas em casa, saunas domésticas, clubes sociais, lagos artificiais e muito mais.

Mas acontece que não têm nada. Serão tão torpes que não repararam que podem viver na glória com o investimento mineral que recebem? O assunto é outro.

Os bolivianos não são comunistas, socialistas nem chavistas. São simplesmente bolivianos, embora isso arrepie as meninas da TV e seus acólitos

elmontonero.pe
Entregar à Southern jazidas minerais

Ainda não derrotamos a infausta pandemia que hoje oprime o mundo. Nestes doze meses de privações coletivas, o que as pessoas têm comido? Pepitas de ouro? Tabletes de prata? Macerado de cobre? Ou abundantes bilhetes verdes que alimentaram a alma de cada um dos peruanos? 

É preciso ter sequer dois dedos de frente para perceber uma realidade irrecusável: nestes tempos de crise comemos a cada dia os produtos dos vales andinos e da costa. 

Temos nos alimentado de batata, mandioca, batata doce, milho, quinoa, arroz e outros produtos que serviram para nutrir os peruanos e assegurar que ninguém morra de fome. E os produtos saíram do Valle de Tambo, das regiões andinas do Cusco, das bacias leiteiras de Cajamarca.  

Não foi o “investimento mineiro” que salvou nossos compatriotas. Foi a alimentação popular, muitas vezes administrada em Comedores Comunitários, que permitiu a sobrevivência de milhões de lares em nosso país. Pareceria, no entanto, que há quem não se dê conta disso. 

Porém há mais, quando se trata de enfrentar a crise alguns buscam lucrar com as prementes necessidades da maioria. E então colocam preços proibitivos ao que podem oferecer: leitos, balões de oxigênio, laboratórios. 

Neutralizar isso, controlar preços, bloquear a especulação, reduzir as coisas ao seu verdadeiro custo e impedir que o sistema financeiro aumente seu tesouro oprimindo os devedores nos bancos. Isso é um crime?

Aqueles que sustentam essa política, asseguram que não se pode “atentar contra o livre mercado”. E para eles, a liberdade de mercado consiste em permitir que quem tem o controle sobre o que quiser às populações mais famélicas e que estas, se não puderem pagar, simplesmente morram. Pensar de outro modo é “chavismo”.

Na Bolívia, antes de Evo às empresas mineiras levavam 83% dos lucros e deixavam 17% para o Estado. Quando caducaram os contratos que haviam subscrito com o Estado Boliviano, Evo dispôs que se invertessem os termos: 83% para a Bolívia e 17% para as empresas exploradoras do mineral. 

No início as empresas recusaram a oferta, protestaram, disseram que iam denunciá-la, que era inadmissível. Mas, finalmente, aceitaram. E agora essa é a norma da exploração mineral no país do altiplano. Por isso o Estado Boliviano conseguiu avançar e resolver muitíssimos problemas da população. 

Por isso fracassou o Golpe contra o Evo e seus autores tiveram que “devolver o Poder” que haviam tomado. É difícil entender isso? 

Os bolivianos não são comunistas, socialistas nem chavistas. São simplesmente bolivianos. Nós poderemos, finalmente, ser peruanos, embora isso arrepie as meninas da TV e seus acólitos. 

Gustavo Espinoza M. , Colaborador de Diálogos do Sul de Lima, Peru.

Tradução: Beatriz Cannabrava


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Gustavo Espinoza M. Jornalista e colaborador da Diálogos de Sul em Lima, Peru, é diretor da edição peruana da Resumen Latinoamericano e professor universitário de língua e literatura. Em sua trajetória de lutas, foi líder da Federação de Estudantes do Peru e da Confederação Geral do Trabalho do Peru. Escreveu “Mariátegui y nuestro tiempo” e “Memorias de un comunista peruano”, entre outras obras. Acompanhou e militou contra o golpe de Estado no Chile e a ditadura de Pinochet.

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