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Nicolás Maduro (Foto: Prensa Presidencial - Venezuela)

Eleições na Venezuela: tudo o que você precisa saber e a mídia imperialista não conta

Desde a vitória de Nicolás Maduro, em 29 de julho, a democracia da Venezuela enfrenta uma ofensiva dentro e fora do país e a conduta de dois pesos e duas medidas da grande mídia
Pascual Serrano
Liberacion.cl
Caracas

Tradução:

Ana Corbisier

Depois da jornada eleitoral de 28 de julho último na Venezuela, vocês terão visto, ouvido e lido na mídia muitos comentários desse tipo: “O governo venezuelano cometeu fraude porque não mostrou as atas de votação”, “A oposição mostrou umas atas que mostram que ganhou as eleições”, “O governo e o exército estão reprimindo os opositores que se manifestam contra a fraude eleitoral”, “Maduro não deixou entrar representantes da UE como observadores eleitorais”, “Os governos de esquerda da América Latina estão exigindo que Maduro apresente as atas eleitorais”. Vamos por partes.

A primeira questão a esclarecer é que a autoridade eleitoral na Venezuela é o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), um poder, diferentemente de nossos países, independente dos demais. E, portanto, autônomo em seu funcionamento; não depende do governo, nem para organizar as eleições, nem para fazer a recontagem, nem para divulgação dos resultados.

A jornada eleitoral de 28 de julho transcorreu normalmente, como confirmaram os observadores da ONU, do Centro Carter e o milhar de observadores convidados pelo CNE. Efetivamente, não houve observadores da União Europeia convidados. Como tampouco há observadores latino-americanos nas eleições europeias. Com mais razão na Venezuela, país cujos dirigentes a UE sancionou, e que nem sequer deixam entrar na Europa membros do governo venezuelano. Se mal respeitam o governo venezuelano, tampouco respeitariam suas eleições.

Poucas horas depois, o CNE, a autoridade eleitoral, emitiu um primeiro boletim com 80% das mesas apuradas e com uma tendência “contundente e irreversível”. Nele anunciava que Maduro fora reeleito para um terceiro mandato com 5.150.092 votos, 51,20% e que o seguinte era Edmundo González, que teria obtido 4.445.978 votos, 44,2%. Também informavam que estavam sendo vítimas de hackers, o que atrasaria os resultados definitivos.

Na Venezuela, como na maioria das eleições de nosso entorno, depois do final da votação e da recontagem, elabora-se uma ata por cada mesa eleitoral onde se detalham o número de votos totais e os obtidos por cada candidatura. Este documento é assinado pelos membros da mesa eleitoral, testemunhas e representantes dos partidos, que levam uma cópia para sua organização.

Este documento não se costuma divulgar em nossos países. Seguramente você não terá visto nunca uma ata de votação de mesa das eleições de seu país com a assinatura e o número de documento de identidade dos membros da mesa e representantes. Este documento é o que as diferentes partes apresentam às autoridades eleitorais ou judiciais caso considerem que há alguma discrepância com o escrutínio que este, sim, é divulgado. Um escrutínio detalhado por mesas eleitorais, isto é, perfeitamente compatível com a ata.

Diante do atraso do CNE para apresentar este escrutínio detalhado, a candidatura de Edmundo González põe em marcha uma página na web onde diz apresentar as atas eleitorais; primeiro disse que 30%, depois 80%, segundo aquele que dava as declarações. Fazem sua própria recontagem de suas próprias atas e chegam a seu próprio resultado, ganhando-os.

Esta candidatura, diferentemente do resto, já deixou claro que não ia reconhecer a autoridade eleitoral e seus resultados, portanto, a única coisa que fez foi declarar-se em rebeldia frente à institucionalidade eleitoral e apresentar seus próprios resultados para atribuir-se a vitória.

Enquanto isso, a candidatura de Maduro, que também dispunha de suas atas, como todos os candidatos, optou por aceitar a norma eleitoral e esperar os dados oficiais do CNE.

O panorama que se vendia para a comunidade internacional era o de um governo que não mostrava as atas nem as provas de sua vitória e a de uma oposição que esta, sim, estava mostrando as provas da fraude e de sua vitória. Algo absolutamente errôneo. Era um governo esperando os dados oficiais e uma oposição boicotando as eleições.

Frente a esta situação, o presidente Nicolás Maduro volta a recorrer às instituições e à lei e apresenta ao Tribunal Supremo um recurso de amparo para que sejam os juízes que dirimam, conforme a lei vigente, o conflito criado. O tribunal convoca todos os candidatos e solicita que apresentem a informação de que disponham sobre os resultados, atas incluídas. E, claro, também solicita ao CNE que apresente os dados pormenorizados que ainda estão pendentes de divulgação.

