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Mitchell Plitnick*
Assegurar a superioridade militar de Israel no Oriente Médio é o argumento central do lobby judeu em Washington que já começou a exigir do governo de Barack Obama um novo pacote de ajuda por 10 anos, que deveria entrar em vigor em 2017.
O grupo de pressão israelense esgrime a Lei de Transferência de Navios de Guerra, aprovada pelo Congresso estadunidense em 2008. A norma estabelece que a assistência militar dos Estados Unidos a Israel deve garantir a “vantagem militar qualitativa” (QME, na sigla em inglês) do Estado judeu sobre qualquer combinação de atores estatais e não estatais.
O governo dos Estados Unidos sempre se comprometeu a assegurar a superioridade militar de Israel no Oriente Médio, mas desde 2008 está obrigado por lei. A cada quatro anos, Obama deve informar ao Congresso o estado dessa vantagem comparativa.
“Estamos vendo o Oriente Médio de uma perspectiva geral, que inclui o crescimento do arsenal de mísseis no Líbano e (o território palestino de) Gaza”, disse Michael Oren, embaixador de Israel nos Estados Unidos que está saindo, ao semanário Defense News. Também mencionou a situação atual na península do Sinai e na Síria. Israel não se opõe a que os Estados Unidos vendam armas aos estados árabes considerados “moderados”, mas insiste em ser compensado com equipamentos de melhor qualidade.
Se os Estados Unidos não as vende, outros o farão”, reconheceu Oren. “Também entendemos que essas vendas contribuem para a criação de centenas ou milhares de empregos nos Estados Unidos, e nos interessa que sua economia seja forte e tenha vitalidade”, acrescentou.
Mas a ajuda poderia ser afetada pelas dificuldades econômicas enfrentadas pelos Estados Unidos. Washington cortou seu orçamento no princípio deste ano o que gerou um debate dentro do lobby israelense sobre a conveniência de pressionar para que o pacote de assistência seja mantido.
A discussão explicitou uma das preocupações dos grupos de pressão pró israelenses: equilibrar sua missão de defender o Estado judeu sem que pareça que se preocupam mais com esse país do que com os Estados Unidos.
Contradições econômicas
Historicamente, a assistência a Israel permaneceu intacta, apesar das dificuldades econômicas nos Estados Unidos. Mas, desta vez, há outros fatores em jogo. Por exemplo, a lei de 2008 não menciona a responsabilidade de o próprio Israel assegurar sua vantagem militar comparativa. Em troca, obriga os Estados Unidos a equilibrar a venda de armas para cobrir as necessidades israelenses e defender sua superioridade.
A redução do orçamento de defesa de Israel este ano gera dúvidas sobre porque pede mais assistência quando diminui seus próprios recursos. O corte foi de 820 milhões de dólares, mais de 25% da assistência anual que recebe atualmente. A questão torna-se mais relevante porque a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE) projetou em maio um crescimento de 3,9% para este ano em Israel e de 3,4% para 2014. O crescimento médio nos países da OCDE para os dois anos é de 1,2% e 2,3% respectivamente.
Tal como disse Oren, o fato de que os Estados Unidos passem de uma crise a outra supõe problemas políticos para os grupos de pressão que reclamam mais assistência. Mas o fato de que a vantagem comparativa seja obrigatória por lei, na realidade, os incentiva. Já não têm que argumentar que os Estados Unidos estão comprometidos politicamente a dar recursos adicionais para garantir a superioridade militar, porque agora trata-se de uma obrigação legal.
Assentamentos
Israel não apenas terá que explicar porque corta seu orçamento de defesa quando pede mais ajuda, como também terá que justificar a expansão dos assentamentos ilegais no território palestino da Cisjordânia.
Durante anos, os Estados Unidos fizeram vista grossa à construção de colônias judaicas na Cisjordânia, apenas considerando-as “obstáculos para a paz”, mas sem pressionar Israel. O secretário de Estado (chanceler), John Kerry, tenta lidar com esse assunto, pois para os palestinos a expansão dos assentamentos enfraquece o processo de paz. De fato, era o principal obstáculo para que a Autoridade Nacional Palestina se sentasse à mesa de negociações. Mas esta questão envolve outro assunto relacionado à solicitação de assistência.
Se os Estados Unidos questionam a política israelense nos assentamentos e consideram que complicam o processo de paz, não deveriam esperar que Israel priorizasse seu próprio orçamento de defesa que, dadas as circunstâncias descritas por Oren, seria mais imprescindível que destinar recursos às colônias?
Não está claro o que se gasta na construção. Em 2005, o próprio governo israelense ordenou uma investigação sobre os recursos destinados aos chamados “postos avançados ilegais”, colônias criadas sem autorização do estado judeu. O estudo concluiu que, entre 2000 e 2004, o Ministério da Construção e Habitação destinou 20 milhões de dólares a esses postos avançados sem autorização oficial. A autora da investigação, Talia Sasson, lamentou a impossibilidade de obter informação fidedigna e calculou que a “soma verdadeira poderia superar consideravelmente a que figura no relatório”, dado que “o montante não inclui o que o Ministério pagou por infraestrutura, edifícios públicos e planejamento nos postos avançados não autorizados”.
Enquanto isso, segundo dados do escritório central de estatísticas de Israel de 2011, o gasto nos assentamentos autorizados aumentou 38% com relação ao ano anterior, superando 400 milhões de dólares. A contradição israelense de aumentar seu gasto em assentamentos e paralelamente pedir mais ajuda militar aos Estados Unidos pode ser usada como instrumento para pressionar o estado judeu, segundo Stephen Walt, professor de assuntos internacionais da Escola Kennedy de Governo, na Universidade de Harvard.
“A garantia de 10 anos solicitada por Israel oferece a Obama e a Kerry um instrumento de pressão se tiverem vontade política para utilizá-lo”, disse Walt à IPS.
“Deveriam deixar bem claro que Israel só obterá essa garantia se, e apenas se, acabar com a expansão de assentamentos e concordar com a criação de um estado palestino viável”, disse.
“É um instrumento de pressão útil porque Israel quer mais assistência, mas na realidade não precisa dela”, acrescentou Walt. “Manteria sua vantagem militar durante vários anos mesmo que os Estados Unidos cancelassem toda a ajuda”, observou. “Obama e Kerry poderiam recorrer a essa pressão sem por em perigo a segurança de Israel. De fato, pressionando-o para que ponha fim à ocupação, estariam melhorando-a”, acrescentou.
O Comitê de Assuntos Públicos Estados Unidos-Israel (AIPAC, na sigla em inglês) foi criado para promover a assistência estadunidense a esse país, e esse continua sendo seu objetivo fundamental. O Congresso dos Estados Unidos, onde está o forte da influência do AIPAC, é no fim, quem terá que decidir se o presidente cumpre a lei de 2008 de garantir a vantagem militar comparativa de Israel. A norma pode chegar a desempenhar um papel fundamental no momento de superar o que parecem ser mais barreiras para o aumento da assistência a que o AIPAC está acostumado.
*IPS de Washington para Diálogos do Sul – Tradução: Ana Corbisier