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Pouco se falou da lei 13675/18, sancionada em junho, que criou o Sistema Único de Segurança. A lei cria um comando único e integra os diversos sistemas operacionais da Polícia Federal (PFs), Polícias Rodoviárias Federal e Estaduais, Polícias estaduais Militares (PMs) e Civis (Polícia) e Guardas Municipais (GMs).
Contra quem tudo isso?
Como o pretexto para a lei tem sido o combate ao crime organizado e o narcotráfico entre nossas fronteiras, haverá uma coordenação com os aparatos policiais e de inteligência dos vizinhos latino-americanos.
A lei não inclui o Exército nem as demais armas das forças armadas nacionais. Porém, como já se vê que os militares já ocuparam o Ministério da Defesa, estão ocupando favelas e áreas de conflito por esse Brasil afora, certamente assumirão também esse comando único. Mesmo porque já fizeram e mantiveram isso até há bem pouco tempo atrás.
Tudo começou com a Operação Bandeirantes, um órgão de repressão criado por policiais civis de São Paulo com amplos recursos fornecidos por empresas nacionais e estrangeiras e pessoas ricas. Era chefiada pelo famigerado delegado Sérgio Fleury, criador dos Esquadrões da Morte, que tinha como lema “bandido bom é bandido morto”.
Em 1970 foi transferido para o Doi-Codi em São Paulo, comandado pelo general Agnaldo del Nero, do Serviço Nacional de Informação (SNI), que centralizou a coordenação dos serviços de inteligência e de repressão e institucionalizou a tortura, o desaparecimento de suas vítimas mais desafetas.
O passo seguinte foi instituir uma coordenação continental, integrando os serviços de inteligência e repressão da América do Sul e em conexão direta com os serviços de inteligência estadunidenses. Esta, conhecida como Operação Condor, foi motivo de amplas reportagens na Diálogos do Sul, tanto de Stella Calloni como de Paulo Cannabrava F.
Nas décadas em que imperou o terror repressivo, ele agia contra os que se opunham ou poderiam se opor à tirania da ditadura e àqueles que a enfrentavam revolucionariamente.
Agora eles dizem que a repressão será contra o narcotráfico. Será?
A atuação de 400 cartéis de comércio de drogas do México transformou o país num Narcoestado. E o Brasil, que já é o principal corredor de exportação de drogas no atacado caminha rapidamente por esse caminho, facilitado pelo desgoverno que se instalou após o golpe parlamentar-jurídico-midiático de 2016.
É de fato um bom negócio. O quilograma de cocaína é vendido na Europa por US$ 25 mil. Se conseguem vender na China, US$ 100 mil.
A Consultoria Legislativa da Câmara Federal, em levantamento feito em agosto de 2016, apontou que o negócio das drogas fatura anualmente em torno de R$ 15.5 bilhões, sendo: maconha R$ 5,69 bilhões; cocaína R$ 4,7 bilhões; crack R$ 3 bilhões e ecstasy R$ 1,2 bilhões.
E segundo o Escritório da ONU contra Drogas e Crimes, o negócio gera lucros de mais de US$ 2 trilhões em todo o mundo. É mais do que o PIB da Argentina. O narcotráfico contribui com US$ 320 bilhões.
O Primeiro Comando da Capital (PCC) — hoje a maior facção do crime organizado no Brasil — atua como qualquer uma das grandes corporações transnacionais. E disputa hegemonia ferozmente com as demais agrupações: Comando Vermelho (CV), Família do Norte (FDN), e outros menores.
Como uma grande corporação, precisa de:
• uma tremenda estratégia de logística para o suprimento de insumos, a armazenagem, o transporte e o abastecimento, tanto no atacado como no varejo, no mercado local e internacional.
• um sistema de suporte financeiro, com bancos e financeiras e operadores de câmbio. Ninguém paga um carregamento com malas de dinheiro (isso só existe em Brasília). No mundo, não se faz um ilícito sem a participação de um banco.
• operadores e laranjas para lavagem de dinheiro, no mercado imobiliário, urbano e rural, mercado de arte, hotéis e resorts, cassinos, enfim, uma fila enorme existe para investir.
• um serviço de inteligência muito eficiente para atuar e crescer dentro de um cerco repressivo permanente, interno e internacional.
E, mais que tudo, precisa do Poder para atuar impunemente. Tal como as grandes corporações, praticam lobby ou exercem diretamente, ocupando cargos ou comprando gente em todas as esferas do poder. É isso que tipifica um Narcoestado.
Então, é preciso estar atento e tomar muito cuidado. Todo esse aparato repressivo, emulando a Operação Condor, em Estados militarizados e dominados pela ditadura do capital financeiro, não será, certamente, contra esse domínio que dá tanto lucro para o capital.
Será contra quem, então, cara pálida?
Certamente contra você, se por acaso se insurgir contra esse pilar de sustentação da tirania do pensamento único imposta pela ditadura do capital financeiro.
Mas se você for muitos, se os muitos juntarem multidões, e se as multidões forçarem o rompimento da institucionalidade, haverá chance de começar tudo de novo. Construir um novo Estado, um novo modelo de desenvolvimento, uma novo sistema político, partidário e jurídico compatível com uma nova democracia (não aquela da Grécia clássica), uma democracia inventada aqui, com os tijolos milenares de nossa cultura.