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De sistema carcerário falho a imigração: raio-x da população em situação de rua no Uruguai

Enquanto governo aumenta a oferta de soluções passageiras, a demanda continua a crescer
Orlando Oramas León
Prensa Latina
Montevidéu

Tradução:

A população que vive na rua no Uruguai aumentou 24%, segundo cifras preliminares de um censo realizado pelo Ministério de Desenvolvimento Social (Mides).

É uma realidade prevista, pois basta olhar, nas noites de Montevidéu, para observar um número crescente de pessoas dormindo em baixo de caixas de papelão, apesar das baixas temperaturas deste inverno austral.

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Esta situação prevalece, ainda que o Mides implemente o Plano Inverno, uma operação que em conjunto com o Ministério do Interior, oferece lugares em refúgios para passar a noite.

Se compararmos o número de pessoas sem teto registradas em 2019, ano anterior à pandemia da Covid-19, o aumento é de 58%. E enquanto o governo aumenta a oferta de soluções passageiras, a demanda também cresce.

Enquanto governo aumenta a oferta de soluções passageiras, a demanda continua a crescer

Foto: Gonzalo G. Useta/Flickr
Pessoa em situação de rua no bairro Aguada, em Montevideo, Montevidéu, Uruguai

Círculo vicioso

O ministro de Desenvolvimento Social, Martín Lema, disse no Parlamento que o Uruguai deve cortar o que chamou de círculos viciosos devido aos quais não poucos vão viver na rua, alguns com mais de 35 anos nesta condição.

No fundo está a pobreza, porque as pessoas não conseguem o mínimo de renda; e há o desemprego. Durante o segundo semestre de 2022, o Instituto Nacional de Estatística avaliou que cerca de 9% dos uruguaios vive abaixo do nível da pobreza.

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Mas, segundo o ministro, a prisão, as drogas, a saúde mental e a imigração recente alimentam o exército de indigentes.

População carcerária

O Uruguai tem um dos maiores índices de população carcerária do continente. Cada dia sai da prisão uma média de 26 reclusos. Muitos deles carecem de recursos e de vínculos familiares.

Outros não podem voltar a seu bairro, porque estão ameaçados. Para a maioria, a prisão não foi lugar nem período de reabilitação e continuam envolvidos com as drogas.

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O censo do Mides mostrou que pelo menos 46,7% dos que viviam na rua tinham estado presos alguma vez. Com tal realidade, um das soluções passa por dotar os ex-presos de ferramentas e programas para enfrentar seu futuro e reintegrar-se à sociedade.

Isso supera a intenção governamental de incrementar os centros de acolhida, enquanto também passa por transformar os centros de reclusão em instituições reabilitadoras afim de diminuir a reincidência carcerária.

Mudanças

A Direção Nacional do Libertado passou do Ministério do Interior para o do Desenvolvimento Social, com a intenção de dotá-la de um enfoque mais socioeducativo.

Outra aresta do assunto passa pelo consumo de drogas. “Mantem-se um perfil que indica alta preponderância do consumo de drogas”, reza o informe preliminar, segundo o qual 91,5% dos investigados confessou consumo de álcool e drogas.

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O consumo de drogas leva a delinquir para poder comprar a cocaína, e voltam para a prisão, repetindo-se o círculo vicioso rua-droga-cárcere ou vice-versa.

Aumento orçamentário

O Congresso uruguaio discute um projeto de Prestação de Contas do governo, que solicita um aumento do orçamento de 20 milhões de dólares para atender saúde mental e consumo de drogas.

Da mesma forma, o Senado analisa um programa para a hospitalização involuntária de dependentes químicos em situação de rua e que possam vir a ser um risco para si e para a sociedade. A proposta já obteve luz verde da Câmara dos Deputados.

A discussão corre paralelamente a encarar os padecimentos psíquicos devido aos quais é alto o índice de suicídios e de depressão.

Pesquisa

Uma pesquisa recente indica que 41,2% dos consultados admitiu que recebeu tratamento ou esteve internado por consumo de drogas e outros por problemas psiquiátricos.

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Neste sentido, coincidindo com a pesquisa, a Sociedade de Psiquiatria do Uruguai publicou uma carta aberta denunciando a “grave situação” do Hospital Vilardebó, de referência para a atenção de enfermos mentais.

O grêmio assim qualificou a atenção aos usuários, as condições de internação e dos trabalhadores. “Grande número” de pacientes não contou com acompanhamento psiquiátrico nos últimos meses, tanto em salas do próprio hospital como em sanatórios privados onde se dá a internação, informou um comunicado.

E no tema dos sem-teto, entra também o fenômeno que torna o Uruguai destino de migrantes de diversas nacionalidades. A pesquisa mostrou que 2,6% dos que pernoitam na rua são estrangeiros.

São arestas e ingredientes que têm como pano de fundo um drama humano e uma das caras feias de um país que se vangloria de ostentar os melhores índices de desenvolvimento social do continente.

Orlando Oramas León | Prensa Latina, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Ana Corbisier


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Orlando Oramas León

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