Walt Whitman, em sua linda homenagem a Abraham Lincoln, nos anuncia que o legado do valoroso lenhador se vai extinguindo, ou está a ponto de perecer. Recolhendo as expressões daqueles porta-vozes do governo dos Estados Unidos, pareceria que esta dolorosa premunição se cumpre. Em todo caso, hoje está mais longe do que nunca.
Poderia supor-se que nas Forças Armadas dos Estados Unidos se tem imposto o feminismo, ou que ganhou pontos a luta por igualdade de gênero, tão cara em nosso tempo. Mas não é propriamente assim. Uma andorinha não faz verão.
A senhora Laura Richardson não é flor de qualquer jardim. Tem o que bem poderia denominar-se uma brilhante folha de serviços no Exército estadunidense, onde detenta uma especialidade: a Aviação Militar.
Como o símbolo do Comando Sul é o Condor, e ela é a andorinha, talvez poderia afirmar-se ironicamente que a senhora assoma como uma ave do alto voo. Sua função não tem limite.
Quando nos EUA se fala do Sul, não se alude aos Estados localizados ao Sul de seu espaço geográfico, como poderiam ser Texas ou Florida, mas sim aos países localizados entre o rio Bravo e a Patagônia, quer dizer, a todo o continente.
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A senhora Richardson, a General, veterana de diversas guerras, e que servira, em seu momento, na Coreia do Sul, no Iraque – “Operação Liberdade” 2003 – e Afeganistão, olha hoje com singular preocupação o extenso território que James Monroe já considerava que lhes pertence, em 1923.
Em honra a tão ilustrados antecedentes – o de Monroe, aliás – a hoje General assegurou, em seu momento, que esta região é muito rica em petróleo, outo, prata, cobre, lítio e outros minerais, assim como em água, floresta e biodiversidade. E sustentou, nessa linha, que esses recursos não poderiam beneficiar “potências extracontinentais”, senão os EUA.
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Foto: Comando Sul dos EUA/Twitter
O que pode aportar em matéria de narcotráfico o país que consome mais droga no mundo? E sobre terrorismo, o país mais terrorista do planeta?
“Nos pertencem”, assegurou, fazendo gala à parte de suas funções que lhe permitem também cautelar os interesses dos Estados Unidos “frente ao avanço da China e da Rússia”, que lhes arrepia o corpo.
Se uma declaração assim houvesse sido feita por um funcionário da Casa Branca, poderia ser considerada expressão da voracidade proverbial do Império; mas dita por um alto chefe militar das Forças Armadas dos Estados Unidos – homem ou mulher – parece como uma grosseira agressão que atenta contra as riquezas básicas de países independentes e soberanos.
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Esta declaração, há pouco foi acompanhada por outra: a senhora Richardson tomou a liberdade de atacar a Telesur, a agência de notícias latino-americana que lhe tira o sono, e a RT e outras agências internacionais de notícias não vinculadas aos interesses de Washington.
Para ela, suas transmissões ameaçam a segurança dos Estados Unidos, que ao dizer de Foster Dulles, não tem amigos, mas sim interesses, e levantam os povos. Em outras palavras põem em risco às grandes corporações e o investimento norte-americano; em suma, desestabilizam o capitalismo no plano mundial.
Nesse marco confuso e convulso, Dina Boluarte operou em giro notório na política exterior peruana. Submeteu-se servilmente aos desígnios de USA. E isso, que assomou desde as iniciativas de Lisa Lane – ex-agente da CIA e embaixadora norte-americana no Peru – se viu sobredimensionado a partir da presença da senhora Richardson aqui.
Nos últimos meses, os ministros do Interior e de Defesa viajaram aos Estados Unidos para “intercambiar ideias” referentes à “luta contra o narcotráfico”. Este registra muitos altos índices em USA onde é alto o terrorismo”. Obviamente, esse “intercâmbio” foi desigual. Eles se foram sem ideias e voltaram com as da Casa Branca.
O que pode aportar em matéria de narcotráfico o país que consome mais droga no mundo? E sobre terrorismo, o país mais terrorista do planeta?
Antes que a DEA operasse no Peru, o tráfico de drogas registrava níveis muito baixos. Hoje, é um dos mais altos da região. E, quanto ao terrorismo, registram-se altos índices nos Estados Unidos, onde cotidianamente pessoas enlouquecidas matam crianças em escolas e bairros.
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Se a esta já enfermiça relação entre Biden e o regime de Boluarte e Otárola somamos a presença de tropas norte-americanas que operam aqui em segredo, e que serão acompanhadas por navios de guerra e novo armamento, teremos a imagem de um vínculo belicista que responde a uma política completamente alheia aos interesses do país.
O negócio da guerra não está inscrito no DNA do Peru. E, ademais, o legado de Lincoln, entre nós, não morreu.
Na América Latina inteira, bem pode se esperar com Pablo Neruda “que desperte o lenhador…”.
Gustavo Espinoza M. | Colaborador de Diálogos do Sul de Lima, Peru.
Tradução: Beatriz Cannabrava
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