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Jorge Rendón Vásquez*
O Direito do Trabalho está definido como o conjunto de normas reitoras do trabalho sob dependência e remuneração de uma pessoa para outra por contrato.
Este trabalho configura a relação característica da economia capitalista, na qual as pessoas carentes de capital –que são a maior parte das que podem realizar um atividade econômica- têm necessariamente que entregar sua força de trabalho a uma pessoa privada ou pública para ter um ingresso económico que permita sua subsistência e das pessoas sob sua responsabilidade.
O Direito do Trabalho, em suma, é o ramo do direito –ou da superestrutura jurídica da sociedade- aplicável a todas as pessoas que trabalham para outrem: operários, empregados no comercio, empregados domésticos, funcionários e empregados públicos.
A Ciência do Direito do Trabalho trata dessas normas, de sua razão de ser e de sua aplicação.
O Direito do Trabalho se generalizou no mundo. Todos os países com economia capitalista o adotam, com maior ou menos extensão, segundo o número de pessoas compreendidas e os direitos e as obrigações que lhe são reconhecidos.
Sua expansão dimana da evolução da base real, ou estrutura econômica, da sociedade capitalista e de suas superestruturas política, ideológica e jurídica.
Conformam a base real: a classe capitalista, proprietária dos médios de produção; e as classes trabalhadoras, que fornecem a força do trabalho. Ambos os grupos estão unidos e, ao mesmo tempo, enfrentados. Estão unidos porque sem médios de produção não seria possível produzir os bens materiais e serviços; e porque sem o concurso da força de trabalho os meios de produção não poderiam funcionar nem as mercadorias chegar aos consumidores e usuários. Estão confrontados porque os capitalistas ganham às custas do trabalho e do esforço dos trabalhadores e seus lucros aumentam com a prolongação do tempo e a maior intensidade do trabalho e a redução das remunerações e outros direitos sociais; e porque os trabalhadores resistem à exploração e, no limite, aspiram aboli-la.
A evolução das relações de trabalho, assim estabelecidas, é uma marcha lenta, e com retrocessos, até uma situação menos penosa para os trabalhadores e com um poder aquisitivo maior, impulsionadas pelos trabalhadores e assegurada por um conjunto de direitos que são, correlativamente, obrigações dos capitalistas. Nenhum desses direitos surgiu por geração espontânea.
Nesta marcha sucederam-se as seguintes etapas:
1o Do a formação da economia capitalista até a Primeira Guerra Mundial;
2o Do o fim da Primeira Guerra Mundial até a Segunda Guerra Mundial;
3o Do fim da Segunda Guerra Mundial até o final da década de 1970; e
4o Da década de 1980 até agora.
A transição de uma etapa a outro se dá dialeticamente, pela acumulação de mudanças quantitativas nas relações entre capitalistas e trabalhadores que adquirem a forma de novas normas jurídicas. Estas alterações, em certos momentos, dão lugar a mudanças qualitativas mais importantes dentro da mesma estrutura capitalista que se manifestam por outras normas jurídicas de maior alcance e efeitos mais importantes.
1a etapa: da formação da economia capitalista até a 1a Guerra
O grande desenvolvimento do mercantilismo e da manufatura, originários do capitalismo como forma generalizada da produção e do comercio, foram a consequência dos descobrimentos geográficos no começo do século XV e promoveram a ampliação do consumo pessoal e produtivo, e o crescimento do mercado. As oficinas artesanais, que dominavam a produção de bens materiais desde o começo da Idade Média, tornaram-se cada vez mais ineptos e insuficientes para atender a crescente demanda. Os comerciantes resolveram este problema apelando à produção em série de produtos em fábricas de manufaturas nas quais congregavam a trabalhadores livres para realizar o trabalho com ferramentas semelhantes às utilizadas nas oficinas artesanais. A liberdade pessoal desses trabalhadores, indispensável para poder contratá-los, derivava do fato de ser alheios à dependência feudal: eram artesãos sem trabalho, filhos de pequenos proprietários agrários e urbanos e servos evadidos dos feudos.
