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Buscas do FBI em mansão podem impedir novas candidaturas de Trump; entenda

Investigação tem desencadeada diversas reações nos apoiadores que, motivados pelo ex-presidente, apelam à violência e guerra civil
David Brooks
La Jornada
Nova York

Tradução:

A busca na mansão de Donald Trump na Flórida pelo FBI na segunda-feira (8), uma operação policial sem precedentes contra um ex-mandatário, está sacudindo o mundo estadunidense politicamente: o ex-presidente e seus aliados denunciam que é parte da suposta perseguição da “esquerda radical democrata” enquanto especialistas dizem que tal passo não teria sido tomado pelas autoridades sem provas esmagadoras de que um delito foi cometido. 

O FBI e o Departamento de Justiça não comentaram publicamente a operação na qual, segundo alguns informes em meios, uma dúzia de agentes chegaram sem anunciar ao Mar-a-Lago, a mansão e clube privados de Trump em Palm Beach, Flórida, na manhã de segunda-feira, com uma ordem judicial para realizar uma busca. Trump se encontrava em Nova York.

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Segundo versões extraoficiais, a busca tem a ver com uma investigação sobre materiais oficiais, muitos dos quais se supõe que são documentos classificados que Trump levou da Casa Branca ao concluir sua presidência.

As autoridades federais previamente haviam negociado com Trump e seus advogados para recuperar 15 caixas de documentos oficiais que ele havia levado, mas suspeita-se que ele não tenha entregado tudo, violando potencialmente leis que obrigam os ex-presidentes a entregarem todo o material oficial aos Arquivos Nacionais ao concluir seus períodos como servidores públicos

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Por ora, só se pode especular sobre o que os agentes do FBI encontraram, mas ainda sem maiores detalhes. O simples fato de que tenha sido realizada uma busca sacudiu o mundo político, já que não há precedentes de ação policial como esta contra um ex-presidente. Portanto, os resultados desta operação terão enormes consequências políticas.


“Democratas da esquerda radical”

Embora Trump tenha denunciado que esta operação é parte de uma ofensiva política dos “democratas da esquerda radical”, especialistas reiteraram que para obter uma ordem judicial para uma busca, as autoridades – neste caso, o FBI – têm que apresentar ante um juiz suficiente evidência de que se cometeu um delito e que é razoável supor que há provas disso onde se deseja realizar a busca.  

Mais ainda, o diretor do FBI, Christopher Wray, não é da “esquerda radical”, mas foi nomeado e instalado em seu posto pelo próprio Trump. 

Trump, como costuma fazer, usou o incidente para arrecadar fundos e mobilizar suas bases, declarando nesta terça-feira que “não foi só minha casa que foi violada, mas sim as casas de todo patriota americano por quem estive lutando…” e apelou a revelar e frear “a perseguição e a caça às bruxas”.

 

Minoria republicana

Ao mesmo tempo, o líder da minoria republicana da câmara baixa, Kevin McCarthy, ameaçou diretamente o procurador geral Merrick Garland, sugerindo que têm a intenção de investigá-lo, enquanto o senador republicano Rick Scott, da Flórida, declarou que “a ala esquerda militante [democrata] converteu-se no inimigo interno” neste país. 

Outros legisladores republicanos reiteraram as acusações de Trump de que o Departamento de Justiça e o FBI se “politizaram” e que o operativo foi “um abuso do poder”.

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Também houve ameaças de violência e até apelos a tomar as armas para “uma guerra civil” por fanáticos de Trump nas redes sociais. Muitos repetiram que “isto implica guerra”, e políticos locais e candidatos se atreveram a promover propostas para recusar a autoridade do Departamento de Justiça e do FBI em seus estados. A candidata a governadora do Arizona, Kari Lake, declarou que “este regime ilegítimo e corrupto odeia os Estados Unidos e transformou todo o governo federal em uma arma para destruir Donald Trump…. Não vamos aceitá-lo”. 

