Na última terça-feira (12), a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas votou de maneira esmagadora a favor de um cessar-fogo em Gaza. Embora Washington tenha se oposto à resolução, o Presidente Joe Biden reconheceu publicamente, pela primeira vez, que Israel está perdendo o apoio internacional e que “tem que mudar” sua política em relação a um Estado palestino para criar as condições de uma paz duradoura a longo prazo.
No entanto, mesmo que Biden tenha oferecido uma crítica comedida a Israel, deixou claro aos apoiadores de sua campanha à reeleição que o compromisso de seu governo com Israel “é inquebrantável”. Isso foi evidenciado mais uma vez poucas horas depois, na sede mundial da ONU em Nova York, onde seu governo votou contra a grande maioria da comunidade internacional que endossou um cessar-fogo imediato.
Mais de três quartos da Assembleia Geral, ou seja, 153 países, votaram a favor de uma resolução por um cessar-fogo humanitário imediato. Estados Unidos, Israel e outros oito países, incluindo Paraguai e Guatemala, votaram contra, e houve 23 abstenções, incluindo Grã-Bretanha, Alemanha e Argentina em seu primeiro voto sobre o tema do novo governo de Milei. Foi praticamente a mesma resolução anulada pelo veto dos Estados Unidos no Conselho de Segurança alguns dias antes.
A embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Linda Thomas-Greenfield, afirmou pouco antes de votar contra a resolução que “qualquer cessar-fogo agora seria temporário no melhor dos casos e perigoso no pior, tanto para os israelenses, sujeitos a ataques implacáveis, quanto para os palestinos, que merecem a oportunidade de construir um melhor futuro para si mesmos, livres do Hamas”.
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O clamor universal se intensificou desde a última vez que a Assembleia Geral aprovou, com 121 votos a favor, uma resolução por uma trégua humanitária em 27 de outubro. Isso ocorreu depois que quatro tentativas de aprovar tal resolução no Conselho de Segurança falharam em grande parte devido à oposição de Washington.
As resoluções da Assembleia Geral, ao contrário das do Conselho de Segurança, não são vinculativas, mas oferecem uma clara expressão do sentimento da comunidade internacional, que deixa cada vez mais Washington isolado em relação a esse conflito.
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Foto: White House/X
Declaração de Netanyahu sobre descartar mais uma vez uma solução de dois Estados, parece ter sido demais para Biden
Pouco antes dos comentários de Biden, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu divulgou um vídeo no qual agradeceu o apoio dos Estados Unidos para a destruição do Hamas e o retorno dos reféns. Netanyahu afirmou que, após intensos diálogos com o presidente Biden e sua equipe, receberam total respaldo para a incursão terrestre e para resistir à pressão internacional para frear a guerra.
No entanto, o vídeo de Netanyahu contradiz o argumento oficial oferecido por Biden e seus assessores nos últimos dois meses de que seus diálogos privados com o governo israelense conseguiram limitar a guerra em Gaza. Além disso, Netanyahu efetivamente descartou a opção de permitir que a Autoridade Palestina governe Gaza, reafirmando que Israel não permitirá uma solução de dois Estados com uma Palestina independente que inclua Gaza.
Isso sugere que o governo de Biden não estava focado nos problemas centrais do conflito entre Israel e Palestina nos primeiros três anos de seu governo, presumindo que os palestinos permaneceriam calmos. O assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, declarou em um amplo ensaio na prestigiosa publicação Foreign Affairs, na edição de outubro de 2023, que “embora o Oriente Médio permaneça assediado com desafios permanentes, a região está mais tranquila do que tem estado em décadas”. Após os eventos de 7 de outubro e o início da guerra atual, Sullivan teve que corrigir rapidamente a versão digital de seu artigo, embora as edições impressas permaneçam como testemunho da arrogância e fracasso da política dos Estados Unidos em promover a paz duradoura que declaram como seu objetivo.
Embora Washington tenha reiterado seu suposto apoio histórico a uma “solução de dois Estados” por mais de 30 anos, Tel Aviv tem trabalhado para anular essa opção, continuando a estabelecer assentamentos na Cisjordânia, minar permanentemente a Autoridade Palestina e apoiar financeiramente o Hamas, que governa Gaza desde 2007, com o objetivo de manter divididos os territórios palestinos.
A declaração de Netanyahu nesta terça-feira, ao descartar essencialmente mais uma vez uma solução de dois Estados, parece ter sido demais para Biden. Ele comentou em Washington que seu amigo Bibi Netanyahu deve mudar sua postura: “Temos que assegurar que Bibi entenda que tem que fazer alguns movimentos para fortalecer a Autoridade Palestina, fortalecê-la, mudá-la, movê-la. Não pode dizer que não haverá nenhum Estado palestino no futuro”.
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O presidente dos Estados Unidos não ofereceu nenhuma indicação de como conseguirá mudar a política israelense e rejeitou a ideia de pressionar publicamente Tel Aviv para alcançar esse objetivo. Ele afirmou em um evento com apoiadores de sua campanha eleitoral que “não vamos fazer mais nada além de proteger Israel no processo. Nem uma só coisa”.
Biden reiterou em seu discurso que “somos a nação indispensável. Gostem ou não, somos… Os Estados Unidos são a nação essencial. E esperam que sejamos líderes”. No entanto, poucas horas depois, pelo menos no que diz respeito à guerra de Israel em Gaza, a grande maioria do mundo vacilou em discordar.
Jim Cason e David Brooks | La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.
Tradução: Beatriz Cannabrava
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