A contratação em massa marcou o começo do trabalho assalariado sob a forma dos contratos de locação de obra e locação de serviços do Direito Romano e embebidos ainda com traços da dependência pessoal, subsistente nas oficinas artesanais em que os mestres podiam castigar fisicamente a seus operários e aprendizes.
A Revolução Industrial na Inglaterra, na segunda metade do século XVIII, concentrou a produção em fábricas novas oficinas, generalizando a invenção e o uso de máquinas. As máquinas, as ferrovias e os barcos de ferro requeriam quantidades crescentes de trabalhadores assalariados, que saiam das cidades e do campo e se aglomeravam em bairros superpovoados e miseráveis. Os trabalhadores continuavam a ser incorporados às empresas sob contratos de locação de obra e locação de serviços, e as leis da oferta e procura, que eram absolutas para o capitalismo liberal. Como o número de trabalhadores disponíveis excedia o dos postos de trabalho oferecidos, os capitalistas impunham suas condições: jornadas de trabalho e esforço extenuante (14 ou mais horas ao dia sem descanso semanal nem dias feriados), e salários cada vez mais reduzidos. Para a teoria econômica liberal, os salários eram regidos pela “lei do bronze” , uma derivação das leis da oferta e procura, segundo a qual quando descendiam aos níveis inferiores aos gastos de subsistência dos operários, a mortalidade e a morbidade destes diminuía a oferta de mão de obra e os salários voltavam a subir. A esperança de vida dos operários era em média de 35 anos. Esta exploração desenfreada incrementava os lucros, que devolvidos à produção faziam crescer e multiplicar as fábricas, as oficinas, os transportes, os comércios, os bancos e outras formas da atividade econômica a um ritmo acelerado.
Desde fins do século XVIII, os trabalhadores de numerosos estabelecimentos começaram a organizar-se para se defender. Em sua maior parte eram operários ocupados no manejo dos meios de produção, identificados em seu conjunto como a classe operária ou o proletariado. Porém, o direito de associação, desfrutado pelos capitalistas, era negado aos trabalhadores pela Lei Le Chapelier, aprovada em 1791 pelos revolucionários franceses e imitada nos demais países europeus. Não obstante, a luta dos operários com maior consciência social persistiu, apesar da perseguição policiais e judicial.
A publicação do Manifesto Comunista de Carlos Marx e Frederico Engels, em fevereiro de 1848, proporcionou aos operários novos caminhos. A luta de classes é imanente à sociedade –afirmou-se nesse documento- e é de duplo sentido. É promovida pelos capitalistas, explorando e reprimindo os trabalhadores, que, por sua parte, têm de lutar para se defender. Para a classe operária a possibilidade de se libertar da exploração deve comportar, definitivamente, a expropriação dos meios de produção propriedade da classe capitalista, e assumir o controlo do Estado por uma revolução.
O Manifesto Comunista foi difundido entre os intelectuais que criticavam à sociedade capitalista entre os dirigentes mais ilustrados entre os operários nos países europeus. A partir daí, o marxismo tem sido um eixo ideológico permanente na conquista dos direitos laborais, e a ação de seus simpatizantes agrupados se manteve como uma constante social de convocatória, organização de mobilizações, reivindicações e direção. No século XX, a existência de Estados com economia planificada (socialista) suscitou uma influência indireta com relação à conquista desses direitos.
A resposta da burguesia à ação ideológica e organizativa dos comunistas foi uma perseguição mais intensa.
A Revolução de 1848 na França, em que a participação da classe operária foi determinante para o triunfo, levou um grupo de seus representantes a compartilhar a direção do Estado por alguns meses. O golpe de Napoleão III em 1851, devolveu totalmente o controle do Estado ao capitalismo.
Durante as décadas de trinta e quarenta do século XIX, propagou-se entre a classe operária da Inglaterra uma tendência que preconizava solicitar ao Parlamento leis de proteção através de cartas assinadas por dezenas de milhares de pessoas. Esse movimento, a que chamaram Cartismo, não alcançou seus fins e, ao contrário, seus dirigentes foram perseguidos e encarcerados. Subsistiu, no entanto, como predisposição dos trabalhadores ingleses confiar na ampliação do marco legal para obter a melhora na condição social.
A exploração dos trabalhadores prosseguiu com similar intensidade, acompanhada de perseguição a seus dirigentes para obriga-los a depor suas reivindicações.