Investigação tem desencadeada diversas reações nos apoiadores que, motivados pelo ex-presidente, apelam à violência e guerra civil

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Democratas evitam comentar

Por sua parte, dirigentes democratas têm evitado comentar sobre a operação, além de sublinhar que o Departamento de Justiça age de maneira independente nestes assuntos.  

A porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, reafirmou que o presidente Joe Biden ficou sabendo da operação por informes públicos e não foi consultado pelo Departamento de Justiça. 

Alguns especialistas em assuntos penais e fontes anônimas citadas por meios nacionais têm indicado que esta operação não está ligada com outras investigações do Departamento de Justiça sobre os delitos cometidos no assalto violento ao Capitólio, em 6 de janeiro de 2021.


Impostos de Trump

No entanto, em outra investigação sobre os impostos de Trump, um tribunal federal de apelações emitiu nesta terça-feira uma decisão aprovando que a Câmara de Representantes possa ter acesso aos informes fiscais do ex-presidente, algo que ele tem combatido desde que lançou sua campanha eleitoral em 2016 quando, rompendo com a tradição, se recusou a fazer públicos seus informes fiscais. Espera-se que Trump agora buscará apelar para a Suprema Corte, onde ele instalou uma maioria conservadora como presidente. 

Ao mesmo tempo, Trump enfrenta múltiplas investigações contra ele, incluindo uma indagação criminal na Geórgia, sobre sua possível tentativa de manipular os resultados eleitorais nesse estado, e um caso civil sobre seus negócios em Nova York. 

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Houve também um pouco de humor na tempestade de opiniões nas redes sociais. Um comentador anunciou: “uma notícia urgente: a biblioteca pessoal de Trump foi destruída na batida do FBI em Mar-a-Lago. Ambos os livros tristemente ficaram em condição irreparável, e ele não tinha acabado de colorir um deles”.


“Caçada às bruxas” da “esquerda radical”

Dois dias depois da busca do FBI realizada em sua mansão, Donald Trump se recusou a responder um interrogatório relativo a outra investigação, de autoridades estatais em Nova York, sobre possíveis manobras fraudulentas de seus negócios imobiliários.

Uma vez mais proclamando-se como vítima da maior “caçada às bruxas” impulsionada pela “esquerda radical democrata”, Trump continuou convertendo suas batalhas legais em uma guerra política, fomentando possíveis reações violentas de seus fanáticos.

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Nesta quarta-feira (10), obrigado por ordem judicial a comparecer a um interrogatório sob juramento em Manhattan, realizado pela procuradora-geral de Nova York, Letitia James, como parte de sua investigação civil sobre possíveis manobras ilegais dos negócios do ex-presidente, Trump invocou seu direito sob a Quinta Emenda da Constituição, contra a autoincriminação, e recusou-se a responder todas as perguntas.


Quinta Emenda

O ex-mandatário justificou o uso da Quinta Emenda em um comunicado, afirmando que “quando sua família, sua empresa e todas as pessoas em sua órbita se tornaram alvo de uma caçada às bruxas motivada politicamente e apoiada por advogados, promotores e os meios de notícias falsos, não se tem opções”. Isto, apesar de que, no passado, o próprio Trump havia burlado os democratas e outros que haviam empregado esse mesmo direito, acusando que só os culpados o faziam.  

Trump denunciou que os diversos ataques contra ele fazem com que este país pareça “uma república de bananas”. No entanto, não comentou as alegações no caso de que ele e sua empresa informaram falsamente o valor de seus bens e investimentos para manipular tanto bancos, como autoridades fiscais, entre outros. 

A investigação civil em Nova York poderia culminar na elaboração de uma acusação que poderia exigir multas e até proibições para certas operações empresariais de Trump e sua empresa. Ao mesmo tempo, o escritório do promotor de Manhattan mantém aberta uma investigação criminal paralela à de James.


Trump e o FBI

Enquanto isso, a busca na mansão e clube de Trump – conhecido como Mar-a-Lago – em Palm Springs, Florida, realizada pelo FBI, continua provocando sismos políticos, embora não haja informação oficial do que exatamente se buscava, nem o que foi que se achou – há versões de que as autoridades tiraram umas 10 ou 15 caixas de materiais na segunda-feira.  

