Uma das consequências mais devastadoras da falta de defesa das meninas em nossos países é a maternidade precoce. Na Guatemala, por exemplo, é pavorosa a cifra de gravidez e parto com pouca idade. De acordo com uma das instituições dedicadas a monitorar esse tema – O Observatório em Saúde Sexual e Reprodutiva, OSAR – se produziram 57.578 gravidezes em meninas e adolescente entre 10 e 18 anos, durante o primeiro semestre de 2021. Ou seja, um período no qual uma menina ainda não desenvolveu plenamente seu corpo e quando uma gravidez supõe um risco elevado.
Além da violência implícita na violação e suas consequências físicas e psicológicas, uma gravidez nessa idade significa a perda de direitos em todos os níveis e o submissão a um regime de vida duro, restritivo e submetido à autoridade dos adultos do seu entorno. A isso se soma a proibição legal de interromper o processo de gestação, mesmo quando se trate de um ser cujo corpo não reúne as condições para sustentá-la e levá-la a termo. Ou seja, a lei condena a vítima a partir de uma visão do Direito influenciada por doutrinas religiosas e um sistema patriarcal solidamente estabelecido. Visto como parte normal da vida, a gravidez em meninas e adolescentes é uma das mais graves consequências da marginação na qual vive e se desenvolve uma grande parte da população feminina. Assediadas por um conceito patriarcal da vida e do dever, milhares de meninas acabam sendo vítimas de abuso sexual desde antes de alcançar a puberdade, convertendo-se em mães em etapas tão precoces de seu desenvolvimento que inclusive perdem a vida no processo. Indefesas diante da pressão do autoritarismo exercido por pais, irmãos e outros homens de seu entorno, somado à falta de proteção por parte do resto da comunidade, as meninas-mães terminam esgotando a etapa da infância sem havê-la vivido, para enfrentar a dura realidade de uma existência de miséria.
Montagem Diálogos do Sul
A Guatemala bateu a marca de 57.578 gravidezes em meninas e adolescente entre 10 e 18 anos, durante o primeiro semestre de 2021
Diante dessa situação, derivada de padrões culturais absolutamente viciados, as meninas se vêm obrigadas a arrastar a humilhação de uma sexualidade não desejada, não consentida e de graves repercussões para sua saúde física e psicológica, em um entorno de falta de respeito que lhes veda o direito a experimentar as etapas normais de seu desenvolvimento.
Neste cenário, as meninas-mães não entram nas prioridades de atenção das autoridades. Estas veem os casos de gravidez precoce como mais uma expressão do subdesenvolvimento e não como os atos criminosos de abuso sexual que realmente são. A mensagem que envia esta aproximação ao problema é de conformismo diante da submissão de um dos grupos sociais menos considerados nas políticas públicas dos governos.
Sobre o tema:
Inocência interrompida: consequências da gravidez precoce repercutem pelo resto da vida
Essas milhares de meninas e adolescentes cujo corpo mal alimentado e fraco mal pode carregar com o peso de sua própria existência, dão à luz em condições miseráveis, em meio à indiferença das autoridades e suportando o rechaço de sua própria família. Assim é o entorno social e esse é o resultado de uma cultura que as condena ao eterno subdesenvolvimento.
Estes abusos têm sido um hábito inveterado durante gerações, profundamente arraigado e considerado uma prática socialmente aceitável; um destino inevitável para aqueles que ainda não possuem a força nem a proteção da lei para defender seus direitos.
As meninas merecem alcançar seus sonhos. A maternidade precoce não é um deles.
* Colaboradora de Diálogos do Sul da Cidade da Guatemala
** Tradução: Beatriz Cannabrava
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