Enquanto isso, o marxismo estendia sua influência na Europa. Em setembro de 1864, a instâncias de Carlos Marx, foi criada em Londres a Associação Internacional de Trabalhadores, denominada Primeira Internacional, com finalidade de promover a comunicação e cooperação entre os operários dos diferentes países para a completa libertação da classe operária da exploração capitalista. Constituiu um centro de debate e esclarecimento sobre a ação da classe operária e um meio de formação dos dirigentes políticos e sindicais dos trabalhadores.
Entre março e maio de 1871, os operários de Paris se sublevaram, protestando contra a derrota da França pela Alemanha na batalha de Sedán, e organizaram a Comuna, que foi o primeiro governo socialista do mundo. Os exércitos da Alemanha e França, concertados, derrotaram. Uns 50 mil operários e intelectuais foram fuzilados e encarcerados. Muitos fugiram para América Latina onde semearam as primeiras sementes do sindicalismo e socialismo que germinaram, particularmente na Argentina, Brasil e Uruguai.
Em maio de 1875, formou-se na Alemanha o Partido Socialdemocrata Operário Alemão, sobre a base da Federação Geral de Operários Alemães, animada por Ferdinand Lassalle, e o Partido Socialdemocrata Operário, dirigido por August Bebel e Karl Liebknecht. Foi o modelo para os partidos social democratas dos demais países europeus que começaram a se organizar em seguida. A ideologia da maior parte de seus dirigentes e filiados era o marxismo. Nas eleições de 1877, o Partido Socialdemocrata Operário alemão obteve 500 mil votos e 77 representante no Parlamento. Alarmados, a burguesia e o governo do chanceler Bismarck fizeram aprovar as leis ilegalidade e perseguição dos social democratas em 1879.
Graças à ação da Primeira Internacional, na década de 1870, generalizou-se a luta pela jornada de oito horas de trabalho, na qual participaram denodadamente os intelectuais e trabalhadores de ideologia anarquista. Nos Estados Unidos a repressão aos dirigentes anarquistas foi atroz. Em 1886, um tribunal de justiça condenou à forca, sem provas, a cinco deles, acusando-os de jogar uma bomba contra a política na manifestação operária de 4 de maio de 1884, na praça Haymarket de Chicago. O julgamento foi uma farsa e um jurado teve que absolver, em 1893, os condenados por essa acusação. Um deles já havia sido morto antes da execução. A Primeira Internacional aprovou declarar o 1o de maio de cada ano dia dos trabalhadores, em memória dessas jornadas reivindicativas e dos dirigentes imolados.
O capitalismo seguia se estendendo pelo mundo. África foi totalmente colonizada pela Grã Bretanha, França, Bélgica, Holanda, Espanha e Portugal. Ásia e Oceania por Grã Bretanha e Holanda. As redes ferroviárias e frotas de barcos permitiam a extração de matérias primas, a distribuição e venda das mercadorias nos países colonizados e a dominação destes. Na América Latina, de economia quase que feudal, surgia também o capitalismo ao impulso dos investimentos de Grã Bretanha, França e Estados Unidos, e com este sistema aparecia a classe operária, tão explorada como nos países colonizados.
Em fins do século XIX, para os dirigentes social democratas e a maioria da classe operária europeia, a única alternativa para acabar com a exploração capitalista era a tomada do poder do Estado, se bem com profundas diferenças. Para uma parte deles se deveria chegar à direção do Estado por eleições (Bernstein, Kautsky) e, para outra, o caminho era a revolução armada (Lenin, cujo partido se denominou Bolchevique).
Na época, as ações da maioria dos operários como greves e manifestações de rua, sacudiam intensamente a sociedade de cada país. Os dirigentes mais ativos e consequentes dos trabalhadores eram anarquistas e social democratas. Ainda que uns e outros tinham como objetivo fundamental a transformação da sociedade capitalista, sua luta imediata era para obter direitos sociais para a classe operária, conseguindo dos Estados normas obrigatórias e dos capitalistas pela via da convenção coletiva, apoiada por greve. Esta atitude foi outra constante nas ações dos trabalhadores para melhorar as condições sociais.