Informações prestadas a meios por parte de autoridades “com conhecimento” da operação, brindaram mais detalhes e confirmaram que o objetivo eram documentos oficiais, possivelmente secretos, que estavam indevidamente em mãos do ex-presidente. 

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Como mencionado, todo presidente está obrigado por uma lei de 1978 a entregar todo documento oficial em sua posse aos Arquivos Nacionais quando concluem seu período de governo. Foi o próprio Trump que, como presidente, promulgou uma lei em 2018, que enquadrava como delito ainda maior que um funcionário público sem autorização removesse e mantivesse em sua posse documentos classificados.


Ordem judicial

A ordem judicial aprovada por um juiz federal na Flórida autorizou o FBI a realizar a busca de documentos que se suspeitava estarem ilegalmente nas mãos do ex-presidente. 

Segundo uma reportagem exclusiva de William Arkin no Newsweek, fontes governamentais divulgaram que contavam com um informante com conhecimento da existência de documentos oficiais e sua localização dentro de Mar-a-Lago, e isso foi o que guiou a busca do FBI. De acordo com essa informação, participaram duas dúzias de agentes do FBI e técnicos. 

Intensificando a especulação, recordou-se que, em junho, Jay Bratt, chefe de contrainteligência do Departamento de Justiça, visitou Mar-a-Lago supostamente para abordar o tema dos documentos oficiais em posse de Trump depois de sair da Casa Branca. Há sete meses, Trump entregou 15 caixas desses documentos, alguns classificados como secretos, aos Arquivos Nacionais, lugar a que pertenciam. Alguns indicam que a presença de Bratt implica que se suspeitava que Trump ainda tinha mais documentos com informação oficial delicada.


Custódia de documentos oficiais

Talvez o que poderia preocupar mais a Trump é que as penas impostas pela lei de 1978 para quem tenha custódia de documentos oficiais de maneira indevida não só incluem multas e possível prisão aos acusados, mas que também “serão desqualificados para assumir qualquer posto nos Estados Unidos”.

Trump continuou desqualificando a integridade da operação, repetindo que não só é politicamente motivada, mas cultivando outra teoria da conspiração iniciada por alguns de seus próprios advogados desde segunda-feira: ele insinua que o FBI poderia haver “semeado” evidências em sua residência durante a busca, algo que de imediato foi repetido por seus fanáticos. 

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Steve Bannon, ex-estrategista político de Trump, foi mais longe ao sugerir que a busca poderia ser parte de um complô do “estado profundo” que poderia incluir preparativos para “o assassinato do presidente Trump”.


Trump Junior

O filho de Trump, Donald Jr., emitiu uma solicitação para arrecadar fundos para a defesa de seu pai, e escreveu que o presidente Joe “Biden e os democratas estão seguindo as pegadas de todos os ditadores comunistas do Terceiro Mundo que a esquerda adora”, perseguindo “seus inimigos políticos”. 

Líderes republicanos, alguns em tons mais mensurados, continuaram protestando por esta ação sem precedentes contra um ex-presidente, e reiteraram suas demandas de que o procurador-geral e chefe do Departamento de Justiça, Merrick Garland, informe de imediato ao “povo” as razões e justificativas da busca. 

Também continuaram as ameaças de violência e até apelos a uma guerra civil, por ultradireitistas pró-Trump, nas redes sociais e em comentários aos meios, incluindo ameaças contra o juiz que autorizou a ordem de busca e sua família. 

Como observou um comentador, Trump continua a estabelecer um recorde de atos sem precedentes: primeiro presidente a ser julgado duas vezes em processos de impeachment; primeiro presidente a tentar um golpe de Estado; primeiro presidente a interromper o processo pacífico de transferência do poder; primeiro ex-presidente cuja residência pessoal foi cateada pelo FBI e, hoje, primeiro presidente a ter que invocar a Quinta Emenda.

David Brooks, correspondente do La Jornada em Nova York.
Tradução: Beatriz Cannabrava.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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