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Congressistas que acusam Castillo também precisam prestar contas à sociedade peruana

População peruana não sustenta altos salários para que parlamentares entretenham-se com fofocas e esquentando suas bases
Jorge Rendón Vásquez
Diálogos do Sul Global
Lima

Tradução:

Pelo artigo 118º-7 da Constituição, ao Presidente da República lhe corresponde dirigir uma mensagem ao Congresso ao instalar-se a primeira legislatura ordinária anual. É a mensagem do 28 de julho. Esta mensagem deve conter “a exposição detalhada da situação da República e as melhorias e reformas que o Presidente julgue necessárias e convenientes para sua consideração pelo Congresso”.

Em suma, por esta mensagem, o Presidente da República informa ao Congresso e à cidadania sobre sua gestão como chefe do Poder Executivo.

E é o que fez em 28 de julho.

Começou recordando que “Há trezentos e sessenta e cinco dias, neste mesmo recinto, se iniciava meu mandato nascido das urnas eleitorais e, ao mesmo tempo, também se celebrava os duzentos anos de nossa independência. Mas, se temos que falar com a verdade, foi uma independência que até o dia de hoje grande parte das peruanas e peruanos continuam esperando. Apesar de receber um país que emerge da tormenta da pandemia da covid-19 com mais de 230 mil peruanos falecidos; e do desgosto daqueles que se creem donos do país, seguimos avançando com os peruanos e peruanas que depositaram sua confiança de que o Peru deve mudar. […] Neste período no qual não temos tido um só minuto de trégua, venha informar-lhes o que fizemos e anunciar-lhes o que faremos. Não importa que aqueles. que deveriam também informar, tenham ocultado e ignorem nossas conquistas e se dediquem a difamar e mentir, acusando-nos sem nenhuma prova e exigindo-nos, em uma perversa inversão dos princípios elementares do Direito, que provemos nossa inocência”.

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Ao escutar isto, a ira começou a subir nos grupos da direita recalcitrante no Congresso, como o leite a ponto de ferver. 

Mas, Pedro Castillo continuou sua mensagem, sereno: “Resulta inexplicável – disse – o temor e o medo dos grandes poderes políticos e econômicos tradicionais às mudanças que se necessitam. Somos um país que se fundamenta no princípio constitucional da igualdade de todos e todas ante a lei e dentro da lei, pelo qual não se pode permitir privilégios que contradigam este princípio”.

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Foi inaudito para a ultradireita, e a tempestade de imprecações continuou se incubando.

Pedro, não obstante, prosseguiu com calma e sem ir ao confronto que buscavam os outros: “neste segundo ano não vou oferecer a outra face – afirmou – mas sim estender-lhes a mão para trabalharmos juntos em benefício do povo. […] Ocultaram o que fizemos nestes doze meses, como hoje vou passar a demonstrar. Vamos continuar trabalhando e fazendo pátria para que todos os peruanos e peruanas vivamos em uma sociedade mais justa e digna, para eliminar a pobreza, a fome e a injustiça, para que nossos filhos não continuem vivendo em um país tão dramaticamente desigual”.

População peruana não sustenta altos salários para que parlamentares entretenham-se com fofocas e esquentando suas bases

Pedro Castillo – Reprodução Twitter

Já não chama a atenção que certos congressistas esquerdistas tenham sucumbido à contaminação de seus colegas da ultradireita

O resto do discurso foi um informe objetivo das realizações do Poder Executivo no ano transcorrido, com certa preferência para as províncias tradicionalmente esquecidas antes pelo Estado. Se não se pode fazer mais, foi porque o Congresso, que deveria ter dado as leis que a cidadania exige, esteve sempre contra. 

Quando Pedro Castillo terminou, a tempestade de gritos nas bancadas da ultradireita e de certos grupos de aventureiros se desencadeou. Uma imagem da televisão mostrou os congressistas desses grupos gritando desaforadamente, o que fez supor a muitos que é possível que nos seus lares esses congressistas se comportem do mesmo modo. Dois lugares foram nitidamente distinguíveis entre eles, que recordavam a dois personagens da magnífica série de TV El último bastión, dos irmãos Adrianzén, que representavam a duas escravas negras entregues em corpo e alma a servir e defender seus amos brancos nos tempos em que San Martín chegou a Lima para independizar-nos do jugo hispânico.

A partir dessa mesma noite, os meios do poder empresarial desbordaram sua cólera contra o provinciano que, pela vontade da maioria popular, está na primeira magistratura da nação. 

E, no dia seguinte, lhes tocou aos jornais fazer sua parte, como se todos eles fossem os expoentes da opinião pública. Não são. Nenhuma organização popular teria os recursos para pagar esses meios de imprensa, rádio e TV e seus jornalistas e opinólogos de aluguel. São, portanto, investimentos de determinados grupos capitalistas, ou seja, de minorias demograficamente ínfimas, mas donas do poder do dinheiro, do grande eleitor dos grupos políticos da ultradireita e dos aventureiros, agindo sobre milhões de cidadãos para aliená-los com essa campanha permanente e intensa de desinformação e manipulação.

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Já não chama a atenção que certos congressistas esquerdistas ou que pretendem parecer como tais tenham sucumbido à contaminação de seus colegas da ultradireita. É possível que em certo momento tenham tirado a máscara protetora e absorveram o vírus do lobby estéril e da deslealdade que os levou a irmanar-se com eles no voto de alguns projetos nocivos à sociedade. Há alguma vacina contra isso?

Da obrigação do Presidente da República de expor em uma mensagem anual suas realizações, surge uma pergunta: por que os outros poderes do Estado e as instituições públicas autônomas não fazem o mesmo?

O Congresso da República e cada um dos congressistas deveriam também informar à Nação o que fizeram no período anual transcorrido para justificar seus enormes salários. Cada um leva 23 mil soles mensais básicos, ou seja, mais de 22 vezes a remuneração mínima vital. A sociedade não lhes paga para entreter-se com fofocas e para esquentar suas bases.

Do mesmo modo, o Poder Judicial deveria prestar contas anuais de seu desempenho, quantas demandas e acusações ingressaram aos juizados, quantas sentenças emitiram os juízes e vogais, e se o fizeram nos termos fixados pelas leis processuais. A mesma regra deveria ser aplicável ao Tribunal Constitucional e aos governos regionais e locais. 

O povo tem que saber em que e como se gasta seu dinheiro.

Jorge Rendón Vásquez é colaborador da Diálogos do Sul, de Lima, Peru.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Jorge Rendón Vásquez Doutor em Direito pela Universidad Nacional Mayor de San Marcos e Docteur en Droit pela Université de Paris I (Sorbonne). É conhecido como autor de livros sobre Direito do Trabalho e Previdência Social. Desde 2003, retomou a antiga vocação literária, tendo publicado os livros “La calle nueva” (2004, 2007), “El cuello de la serpiente y otros relatos” (2005) e “La celebración y otros relatos” (2006).

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