A resposta dos capitalistas se manifestou de dois modos: por um lado, recorrendo à perseguição policiais e judicial, ao encarceramento, a tortura e a eliminação física dos dirigentes políticos e sindicais dos trabalhadores; e por outro lado, com uma campanha de corrupção dos trabalhadores moralmente débeis, sem consciência de classe, atemorizados ou simpatizantes dos partidos de centro e de direita, destinada a quebrantar a unidade sindical, trair a seus companheiros ou renunciar a organização sindical com a ameaça de demissão ou a troco de certos benefícios pessoais.
Em 1891, o papa Leão XIII, preocupado pelo avanço dos social democratas na simpatia da maior parte dos trabalhadores da Europa e da América, expediu sua encíclica Rerum Novarum, em que condena de maneiras mais acre o propósito dos socialista de abolir a propriedade privada, e chamando à reflexão aos capitalistas e aos governos para considerar a gravidade da situação, e apelou para que fosse concedido alguns direitos aos trabalhadores, aos que, não obstante, tratava como servos dos patrões. Esta declaração sensibilizou alguns intelectuais católicos que então começaram a advogar por um tratamento menos duro aos trabalhadores, com a esperança de afastá-los de suas simpatias socialistas.
Até esse momento os direitos sociais adquiridos eram muito poucos.
Em 1864 havia sido promulgada na França uma lei permitindo as coalisões operários temporárias para tratar com os empresários as condições de trabalho. Na Alemanha, por decisão do governo do chanceler Bismarck, o parlamento tinha aprovado as leis do seguro social de saúde, acidentes de trabalho e pensões, entre 1883 e 1889, copiando-as do programa do partido Operário Socialdemocrata e para coibir a adesão popular ao partido. Na França, com um regime republicano, já tinham promulgado uma lei em 1884, derrogando a Lei le Chapelier de 1791, e admitindo a organização sindical permanente e, em consequência, sua intervenção nas negociações e convenções coletivas; em 1898, deu-se a lei do seguro de acidentes de trabalho, financiado pelos empregadores e contratados com empresas de seguros. Com ambas as leis, a burguesia francesa se propunha diminuir os protestos sociais que renasciam depois das horrendas represálias contra os organizadores da Comuna. A jornada de oito horas só tinham vigência a uns poucos países. Algumas destas disposições se reproduziam dificilmente nos demais países mais industrializados e sempre por pressão operária.
Em fins do século XIX e começo do século XX, a doutrina de inspiração social democrata generalizou a noção do contrato de trabalho (a que tinha se referido Carlos Marx em O Capital), diferenciando-a dos contratos de locação de obra e locação de serviços para presença dos ainda incipientes direitos trabalhistas )Luigi Tartufari, 1893; Ludovido Barassi, 1902; Philip Lotmar, 1902). A lei belga de 1900 empregou a expressão contrato de trabalho para referir-se ao trabalho dos operários. A doutrina francesa, por sua vez, demonstrou como algo inerente do contrato de trabalho a dependência jurídica (Henry Capitant e Paul Cuché, 1911) que implicava para os empresários o exercício dos poderes de direção e sanção dos trabalhadores e limitava o salário à participação destes no resultado da atividade econômica.
As novas regras jurídicas aplicáveis à relação de trabalho, generalizada como contrato de trabalho, nesses momentos não chegavam a ser independentes do Direito Civil. O Código Civil alemão de 1901, de muito influência, ainda que já estivesse evidente que se estava constituindo um novo ramo do direito cujo objetivo eram as relações trabalhistas e cujas normas limitavam a oferta e a demanda livres no mercado de força de trabalho. Em outros termos, a contratação dos trabalhadores só podia ser legal se sujeita a essas regras restritivas da vontade dos empresários, o que supunha a intervenção do Estado para efetivá-las e controlar sua aplicação ou o exercício de uma nascente função protetora dos trabalhadores.
