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Foto: Ricardo Stuckert / PR

Cannabrava | Lula se perdeu nos atos de 1º de maio

Há que buscar gente mais competente para compor o núcleo duro da Presidência e gerir a Comunicação e a Inteligência
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

Lula se perdeu. Perdeu a oportunidade de dar a palavra de ordem para os trabalhadores, mobilizá-los para as grandes causas, como a defesa da soberania, vilipendiada desde o golpe contra Dilma em 2016.

Perdeu a oportunidade de falar aos milhões de contrapropistas e desempregados que necessitam da proteção do Estado. Podia ter ajustado a regulamentação das leis trabalhistas para essa categoria hoje majoritária entre os trabalhadores.

Nada menos que constrangedor foi ver aquele imenso espaço com uns gatos-pingados a assistir. Lula deu uma bronca dizendo que foi mal convocada. Foi, sim. Organizada pelas centrais que terceirizaram dando a organização para uma empresa do Rio de Janeiro. Acharam o quê? Que a simples presença de Lula e de alguns cantores seria suficiente para mobilizar as massas?

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Que vergonha! Se comparado com os atos convocados pelos bolsonaristas e os neopentecostais em São Paulo e Rio de Janeiro. Devia ter sido um grande ato público mobilizador. Lula deveria ter feito um discurso de estadista, como sabe fazer. Fez um discurso de sindicalista derrotado. Pelo amor de Deus, onde estão os comunicadores do governo.

Há que levar em conta que a simples presença do presidente da República em um ato o transforma em ato oficial. Fracasso também de todo o aparato de inteligência e comunicação do governo. Todas as instituições relacionadas com o governo deveriam ter sido mobilizadas para fazer do ato do governo um grande ato.

Deixa em evidência que o governo está a perder a guerra das narrativas, a guerra comunicacional e psicossocial. Prova de que há que buscar gente mais competente para compor o núcleo duro da Presidência e gerir a Comunicação e a Inteligência. Nesta também houve falha. A Inteligência deveria ter alertado o presidente sobre a praça vazia.

Bolsonaro e os neopentecostais seguem dando lição de organização e de mobilização. Bolsonaro é criminoso, deveria estas isolado numa prisão de segurança máxima. Longe disso, certo da impunidade, continua em campanha. Não pode se candidatar, mas segue em campanha.

Que ninguém queira admitir que o que enche a Avenida Paulista ou as areias de Copacabana seja gente do povo. É povo, sim, irredento e marginalizado, que encontrou a salvação na igreja e nos Evangelhos. A esse povo há que dizer a verdade que é a grande mentira na interpretação da Bíblia, a verdade de que a luta de todos é a luta pela Libertação Nacional.

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Não é introduzindo Deus e Bíblia nos discursos que vai corrigir a comunicação com o povo evangélico. O buraco é mais fundo. Tem que ter uma estratégia de comunicação, pensada globalmente, e utilizar todo aparato de comunicação que o governo tem à disposição. É impressionante a máquina de comunicação do Estado. Tome como exemplo que em cada ministério há um departamento de Comunicação, com muita gente empregada e muito bem equipados. Na falta de uma estratégia atual individualmente a prestar informação à mídia.

O aparato de comunicação é tão grande quanto ineficiente. 

Lula em certo momento pediu votos a Boulos infringindo a Lei Eleitoral. É grave porque se a mais alta autoridade pode, os partidos vão acha que liberou geral, e se acham no direito de infringir a Lei. O Tribunal Superior Eleitoral, atento ao cumprimento da Lei, tem que punir Lula pela desobediência, metendo-lhe logo uma multa, para não servir de exemplo de impunidade.

Podia, tendo Boulos a seu lado, falar do trabalho social que o deputado mais votado tem feito junto aos sem-teto, falar que juntos vão enfrentar o déficit habitacional. Bastava enaltecer a figura do líder, não precisava pedir votos. 

“A esquerda perdeu as ruas e isso deveria soar como um alerta máximo para as hostes do Lulismo”, adverte a Folha de SP em editorial, intitulado “Lula e os fósseis do sindicalismo”, e prossegue dizendo que “ou as forças políticas em torno do PT se atualizam, inclusive nos temas relacionados ao trabalho, ou correrão mais riscos de ser derrotadas nas próximas eleições”.

Que tão próximos estamos das eleições de outubro nos mais de 5,5 mil municípios, 41 deles com mais de 500 mil habitantes, somando 58,8 milhões de eleitores. São Paulo tem 645 municípios e Minas Gerais 853, o maior número no país.

O município é a célula mater da cidadania. É ali que tudo acontece, desde o buraco na rua, até as manifestações culturais de nosso povo. A eleição de vereadores e prefeitos tem que ser encarada estrategicamente. Campanha eleitoral é, sobretudo, meio de comunicação em que se utiliza todas as mídias e mais, o corpo-a-corpo com os eleitores.

Com relação ao apoio a Boulos, é parte de um acordo firmado dois anos antes. Bastava com explicitar os termos do acordo que garante o apoio do PT à candidatura dele.

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E veja o seguinte. Lula governa com uma coalizão com mais de uma dezena de partidos. Nesse saco de gatos, cada um deveria ser advertido e mobilizado para levar gente ao ato de 1º de maio, posto que a presença do Presidente transforma qualquer ato em ato oficial de governo.

Faltou comando, faltou visão estratégica, faltou o discurso inflamado com as palavras de ordem cruciais para o momento atual como é a questão da soberania nacional, os fenômenos climáticos em consequência do aquecimento global que estão matando nossa gente, a questão indígena, enfim, a pauta é grande e não poderia deixar de lado os Brics.

Tinha que ter feito um discurso de estadista, não de um líder sindical derrotado. Sabe o caminho das pedras para falar como estadista. É isso, faltou comando, faltou competência de sua entourage. 

A propaganda eleitoral só é permitida após o dia 15 de agosto do ano em que se realiza a eleição. O que fazer se o capitão Tarcísio sair pedindo votos para Ricardo Nunes? É isso. A Lei tem que ser igual para todos, princípio basilar da democracia. O período de convenções e registros de candidaturas tem início em julho.

O tempo é exíguo. Não se pode perder tempo com firulas. Há que sair dizendo a verdade ao povo, a verdade da ação golpista dos Estados Unidos, a verdade da reconquista da soberania nacional, e que a luta pela libertação nacional é contínua.

*   *   *

Paulo Cannabrava Filho é autor de uma vintena de livros em vários idiomas, destacamos as seguintes produções:
• A Nova Roma – Como os Estados Unidos se transformam numa Washington Imperial através da exploração da fé religiosa – Appris Editora
 Resistência e Anistia – A História contada por seus protagonistas – Alameda Editorial
• Governabilidade Impossível – Reflexões sobre a partidocracia brasileira – Alameda Editora
 No Olho do Furacão, América Latina nos anos 1960-70 – Cortez Editora


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1957. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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