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Crise climática: cegueira coletiva persiste mesmo com ameaça à vida no planeta

Conclusões sobre elevação da temperatura dos mares e o derretimento das geleiras são alarmantes, mas continuamos alheios aos avisos da Ciência
Flávio Tavares
Diálogos do Sul Global
Brasília (DF)

Tradução:

O mais recente relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM) em torno das mudanças climáticas é tão preocupante que chega a soar como um antecipado apocalipse que ameace a continuidade da vida no planeta. Mesmo assim, nos comportamos como cegos e surdos, sem entender (ou nem sequer perceber) que o horror que se avizinha é consequência de uma cegueira que nos torna insensíveis até àquilo que é visível a olho nu.

O jornal O Estado de S.Paulo publicou amplo resumo do relatório da OMM, com conclusões sobre a elevação da temperatura dos mares e o derretimento das geleiras. Em verdade, mais do que tudo, ali está uma advertência sobre o efeito estufa, que cresceu assustadoramente nas últimas décadas em razão do estilo de vida da sociedade de consumo, com a expansão do seu capitalismo predatório.

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Depois, a Agência Espacial Europeia lançou outra advertência, que se soma à realizada pela Organização Meteorológica Mundial, ampliando ainda mais o perigo: nos últimos dez anos, a taxa de aumento médio do nível dos mares duplicou-se por causa do derretimento das geleiras da Groenlândia e da Antártida.

A atividade dos mares se comporta como uma espécie de ferramenta de captação do calor do planeta e, com isso, alivia os efeitos catastróficos (ou, ao menos, os mais perniciosos) do efeito estufa. Paralelamente, porém, os mares geram efeitos em cadeia ao ameaçar os ecossistemas marinhos. Daí surge outro perigo, imperceptível a olho nu, mas igualmente grave.

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O relatório da Organização Meteorológica Mundial é taxativo e deixa um alerta equivalente a uma advertência: “Enquanto a emissão de gases de efeito estufa cresce e muda a temperatura, a população mundial se vê afetada pelo clima extremo e seus graves efeitos”.

Aí estão, perto de nós, as recentes secas na Amazônia, onde antes chovia praticamente todos os dias (quase à hora certa) e os habitantes das grandes cidades, como Manaus e Belém do Pará, costumavam marcar encontros para “antes” ou “depois” da chuva.

Lá longe (demonstrando tratar-se de um fenômeno global), na outrora gélida Sibéria fez calor em pleno final de outono e início de inverno. E, ano a ano, os invernos vêm se apresentando cada vez menos frios.

Conclusões sobre elevação da temperatura dos mares e o derretimento das geleiras são alarmantes, mas continuamos alheios aos avisos da Ciência

ONU/Flickr
A conclusão é simplista, mas verdadeira: as mudanças climáticas regem o mundo e assim devem ser vistas.

No entanto, continuamos surdos às informações ou advertências geradas pelas observações científicas. Continuamos poluindo o ar com automóveis movidos a gasolina, ou caminhões e ônibus nutridos pelo poluente óleo diesel. Para agravar a situação, os carros elétricos continuam inacessíveis, pelo altíssimo preço de venda, além de não disporem de um sistema de abastecimento eficiente.

Além disso (e bem mais grave ainda), chegamos ao absurdo de gerar eletricidade através de usinas térmicas, abastecidas com o poluente carvão mineral. Pouco desenvolvemos a energia solar num país ensolarado pelos quatro pontos cardeais, de norte a sul, de leste a oeste.

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Pouco nos valemos ou aproveitamos da energia eólica, como se não habitássemos um país com ventos intensos e extensos. Não nos interessamos em desenvolver as pesquisas sobre a capacidade de as ondas do mar gerarem eletricidade, mesmo vivendo num país com extenso litoral marítimo.

As florestas e os bosques continuam a ser tratados como um estorvo, quando – em verdade – são a grande dádiva que nos deu a natureza. Continuamos a destruir o verde da Amazônia, da Mata Atlântica e do Cerrado, sem nos preocuparmos sequer com o ritmo cada vez mais acelerado. Não respeitamos sequer a água (que fez nascer a vida no planeta), permitindo que o garimpo contamine com mercúrio os rios amazônicos.

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Em nossas cidades, limpamos calçadas ou lavamos automóveis e regamos jardins com água tratada como potável. Não nos lembramos de recolher água das chuvas em calhas nas nossas residências para usá-la nessas circunstâncias. Com isso, acentuamos o desperdício daquilo que é mais precioso para a vida no planeta.

Porém – poderão perguntar – como fica aquele ínfimo núcleo dos que defendem que o clima do planeta é regido unicamente pelos ciclos solares que, por sua vez, incidem no maior ou menor aquecimento dos oceanos?

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Dizem eles que, se houver um “ciclo de resfriamento”, como aconteceu com a Groenlândia no tempo dos vikings, seria “muito pior” do que um ciclo de aquecimento. O japonês Shigenori Maruyama e o canadense Timothy Oke estão à frente desse exíguo grupo, comparável aos chamados terraplanistas, que defendem que “a Terra é plana”, pois, “se não fosse assim”, os oceanos despejariam suas águas no além…

O mais aterrador e brutal das mudanças climáticas, porém, é o fantasma da fome no mundo inteiro. Sendo estáveis, as estações do ano incidem diretamente na agricultura. As mudanças climáticas, porém, interferem na produção agrícola, afetando as colheitas e nos privando dos alimentos básicos.

A conclusão é simplista, mas verdadeira: as mudanças climáticas regem o mundo e assim devem ser vistas.

Flávio Tavares | Jornalista e escritor, prêmio Jabuti de Literatura 2000 e 2005, prêmio APCA 2004. É professor aposentado da Universidade de Brasília.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Flávio Tavares Jornalista e escritor. Prêmio Jabuti 2000 e 2005, Prêmio APCA 2004. É professor aposentado da Universidade de Brasília.

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