Em função da campanha contra a exploração das crianças no trabalho, promovida em meados do século XIX, tinham sido criadas alguns departamentos estatais para inspecionar as empresas e verificar se as disposições protetoras da infância estavam sendo cumpridas. En fins desse século, na maior parte dos países europeus existiam dependências governamentais, em geral nos ministério do Interior, encarregadas das relações de trabalho, e mais para controlar as greves e seus promotores. Em inícios do século XX começam a ser criados os ministérios de Trabalho em vários países europeus (França, Alemanha, Espanha) com a função de fazer que sejam cumpridas as normas trabalhistas. Na Alemanha tinha surgido uma jurisdição trabalhista e um tribunal para arbitrar para arbitrar às negociações coletivas não acordadas em convenções. Seguiu a instauração de uma justiça especializada do trabalho. Em outros países também foram sendo estabelecidos organismos estatais encarregados das relações trabalhistas.
E, 1906, os representantes das organizações sindicais e políticas social democratas aprovaram, na cidade de Amiens, França, uma carta definindo a organização sindical como um corpo unitário de diversas tendências com finalidade reivindicativa, e separada dos partidos políticos de composição operária. As organizações sindicais de Grã Bretanha não aderiram a esta acordo e logo se constituíram nas bases do Partido Trabalhista.
A eclosão da Primeira Guerra Mundial em 1914 aprofundou as diferenças entre os grupos social democratas ou socialistas: os que preconizavam a mudança gradual e por eleições da sociedade apoiaram a guerra em seus países; os partidários da revolução se opuseram.
Um fato de grande transcendência na marcha à conquista dos direitos sociais foi a Constituição mexicana, aprovada na cidade de Querétaro, em 31 de janeiro de 1917, como o ponto alto legal dos ideais pelos quais as maiorias sociais lutaram na revolução que eclodira em 1910. O extenso artigo XXIII sobre o Trabalho e a Previdência Social reconhece os direitos trabalhistas mais importantes que os trabalhadoras lutavam por conseguir no México e outros países. Declara que todo contrato de trabalho de operários, diaristas, empregados, domésticos e artesão se regerá, entre outras, pelas seguintes regras: a jornada máxima de oito horas; o trabalho limitado para as mulheres e os menores; o salário mínimo; a igualdade do salário por igual trabalho; a estabilidade real no trabalho, a sindicalização, a negociação coletiva e a greve, a proteção contra acidentes de trabalho e enfermidades profissionais. Este artigo constituiu uma experiência solitário no mundo e suas prescrições mais importantes foram burladas pela burguesia mexicana consolidada no poder político, mas estava destinado a converter-se em um farol que iluminaria a incerta marcha do Direito do Trabalho no mundo.
2a etapa: da 1a Guerra à 2a Guerra Mundial
Em 25 de outubro de 1917 (segundo o calendário juliano e 7 de novembro, segundo o gregoriano, adotado no ocidente), o Partido Bolchevique tomou o poder político na Rússia, quando este país ainda se encontrava em guerra com a Alemanha, e instituiu um regime socialista cujas medidas iniciais foram a expropriação dos meios de produção dos capitalistas e uma reforma agrária que entregou a terra aos camponeses. Em seguida assinou a paz com a Alemanha. Com o Tratado de Brest-Litovks, de março de 1918, apesar das condições desfavoráveis à Rússia impostas pela delegação alemã. Outra medida importante foi a implantação da jornada de oito horas. A organização do Exército Vermelho, responsabilidade de León Trotsky, permitiu ao novo regime derrotar os exércitos de russos brancos e assegurar a direção do Estado pelo Partido Bolchevique. Nos demais países europeus, partidários da revolução proletária, também organizaram os partidos comunistas.
