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Quem são os predadores da água?
Paulo Cannabrava Filho*
Um dos mais violentos predadores da água é o processo de urbanização sem planejamento, que enterrou os mananciais, transformando os córregos em esgoto sanitário.
Outro, com a mesma carga destruidora é a monocultura extensiva da agroindústria nacional ou transnacional, assentada na produção de grãos para exportação e energia, seja para consumo humano (açúcar e derivado) seja para mover máquinas (etanol e óleos).
Nos dois casos, são incontáveis os mananciais destruídos, os rios assoreados, o desmatamento descontrolado, provocando um duplo assassinato: ecocídio e genocídio. Crimes contra a diversidade da floresta (mineral, florestal, animal, medicinal) e contra a vida humana, ao provocar o extermínio dos povos originários, dos povos ribeirinhos, quilombolas e posseiros.
Entre todos esses crimes, como qualificar aquele que diária e crescentemente se comete contra a água? Certo é que todos os citados são contra a água, mas é preciso apontar as novas formas e técnicas contra o que é a principal fonte de vida e quem os estão cometendo, assim como seus cúmplices.
Comecemos com um exemplo bem recente.
No dia 10 de julho, o Senado aprovou restituir às indústrias de refrigerantes um subsídio que era concedido às produtoras dos xaropes de refrigerantes e fábricas de bebidas sediadas na Zona Franca de Manaus e que o Executivo acabara de cortar.
Na febre de fazer caixa a qualquer custo, os gestores desse ilegítimo desgoverno, com o decreto 57, queriam reduzir de 20% para 4% o desconto dado para o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e com isso arrecadar, até o final do ano, uns irrisórios R$740 milhões.
Essa história está sendo mal contada, porque esconde muita coisa.
A Zona Franca de Manaus foi criada, em junho de 1957, por Juscelino Kubitschek (1956 e 1961) para criar um polo industrial de exportação para ajudar o desenvolvimento da Amazônia. Houve um momento em que funcionava assim e o que predominava eram empresas maquiladoras.
Hoje continuam sendo maquiladoras, só que, pouco exportam, vendem mais, com menos trabalho e menor custo, ao gigantesco mercado interno brasileiro. E isso, se não livre de impostos, com taxas reduzidas. Evidentemente uma concorrência desleal para quem produz no Rio de Janeiro ou Bahia e tem que pagar impostos municipais, estaduais e federais.
Como é que o Senado derrubou o projeto do Executivo?
Ora, pois, simplesmente porque o lobby da Coca-Cola mostrou-se mais forte do que o Executivo. Simples assim.
Mas a Coca não está sozinha nisso não, pois beneficia também a Ambev, hoje global, com suas fábricas de cervejas e refrigerantes. Essa redução do IPI na Zona Franca, repercute em cadeia sobre todo o setor de refrigerantes e cervejas do país.
Isso ocorreu também com a distribuição das riquezas do pré-sal para as transnacionais. O senador Roberto Requião denunciou a presença descarada de executivos da BP, a estatal britânica de petróleo, para assegurar a aprovação da emenda do senador José Serra que acabava com o monopólio da Petrobrás.
Contudo, água, por ser fonte indispensável para a vida, é o bem mais precioso que qualquer outro. Concorda?
As transnacionais que dominam o mercado de refrigerantes e cervejas, ao qual incorporaram a água engarrafada, também estão entre os grandes predadores da água. Nestlé e Coca-Cola e agora também a Ambev precisam ser investigadas e condenadas.
A Coca-Cola é um veneno que muita gente sensata só utiliza em casa para desentupir pia. Além disso, e primordialmente, ela é um instrumento de colonização, uma verdadeira arma de guerra. Para atender à gigantesca demanda criada pela enganação publicitária, precisa de muita água, água que se supõe potável.
Água potável só se encontra em mananciais ou em aquíferos.
As melhores águas terapêuticas do mundo estão no Brasil. Prata, Caxambu, São Lourenço, Cambuquira, Santa Bárbara, Lindóia, Águas de Lindóia, Petrópolis, isso pra citar só algumas das mais conhecidas e que estão sob risco de extinção, caso não seja detido o avanço dos predadores.
E isso é sabido desde o Império de Pedro. A água mineral de São Lourenço, por exemplo, levemente gaseificada na fonte, já está exaurida. O que a Nestlé vende no mercado é água tratada quimicamente em laboratórios. Pode? E você paga um preço absurdo para beber uma mentira. Em alguns lugares, a água engarrafada é mais cada que a gasolina.
As boas cervejas são feitas com três ingredientes, malte de cevada, lúpulo e água. Fora isso é adulteração. Para ser boa, a água tem que ser de manancial, pura, com acidez e alcalinidade equilibrada na fonte.
Como nas grandes cidades os mananciais se não secaram, estão poluídos, a Ambev faz bebidas com qualquer água tratada quimicamente em laboratório. Além disso, como a maior parte da cevada e do lúpulo tem que ser importada, utilizam cereais não maltados. Já perguntou o que significa isso? Milho, sabugo de milho, palha de arroz, entra tudo na fermentação. E não há nada como um bom químico para fazer aquilo parecer com cerveja…
*Jornalista editor de Diálogos do Sul