A este encontro dos juízes comparecem todos os candidatos com a informação eleitoral que possuem menos, precisamente, o candidato que dizia estar divulgando as atas que mostravam sua vitória.

O presidente da Assembleia da Venezuela, Jorge Rodríguez, revela posteriormente que o site do partido de Edmundo González só contém 9.468 supostas atas das mais de 36.000 mesas instaladas domingo, o que desmente as declarações de que tinham «mais de 70 por cento».

Também afirmou que a oposição fazia passar por atas, documentos que não eram atas, por exemplo “atas zero”, que são impressas no início da votação, como se fossem atas finais, “atas” nas quais faltam as assinaturas dos mesários, ou das testemunhas, incluindo testemunhas do PSUV, apesar de este partido ter testemunhas em todas as mesas ou a utilização de cédulas de identidade de pessoas mortas. Tudo isso, recorda Rodríguez, constitui delito e pode explicar a ausência do candidato diante dos juízes para apresentar a documentação.

O passo seguinte da candidatura opositora foi chamar à violência e à sublevação. Para eles basta mobilizar uns cem violentos. Deste modo enganam e apresentam à comunidade internacional uma suposta fraude do governo de Maduro, a ocultação dos resultados, a apresentação dos verdadeiros por eles, e um levantamento popular que se rebela contra o governo.

O governo venezuelano detalhou o balanço da violência contra as eleições. Contabiliza-se a destruição em mais de 70 centros educativos, 37 centros de saúde com o pessoal sanitário dentro e 38 unidades de transporte. Danificaram 12 universidades públicas, dezenas de colégios e institutos, estações de metrô, dez sedes do partido do governo e várias prefeituras. As forças de segurança tiveram que proteger da violência cerca de 60 observadores eleitorais. Foram assassinados dois membros das forças da ordem, e dezenas ficaram feridos.

Esta violência explica a detenção de centenas de pessoas. Todas elas ligadas a fatos violentos, nenhuma por expressar sua oposição ou protesto pelo resultado eleitoral. Ao contrário do que anunciavam alguns meios de comunicação.

As autoridades capturaram e identificaram pessoas, algumas procedentes de outros países, que reconheceram terem sido contratadas para gerar violência e distúrbios.

Claro, é necessário para terminar o processo eleitoral que o CNE publique os dados segmentados e detalhados por municípios, distritos, colégios e mesas eleitorais. Isso foi o que pediram os governos do México, Colômbia e Brasil. E, também, vale lembrar, os juízes do Tribunal Supremo. Passou-se só uma semana, são muitos os países que necessitam de semanas para sua contagem eleitoral definitiva; lembremos o caso estadunidense na vitória de Trump.

Como sempre que se respeita a democracia, a chave está em aceitar o trabalho das instituições como o Conselho Nacional Eleitoral ou o Tribunal Supremo. No entanto, os sublevados e violentos que não aceitam a democracia recorrerão, dentro e fora da Venezuela, ao discurso de que todas estas instituições são “controladas pelo chavismo”. O mantra com que justificam sua violência para subverter a ordem e não reconhecer os resultados eleitorais.

Com este mesmo critério, poderíamos dizer que na Espanha o “sanchismo” controla a Junta Eleitoral Central, posto que é presidida pelo presidente do Congresso dos Deputados, controla a procuradoria, porque o procurador-geral é nomeado pelo governo, e controla o Tribunal Constitucional porque sua composição é feita por proposta das maiorias parlamentares. E de igual modo no resto dos países democráticos, onde o partido governante, o que mais apoios populares tem, é o que tem um papel significativo na nomeação de muitas instituições. Chama-se democracia.

Claro que não faltou nesta crise o departamento de Estado dos Estados Unidos. Ali têm clareza, não necessitam esperar os resultados do CNE, nem a decisão dos juízes, nem precisam ver atas de nenhum outro partido. Os EUA “nomearam” presidente Edmundo González com as atas que apresentou… Edmundo González.

Tudo isso levou o governo venezuelano a qualificar o que estava acontecendo no país, de tentativa de golpe de Estado liderado pelos Estados Unidos.

Talvez seja preciso lembrar que se os Estados Unidos aceitassem as eleições e a democracia da Venezuela teriam que retirar as sanções com que tentam destruir a economia venezuelana e devolver a empresa CITGO que roubou do Estado venezuelano, avaliada em 13 bilhões de dólares. Algo similar aconteceria com os amigos dos Estados Unidos como o Reino Unido, que deveria devolver os bilhões de ouro venezuelano que retém na cúpula de seu Banco Central.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Pascual Serrano Jornalista e escritor. Seu último livro é “Prohibido dudar. Las diez semanas en que Ucrania cambió el mundo”

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