Como reflexo da revolução russa, em 2 de novembro de 1918, os marinheiros do porto de Kiev, na Alemanha, se rebelaram e constituíram um Conselho de Marinheiros. Em 8 de novembro deflagrou-se uma greve geral em Berlim e outras cidades que se transformou numa revolução cujas consequências imediatas foram: a subscrição de um armistício com os aliados, em 8 de novembro de 1918, com o que terminou a guerra na frente ocidental; a abdicação do kaiser Guilherme II; a proclamação da República; e a constituição do Conselho de Delegados do Povo, que assumiu os poderes Legislativo e Executivo. Neste Conselho se enfrentaram os social democratas, que queriam um entendimento com a burguesia, e os comunistas, ou espartaquistas e outros grupos que aspiravam o estabelecimento de um governo socialista semelhante ao da Rússia. Os social democratas se impuseram depois de uma insurreição promovida pelos segundos, e debelada pela alta oficialidade militar a pedido da realiza e da burguesia, seguida do assassinato no cárcere dos dirigentes comunistas Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo. Em seguida os social democratas propuseram aos dirigentes dos partidos políticos da burguesia um acordo ou pacto pelo qual enquanto eles se comprometiam a continuar reconhecendo a propriedade dos meios de produção pelos capitalistas e a renunciar à revolução, estes deveriam se comprometer a admitir certos direitos sociais aos trabalhadores. Para uma parte da burguesia este foi um pacto necessário, diante da alternativa de uma expropriação como a levada a cabo na Rússia, cuja revolução influía como um catalizador político na maioria dos trabalhadores europeus. O acordo se formalizou inicialmente como um convênio entre o presidente das organizações sindicais, Fernand Legien, dirigente social democrata, e o presidente das organizações empresariais, Lucien Stinnes, e, logo, na Assembleia Constituinte, votando conjuntamente a favor dos artigos da Constituição de Weimar, aprovada integralmente em agosto de 1919.
Alemanha já era então o país mais industrializado da Europa e sua influência na política mundo continuou sendo importante, apesar de sua derrota na guerra e ao Tratado de Paz de Versalhes de 1919 que lhe impôs o pagamento de pesada indenização.
Uma repercussão imediata do que se chamou “o espírito de Weimar” foi a criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT), capítulo XII do Tratado de Paz de Versalhes, com a finalidade de servir como um grande foro mundial no qual os representantes dos governos (50% dos votos) e das organizações de empregadores (25% dos votos) e das organizações de trabalhadores (25% dos votos) foi possível aprovar convênios e recomendações sobre determinados direitos trabalhistas. Os convênios poderiam ser ratificados e, neste caso, seriam incorporados ao direito interno dos Estados. As recomendações seriam pautas de aplicação dos convênios ou guias quando se julgasse que não deveriam ser elevados ainda ao nível de convênios. Os protagonistas da redação e aprovação das normas relativas à OIT foram os delegados dos Estados ex beligerantes, com a participação dos representantes das organizações sindicais social democratas.
Apesar de terem sido muito poucos os membros da OIT em seu início (uns 30), seus acordos se revestiram de certa importância. O primeiro convênio aprovada pela Conferência realizada em Washington em outubro de 1919, declarou que a duração do trabalho não poderia exceder de oito horas por dia nem de 48 horas por semana, o que determinou aos Estados signatários a implantar.
Passados esses momentos de conciliação, a burguesia se reafirmou no domínio do Estado nos países europeus, diferente do que ocorreu na União Soviética, a influência da OIT esmoreceu e, correlativamente, voltou a ser muito difícil o surgimento de novos direitos trabalhistas. Como réplica a essa situação a luta dos trabalhadores, dirigidos principalmente pelos partidos comunistas, manteve sua intensidade.
Na América Latina, os movimentos de protesto social e de reivindicação de direitos sociais se expandiram por efeito da difusão da ideologia marxista e da formação de partidos comunistas e socialistas, cuja atividade se materializava na promoção do sindicalismo e na luta reivindicativa.
As oligarquias e os governos respondiam perseguindo brutalmente aos dirigentes sindicais e políticos de trabalhadores, mas, mesmo assim, a legislação trabalhista continuou a se expandir em pequenas doses para deduzir a pressão social.
Uma característica geral dos novos direitos sociais é ter sido expedido pelos poderes Legislativo e Executivo, em cuja composição predominavam dirigentes políticos vinculados aos grandes empresários ou diretamente a seu serviço. Muito raramente essas normas foram aprovadas por parlamentos ou governos de partidos da pequena burguesia e quase nunca os trabalhadores intervieram em sua elaboração; não tinham representação parlamentar ou se tivessem era ínfima. Os projetos d normas saiam dos gabinetes jurídicos assessores de empresários ou dos departamentos do Estado encarregados das relações trabalhistas que em ocasiões históricas singulares dirigidos por intelectuais de esquerda comprometidos com a defesa dos trabalhadores. (tal foi o caso de Frances Perkins, secretaria do Trabalho durante os três períodos do presidente Franklin D. Roosevelt, de 1933 a 1945, impulsionou a Lei Nacional de Relações Trabalhistas e a Lei de Seguridade Social dos Estados Unidos).
