“Venho em nome da República Argentina ratificar o reconhecimento de sua responsabilidade internacional pela violação dos direitos humanos das vítimas do atentado contra a AMIA (Associação Mutual Israelita Argentina), em 1994”, disse Natália D’Alessandro, representante do ministro de Justiça, Martín Soria, ante a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), reunida em Montevidéu, Uruguai, no 153º período de sessões.
A denúncia foi apresentada pela Associação Civil Memória Ativa, um grupo de famílias das vítimas, e o Centro de Estudos Legais e Sociais (CELS), e sustentava que o Estado argentino não havia prevenido nem investigado o caso de maneira adequada, o maior e o mais cruel atentado ocorrido no país diante, diante do qual não foram tomadas “medidas adequadas de proteção, apesar do risco”. O governo assumiu também a responsabilidade pelos “direitos de acesso à informação”.
Documentário sobre atentado contra a Amia, na Argentina, expõe Lawfare contra Cristina
O atentado deixou 85 mortos e 300 feridos, além de destruir o edifício, o que causou graves danos às moradias que rodeavam a Amia.
Ao se referir às autoridades que estavam a cargo do poder público nesse tempo, entre eles o presidente Carlos Menem (1989-1999), a funcionária considerou que haviam tomado a “decisão de encobrir a verdade”, e ressaltou em sua apresentação que o reconhecimento se estende desde 2005 até agora, já que o ex-presidente Néstor Kirchner (2003-2007) aceitou por decreto a responsabilidade do Estado e da mesma forma encerrou um julgamento que se havia convertido em um labirinto sem saída, cheio de irregularidades, criando assim uma promotoria especial para revisar o caso.
O presidente da CIDH, o juiz uruguaio Ricardo Pérez Manrique, analisou que as demoras na investigação foram atribuídas à “corrupção, falta de independência e falta de profissionalismo nas mais altas esferas do Estado Argentino” e pediu “uma sentença de vocação transformadora”, recordando que o tribunal age “porque o Estado argentino não resolveu a problemática vinculada com a investigação do atentado terrorista ao longo de 28 anos”.
No entanto não se fez nenhuma referência à implicação da Delegação de Associações Israelita-Argentina, que convalidou irregularidades graves desde o começo da investigação, e em nenhum momento se advertiu que uma das principais causas da demora foi que, desde o dia seguinte ao 18 de julho de 1994, tanto Israel como Estados Unidos acusaram sem provas ao Irã, impedindo qualquer outra investigação imparcial.
Enrique G. Medina
Em 2019, terminou um julgamento com leves condenações sobre funcionários judiciais e do governo do ex-presidente Menem
Foi esta a maior causa de não haver podido chegar ao final e, embora se diga que a justiça argentina considerou como os principais suspeitos a altos funcionários iranianos, até agora não se pode apresentar uma só prova sobre isso.
Desde o primeiro momento, os serviços de inteligência dos Estados Unidos e Israel levaram a investigar testemunhas falsas, o que levou o juiz Juan Carlos Galeano, encarregado do julgamento, a viajar à Venezuela, por indicação desses serviços, para interrogar a Manoucher Moatamer. Dizia-se que Moatamer escapou do Irã com muita informação. O interrogatório terminou com contradições.
Assista na TV Diálogos do Sul
Não existindo extradição no Irã e sem provas específicas, foram escritas importantes investigações jornalística na Argentina. Durante o governo da ex-presidente Cristina Fernández de Kirchner, e seu então chanceler Héctor Timerman, conseguiram firmar um memorando com o Irã ao fim de 2013, que permitiria o envio de juízes a Teerã para interrogar aos cinco altos funcionários iranianos.
Além dos juízes argentinos, também se elegeria um grupo de observadores altamente qualificados. Isto foi votado pelo Congresso Argentino com maioria absoluta.
No entanto, Israel se opôs e o congresso iraniano não votou nem nunca foi posto em marcha o memorando. O ex-promotor Alberto Nisman, nomeado pelo ex-presidente Kirchner para dirigir a unidade especial Amia, terminaria acusando a ex-presidenta e ao ex-chanceler de “encobrir os iranianos”, quando precisamente Fernández de Kirchner, como seu já falecido esposo Néstor Kirchner, ao longo de seus governos denunciaram o caso Amia, inclusive ante as Nações Unidas.
O julgamento pelo pacto com o Irã foi anulado, mas nestas semanas a câmara de Cassação decide se confirma ou revoga. Como se sabe, a existência de uma mesa judicial e as ações da Corte Suprema de Justiça não garantem a imparcialidade quando se trata de golpear o peronismo.
A CIDH também concluiu que os órgãos estatais a cargo da investigação do atentado cometeram graves falhas e desviaram deliberadamente a investigação durante mais de oito anos. Em 2019, terminou um julgamento com leves condenações sobre funcionários judiciais e do governo do ex-presidente Menem, sem decidir qual era a razão do encobrimento. A causa internacional foi iniciada em 1999.
Stella Calloni | Especial para Diálogos do Sul desde Buenos Aires.
Tradução: Beatriz Cannabrava.
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
Assista na TV Diálogos do Sul
Se você chegou até aqui é porque valoriza o conteúdo jornalístico e de qualidade.
A Diálogos do Sul é herdeira virtual da Revista Cadernos do Terceiro Mundo. Como defensores deste legado, todos os nossos conteúdos se pautam pela mesma ética e qualidade de produção jornalística.
Você pode apoiar a revista Diálogos do Sul de diversas formas. Veja como:
-
PIX CNPJ: 58.726.829/0001-56
- Cartão de crédito no Catarse: acesse aqui
- Boleto: acesse aqui
- Assinatura pelo Paypal: acesse aqui
- Transferência bancária
Nova Sociedade
Banco Itaú
Agência – 0713
Conta Corrente – 24192-5
CNPJ: 58726829/0001-56 - Por favor, enviar o comprovante para o e-mail: assinaturas@websul.org.br
- Receba nossa newsletter semanal com o resumo da semana: acesse aqui
- Acompanhe nossas redes sociais:
YouTube
Twitter
Facebook
Instagram
WhatsApp
Telegram