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Cannabrava: Possível revogação das reformas trabalhista e da Previdência dissemina pânico

Empresários mentores do neoliberalismo e do fascismo trataram anúncio da candidatura Lula como prenúncio de fim de mundo; é o contrário
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

O simples anúncio de que as reformas da Previdência e do Trabalho podem ser revogadas deixou em polvorosa setores empresariais, mentores do neoliberalismo e do fascismo que se apoderou do poder, como prenúncio de fim de mundo. 

Isso merece reflexão à luz dos fatos históricos e dos resultados mensuráveis no desenvolvimento econômico. 

Não há como eludir das quatro décadas perdidas a partir do Consenso de Washington. Recessão, desemprego, desmontagem do Estado e do setor produtivo industrial nos trouxe para esse fundo de poço em que estamos, de estagflação, e metade da população na pobreza e sem futuro.

Olhando a história, vemos que passamos por décadas com altas taxas de desenvolvimento, um parque industrial que nos colocava como sétima potencia industrial, pleno emprego, liberdade sindical.

Vejam que a CLT é de 1943. Ela foi pensada por Getúlio Vargas como parte de um projeto de desenvolvimento do país. Além da promoção da indústria de base, investimento em infraestrutura, financiamento para a substituição de importações, era preciso um pacto entre o Estado, os empresários e os trabalhadores. A CLT garantia os direitos aos trabalhadores e suas organizações.

O Brasil ganhou o apelido de Belíndia: tão desenvolvido como a industrializada Bélgica e tão miserável como a Índia. Mas, o pacto e o projeto, dava certeza de que, no caminho certo, venceríamos o subdesenvolvimento. Por isso o projeto também contemplava a boa escola, a disseminação de escolas de nível técnico e universidades públicas, todas.

Empresários mentores do neoliberalismo e do fascismo trataram anúncio da candidatura Lula como prenúncio de fim de mundo; é o contrário

Flickr/ Esquerda.net
Manifestação de 1º de maio em Lisboa, Portugal, em 2016

Capital acumulado no agro coadjuvava o processo de industrialização, transformando pequenas indústrias domésticas em parque industrial de primeiro mundo. Servem de exemplo os complexos industriais que constroem refinarias, todo e qualquer tipo de maquinaria pesada e, inclusive, equipamentos bélicos para exportação. Grandes conglomerados industriais como a Votorantin, Gerdal, Ometo, Dedini, ainda estão operando e são provas cabais do potencial e da capacidade de desenvolvimento.

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Na medida em que os militares no poder (ciclo 1964-1985) foram abrindo o mercado para as transnacionais, esse modelo foi sendo corroído, enfraquecido, até chegarmos à perda da capacidade de decisão. As transnacionais focaram no setor mais dinâmico da economia, que aquele cujo retorno do investimento é mais rápido: indústria da linha branca, farmacêutica, alimentos, higiene e limpeza, automobilística. As decisões são tomadas por suas matrizes. O golpe de 1º de abril de 1964 foi muito bem definido pelo investigador Reneé Dreifus como “a captura do Estado pelas transnacionais.

Prisioneiro das transnacionais, o país ficou sem capacidade de resistir ao avanço do capital financeiro sobre os centros de decisão. A partir do Consenso de Washington, década de 1980, o fenômeno foi global, ou seja, extensivo a todo o universo capitalista ocidental sob hegemonia dos Estados Unidos.

Na década seguinte, o Brasil já estava absolutamente refém da ditadura do pensamento único imposta pelo capital financeiro com a anuência do Estado, das universidades e da. Um massacre. Um verdadeiro culturicídio. A crise global ganhou a dimensão de crise civilizatória, que estamos presenciando. 

Tomando como marco a Constituição de 1988, no Brasil tivemos uma sucessão de governos que foram melhores ou piores gestores do neoliberalismo. Lula, sem dúvida, foi o melhor, de lavada, porque teve o boom das commodities e o pré-sal. 

O pré-sal deu oportunidade para um desvio de rota, e espaço para privilegiar a indústria nacional, tendo a Petrobras como indutora do desenvolvimento, pois são ingentes os recursos gerados a partir desse ciclo virtuoso. Ressurgiu a indústria naval, com os estaleiros produzindo enormes petroleiros além das sondas exploradoras em alto mar e grande profundidade. Dutos levando óleo para as refinarias e gás para toda parte.