As organizações sindicais, com suas reivindicações, greves, manifestações de rua e, em alguns casos e países, repelindo as agressões dos contratados substitutos pelos empresários, atuavam como uma força de contenção e de agitação social, cujos efeitos e propagação eram temidos pelos empresários, apesar de dispor da polícia e da justiça. As novas normas trabalhistas pareciam ser armistícios impostos e, em certos casos, transações par acalmar o descontentamento social e leva-lo ao refluxo.
Na década de 1920, começa a generalizar-se na doutrina e na norma alemã e italiana, a expressão “legislação trabalhista” e, em seguida, a expressão “Direito do Trabalho”, (na Alemanha: Arbeitsrechts; na Itália Diritto dei Lavoro) que foi reproduzida na Espanha na década seguinte e depois na América Latina, ao mesmo tempo em que se destacava as características pelas quais este novo ramo do direito deveria gozar de autonomia em relação com o Direito Civil.
O pacto social formalizado na Constituição de Weimar não chegou a se consolidar na Alemanha. Os grupos capitalistas mais poderosos se opuseram desde o início da década de 1920 e, com ingentes recursos, passaram a apoiar um incipiente grupo que combatia o Tratado de Versalhes e se declarava inimigo dos comunistas e judeus, denominado Partido Nacional Socialista Operário Alemão, ou nazis, dirigido por Adolfo Hitler, um pintor de terceira categoria exímio e explosivo orador. Este grupo, constituído por batalhões uniformizados como militares, denominados “camisas pardas” (a semelhança do “camisas negras” de Mussolini, com os quais ele tomou o poder na Itália em outubro de 1922), cresceu com a incorporação de numerosos aderentes da classe media e desempregados e com financiamento quase que inesgotável dos grupos e famílias capitalistas mais recalcitrantes da Europa e da América que desejavam deter a ação reivindicativa e política dos trabalhadores e destruir a União Soviética.
Graças a esse apoio, o nazismo se converteu na terceira força eleitoral da Alemanha, em fins da década de 1920. No início de 1933, o presidente da República, marechal Hindemburg, chamou Hitler para formar o governo, em plena crise política. Imediatamente ele se proclamou ditador, ilegalizou os partidos social democratas e comunistas e se fez aprovar por plebiscito realizado em novembro deste ano, obtendo 92 por cento dos votos. Em seguida, perseguiu os comunistas e social democratas, rearmou a Alemanha até convertê-la em uma potencia capaz de colocar doze milhões de pessoas em armas e empreendeu uma campanha de exterminação dos judeus. Em seguida houve a anexação da Áustria e dos Sudetos à Alemanha e a Segunda Guerra Mundial em 1939.
Sob o governo nazista, as organizações sindicais foram abolidas. Elas foram substituídas pela Frente Nacional do Trabalho, cujas sessões deveriam estar conformadas, obrigatoriamente, pelos trabalhadores e funcionários sob a presidência do empresário. Este foi o corporativismo nazista. Muito poucos direitos sociais dos trabalhadores alemães subsistiram, generalizou-se o trabalho obrigatório e, nos países ocupados, o trabalho escravo, acompanhado de assassinato sistemático de milhões de seres humanos. Aplicava-se a teoria da relação de trabalho segundo a qual basta a incorporação à empresa para submissão dos trabalhadores às regras trabalhistas previstas para eles. O próprio chefe de Organização do partido nazista e chefe da Frente Nacional de Trabalho, equivalente ao Ministério do Trabalho, Robert Ley, dirigia as operações. Embora essa teoria tenha obnubilado a alguns teóricos do Direito do Trabalho na América Latina (sobretudo Mario de la Cueva, que a incluiu na Lei Federal do Trabalho do México), ficou definitivamente desqualificada pelas atrocidades que justificou durante a dominação nazista na Europa.
*Colaborador de Diálogos do Sul – Professor Emérito da Universidade Nacional Maior de San Marcos de Lima.