Pesquisar
Pesquisar
Foto: Mary Attaway / Flickr

Campos de concentração e desmonte do Estado: por que “Project 2025” de Trump não preocupa?

Trump tem dito que usará forças armadas para suprimir dissidentes, perseguir penalmente seus adversários políticos, anular direitos e liberdades civis
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

Beatriz Cannabrava

A menos de cinco meses da eleição estadunidense, a pergunta no ar é: passarão? Esta coluna está em perigo de se tornar monotemática e até tediosa, mas é quase impossível não continuar focando na ameaça neofascista que enfrenta o superpoder e suas implicações potencialmente catastróficas tanto dentro dos Estados Unidos quanto para seus vizinhos próximos e longínquos no mundo.

E é a segunda chegada. Já esteve no poder o bufão perigoso, e depois muitos celebraram que “o sistema” democrático resistiu às investidas sem precedentes desencadeadas por Trump, culminando na primeira tentativa de um golpe de Estado neste país (um tipo de autogolpe mais precisamente), e sobreviveu. Mas agora ele e seus aliados prometem retornar e vingar-se contra tudo o que não lhe permitiu manter e exercer seu poder.

Leia também | Biden x Trump: EUA vão ter que decidir quem é o “menos pior”, apontam pesquisas

Suas promessas são parte de uma série de propostas para um projeto de nação neofascista. O plano mais desenvolvido deste projeto que se conhece publicamente chama-se Project 2025, elaborado pela Heritage Foundation junto com mais de 100 das principais organizações conservadoras do país. Seu plano de ação, chamado “Mandato por liderança: a promessa conservadora”, inclui, em suas quase 900 páginas, todos os passos e medidas que serão realizados nos primeiros 180 dias de um governo de Trump.

O objetivo é reverter o que chamam de “a longa marcha do marxismo cultural através de nossas instituições”, e, portanto, a tarefa é depurar o governo federal através da “ação coletiva de nosso movimento” para resgatar a república das garras da “esquerda radical” que, segundo eles, se apoderou do país.

Combate a “esquerda radical”

Além da notícia de que estamos vivendo sob um governo de “esquerda radical” – quem sabia que Biden e sua equipe são aparentemente marxistas? – o projeto de país que esses grupos impulsionam começa com uma purga massiva de todas as secretarias, agências e outras organizações do Poder Executivo e substituí-los por funcionários leais ao projeto direitista.

Dentro deste projeto, junto com outras propostas desenvolvidas por alguns dos gênios anti-imigrantes do primeiro governo de Trump, está a deportação massiva de indocumentados mais abrangente da história do país, incluindo a construção do que seriam campos de concentração para migrantes, que o candidato promete.

Leia também | Com Biden ou Trump, EUA estão condenados à violência e ao absurdo

Ademais, Trump tem dito que usará as forças armadas para suprimir dissidentes, perseguir penalmente seus adversários políticos, anular direitos e liberdades civis e, claro, desmantelar ou anular regulamentações ambientais e sobre armas de fogo (as poucas que restam), permitir a continuação do ataque contra os direitos das mulheres em relação ao controle de seus corpos e iniciativas para uma reforma conservadora da educação.

Criminoso incontestável

Nada disso é segredo. Nada sobre o curriculum vitae do candidato presidencial republicano está oculto: criminoso condenado, estuprador, presidente com dois impeachments, fraude empresarial e fraude eleitoral, golpista, xenófobo, promotor de conceitos neofascistas (os imigrantes “envenenam o sangue” dos Estados Unidos), e negacionista das mudanças climáticas e outras verdades científicas e mais. Tudo se sabe. E continua empatado ou ganhando nas pesquisas.

O que fazer diante desta ameaça de que os neofascistas “passarão”? Alguns dizem que a única saída é promover o voto antitrumpista ao optar por Biden, mesmo que poucos o queiram. Hannah Arendt, que se tornou essencial para entender o momento, em seus apontamentos sobre Brecht comentou que “os grandes criminosos políticos têm que ser expostos, e especialmente expostos ao riso”.

Leia também | Constituição dos EUA não impede que Trump exerça presidência a partir da prisão

A burla e o uso do humor contra os criminosos políticos são necessários, mas vale lembrar que no passado isso não foi suficiente se não for acompanhado de um grande movimento de resistência. Aqui ainda mal se ouve esse grito massivo tão urgente de “não passarão”. Oxalá não demore muito mais.

Bônus Musical | Resistance Revival Chorus with Rhiannon Giddens – All you fascists bound to lose

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

LEIA tAMBÉM

Navio da amizade Xi Jinping convida América Latina à construção do novo sistema global
Navio da amizade: Xi Jinping convida América Latina à construção do novo sistema global
Coreia do Sul e Geórgia os interesses nacionais frente à “ordem baseada em regras”
Coreia do Sul e Geórgia: quando as demandas internas se chocam com os interesses do Ocidente
Lavender o uso de IA por Israel para automatizar o extermínio na Palestina
Lavender: a inteligência artificial de Israel e a automação do extermínio palestino
Programas de deportação não resolvem crise migratória nos EUA, afirma especialista
Programas de deportação não resolvem crise migratória nos EUA, afirma especialista