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Após 3 tiroteios em 5 dias, EUA celebram Dia de Ação de Graças. Ataques viram parte da rotina

Nesta quarta-feira (23), 4 estudantes foram feridos a bala fora de sua escola na Filadélfia, pouco depois de o dia de aula acabar mais cedo em razão do feriado
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

Já nem obrigado se pode dizer sem balas. No país avançado mais armado e violento do mundo se registraram mais de 600 tiroteios massivos – com 4 ou mais vítimas – só neste ano, ou seja, uma média de dois a cada dia.

Na terça-feira à noite, enquanto clientes em um Walmart em Chesapeake, Virginia, compravam os ingredientes para a tradicional ceia do Dia de Ação de Graças que se festeja nesta quinta-feira (24), um homem armado – identificado como um dos gerentes da loja – sacou uma pistola em um dos quartos para reuniões de empregados e começou a disparar ao azar contra seus colegas, matando seis e ferindo pelo menos outros seis antes de se suicidar. “Acabo de ver assassinarem três dos meus amigos”, comentou uma das trabalhadoras que se encontrava nesse quarto.

Três dias antes, em um bar gay em Colorado Springs, um jovem de 22 anos armado com um rifle semiautomático e uma pistola matou 5 pessoas e feriu outras 17. Há perguntas sobre por quê as autoridades não confiscaram as armas do suspeito em 2021 depois de ser detido quando sua mãe reportou que a havia ameaçado com uma bomba caseira.  

Nesta quarta-feira, quatro estudantes foram feridos a bala fora de sua escola na Filadélfia, pouco depois de o dia de aula acabar mais cedo em razão da ponte do Dia de Ação de Graças. “Estamos permitindo que as pessoas circulem com armas de fogo e façam o que o diabo queira nesta cidade… poderíamos ter perdido um menor de idade hoje”, declarou um furioso chefe de segurança do distrito escolar.

Pela primeira vez, empresa de armas é responsabilizada por tiroteio massivo nos EUA

Embora cada incidente em um lugar público seja notícia e provoque temores, ainda mais terrível é que se tornou algo “normal”. Ainda mais, as imagens, promoção e defesa das armas por líderes políticos, apesar dessas notícias, não deixam de assombrar qualquer observador. A campanha eleitoral de Glenn Youngkin a governador do estado de Virginia, onde ocorreu este último incidente – e onde 10 dias antes um jovem matou três estudantes da Universidade de Virginia – é uma imagem de dois homens disparando um rifle com o lema “nosso país, nosso direito”. Ontem, o governador repetiu a mesma mensagem de sempre lamentando a terrível tragédia – sem mencionar as palavras “homem armado” nem “armas”.

Em 2022, até a data de hoje, foram registrados 608 incidentes de tiroteios massivos, definidos como aqueles com quatro ou mais vítimas (feridos e/ou mortos), segundo o Gun Violence Archive [https://www.gunviolencearchive.org]. O mais grave deste ano foi o massacre de 19 crianças e duas professoras em uma escola primária de Uvalde, Texas, em 24 de maio.

Nesta quarta-feira (23), 4 estudantes foram feridos a bala fora de sua escola na Filadélfia, pouco depois de o dia de aula acabar mais cedo em razão do feriado

Mathias Wasik – Flickr

Os Estados Unidos são o país com a população mais armada do mundo: 120 armas para cada 100 habitantes

No que vai de 2022 até hoje, calcula-se que mais de 39 mil pessoas faleceram por balas (mais de 21 mil destas por suicídio com arma de fogo). Aproximadamente 291 dessas vítimas são crianças de 0 a 11 anos de idade. Tudo indica que este será o ano de maior violência com armas de fogo nos últimos 8 anos – período em que a Gun Violence Archive vem realizando essas contagens – e que o total mais que duplicou (em 2014, houve 273 tiroteios massivos). 

“São as malditas armas”, afirma Shannon Watts, fundadora da organização pelo controle de armas Moms Demand Action, no tuíte que enviou comentando estes últimos incidentes. Ela acrescenta que “400 milhões de armas em mãos de civis junto com leis fracas sobre armas nos brindaram uma taxa de homicídios por armas 25 vezes mais alta que qualquer outra nação equivalente”. 

Os cinco principais fabricantes de rifles de assalto dos Estados Unidos obtiveram pelo menos 1,7 bilhão de dólares em vendas de armas do tipo AR-15, frequentemente empregadas em tiroteios massivos durante a última década, segundo uma investigação legislativa.

O Dia de Ação de Graças, feriado oficial que se festeja na última quinta-feira de novembro, reunindo famílias e amigos para expressar gratidão pelo que se goza e se tem, e que marca o mito da origem oficial da nação há 401 anos com a primeira colheita – graças aos indígenas – dos colonizadores europeus que chegaram de maneira indocumentada a estas terras, se realizará este ano com vários ausentes, vítimas das armas de fogo.

Porém o Thanksgiving também é considerado um “Dia Nacional de Luto” por diversas organizações indígenas, declarado há 53 anos, e será comemorado em Plymouth, Massachusetts, perto do lugar onde chegaram os chamados peregrinos europeus. Com isso, se recordará a outra história do país, incluindo a ocupação e expansão colonial que expulsaria os indígenas de suas terras, destruindo suas nações e povos. Tudo com o uso de armas de fogo (os chamados peregrinos chegaram armados a estas terras).

Após novo tiroteio nos EUA, republicanos ignoram apelos e sugerem armar professores

Hoje em dia, os Estados Unidos são o país com a população mais armada do mundo: 120 armas para cada 100 habitantes. Com menos de 5% da população mundial, o país tem 46% das armas do mundo em mãos civis, segundo o Small Arms Survey.

Se isto é algo a ser agradecido durante os jantares tradicionais – com seu menu indígena – este Dia de Ação de Graças ainda está em disputa.

David Brooks | Correspondente do La Jornada em Nova York.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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