Tudo isso, mais a força do mercado interno apontava para um novo clico de industrialização. Bom para o Brasil, ruim para o Império. Tio Sam não dorme sem botina. Atento, tomou as providências para acabar com a festa. Soltou suas feras: assassinos econômicos, agentes de inteligência, membros da embaixada e consulados, todos com muito dinheiro, com disposição de comprar deus e o mundo.     

A ordem vinda de Washington: manter o país Brasil nos padrões coloniais de sua conveniência.

O capítulo que segue está detalhadamente exposto por diferentes autores aqui na Diálogos do Sul. Agentes estadunidenses como Sérgio Moro e Deltan Dellagnol cumpriram a perfeição a missão de destruir um governo e as grandes empresas que lhes faziam concorrência. Com isso, o que tivemos foi o agravamento da recessão, o caos visível.

Sem desenvolvimento, sem mercado interno (com a população na pobreza), o resultado foi: recessão e desemprego. Só o agronegócio e a mineração de exportação funcionam.

No cassino global, o que interessa é o lucro. Lucro fácil do dinheiro multiplicando dinheiro. Uma voragem de produção de capital. Poder para comprar tudo. E comprar os ativos nacionais na bacia das almas. Comprar o parque industrial e fazer que desapareça dando lucro.

O mundo da produção perdeu protagonismo. O sindicato perdeu força, o movimento de massas mergulhou na perplexidade. Os partidos democráticos e os intelectuais de esquerda foram incapazes de entender e deter a conspiração.

Michel Temer, o ilegítimo que assumiu o poder após a derrubada da presidenta Dilma Rousseff, fez rapidinho tudo aquilo que o PT e o PSDB estavam demorando para fazer: a Reforma da Previdência e a Reforma Trabalhista.

A intenção com a Previdência foi fazer tal qual fizeram no Chile: privatizar e deixar os velhinhos morrerem à míngua, o trabalhador sem aposentadoria. Ainda não conseguiram porque houve certa resistência. Mas é a intenção que vale.

O pretexto para a Reforma Trabalhista é que é necessária para compensar a falta de dinamismo na economia e garantir lucros necessários para fazer o capital girar na ciranda financeira. O capital produtivo passa a ser capital reprodutivo, especulativo, volátil, recessivo. 

Facilita a vida do empresário as custas do sacrifício do trabalhador. O alvo é liquidar com a CLT. O começo é a desregulamentação em todos os aspectos, com a Lei 13.467 de 2017. A Reforma de Temer flexibiliza o mercado de trabalho para os empregadores e para os trabalhadores a perda de direitos sem compensação, sem reparação. Depois teve a mini-reforma, com a Lei 13.874 de 2019, cria a carteira de trabalho digital. Em 2021, para valer em 2022, houve uma espécie de consolidação, alterando o texto, mas mantendo o mesmo conteúdo.

Do lado de cá, só tem perda. E do lada de lá? Até agora, para quem juízo perfeito, só perdas, posto que o país não saiu nem tem como sair da depressão com esse modelo, com os centros de decisão fora do país.

Alguns pontos a destacar:

Em primeiro lugar, a prevalência do Acordo sobre a Legislação. Não adianta estar na lei se foi acordado entre as partes. Por exemplo, a Constituição proíbe trabalho aos domingos, exceto setores específicos; a lei libera para todos, contrariando a lei maior.

Pegou duro na organização sindical ao liquidar com o imposto sindical. O trabalhador contribuía com um dia de trabalho para manter os sindicatos e federações. 

Jornada  de trabalho de oito horas já não vale. Pode ser estendida a dez, 14 horas… o quanto o trabalhador sobreviver.

As férias, que eram de um mês, agora podem ser divididas em até três vezes, durante o ano.

O trabalhador perde o seguro desemprego. Por sua conta tem que se valer do seu FGTS.  Dispensa o ponto nas empresas com menos de 20 trabalhadores e estabelece o trabalho por demanda, ficando a carga horaria sem controle para execução do trabalho e sem nenhum direito.

A homologação da demissão já não se faz mais no sindicato, agora faz na empresa com a presença de um advogado do patrão.

É a total perda dos direitos conquistados durante séculos de lutas de trabalhadores de todo o mundo. Há que retomar a indignação e fazer deste 1º de maio não um dia festivo, que nunca foi, mas o verdadeiro Dia dos Trabalhadores, levando novamente para as ruas de todo esse país a disputa por mais direitos e a exigência de que a candidatura de Lula realmente se comprometa a revogar todo esse desmonte, fazendo jus à sua história de sindicalista.


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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1957. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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