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ToggleNão são poucos os desafios de Silvina Batakis, nova Ministra da Economia da Argentina, que assumiu na segunda-feira (4) após a renúncia repentina de Martín Guzmán no fim de semana. Inflação acelerada, perda do valor do salário e apenas uma semana após uma tentativa de golpe de mercado por meio de uma política de corrida cambial, Batakis foi o nome de consenso entre as principais alas da dividida coalizão governista Frente de Todos (FdT) e abre uma nova perspectiva – ou expectativa – para o rumo da política econômica do país.
Nos poucos dias no cargo, Batakis já deu sinais para acalmar os principais agentes do mercado, apesar da especulação financeira “natural” após os movimentos no Ministério da Economia, que levou ao aumento do dólar paralelo. Reforçou que “seguirá o plano econômico do presidente” e que o controvertido acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), firmado em março, será mantido, mas “terá mudanças”.
Este é um dos pontos de atenção de sua gestão, e que pode ser decisivo para uma mudança efetiva de gestão econômica no país. O acordo firmado pelo ex-ministro Martín Guzmán com o Fundo aprofundou as diferenças entre albertismo e kirchnerismo, marcada pela renúncia de Máximo Kirchner da presidência do FdT.
“A perspectiva fiscalista é uma crítica da vice-presidenta Cristina Kirchner na coalizão, e tem a ver com a ideia de que a redução do déficit fiscal resolve o problema inflacionário”, afirma ao Brasil de Fato o economista Emiliano López, do Instituto Tricontinental, sobre um dos principais pontos do acordo.
“Essas políticas, a monetária e a fiscal, têm uma perspectiva bastante afim ao establishment econômico e político global. Essa gestão não obteve os resultados esperados, especialmente em relação às variáveis distributivas e inflacionárias.”
Em uma semana decisiva, a nova ministra tem se reunido com o presidente Alberto Fernández para estabelecer seu plano de gestão e definir sua própria equipe. Este será um ponto importante, já que um dos reflexos da divisão da coalizão estava nas travas na administração econômica, com uma oposição entre os funcionários da ala que atendem à vice-presidenta Cristina Fernández de Kirchner e àqueles que respondem ao presidente Alberto Fernández.
Casa Rosada
Presidente Alberto Fernández toma juramento da nova Ministra da Economia da Argentina, Silvina Batakis
Último funcionário ligado a Guzmán renunciou
Nesta quarta-feira (6), o Secretário do Comércio, Guillermo Hang, renunciou, sendo o último funcionário ligado a Guzmán. Batakis designou Martín Pollera, com quem trabalhou no Ministério do Interior, como responsável da Secretaria do Comércio, pasta-chave para as políticas de preços ao consumidor através de programas importantes, como o Preços Máximos e o Preços Cuidados, e negociações com o setor industrial e produtivo de alimentos.
Em uma perspectiva imediata, o tema de inflação e preços é o mais sensível sob o qual a população na Argentina padece, com uma inflação anual já em 60,7% e que não baixa de 5% no índice mensal desde março, mês em que, já desatada a guerra na Ucrânia, a variação mensal sofreu um pico de 6,7%.
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“É o ponto crítico que guia tudo”, enfatiza ao Brasil de Fato o economista argentino Claudio Katz, integrante do coletivo Economistas de Esquerda. Ele destaca três determinantes recentes desta inflação. “O primeiro são os preços internacionais dos alimentos. A Argentina exporta alimentos, e sem regulamentação estatal que divorcie o preço internacional do local, há inflação.”
“O segundo fator determinante da inflação é a atuação indisciplinada dos grupos concentrados sobre o estabelecimento de preços”, continua o economista. “Não são apenas os exportadores, mas grandes capitais argentinos que recompõem lucro de forma acelerada remarcando preços e não aceitam nenhum tipo de controle por parte do Estado”, explica Katz.
O terceiro elemento, explica ele, é o próprio acordo com o FMI. “Inclui aumento de tarifas, do tipo de câmbio, ou seja, desvalorização da moeda, e redução do déficit fiscal, que exige que o governo aumente a arrecadação mais rapidamente que seu gasto.” Sobre isso, agrega: “É um acordo inflacionário”, afirma Katz, não tão otimista com a nomeação de Batakis. “É uma continuação do mesmo projeto econômico.” A nova ministra Silvina Batakis conversou pela primeira vez com funcionários do FMI nesta quarta-feira (6).
Apesar de buscar políticas de justiça social, a gestão econômica da FdT foi, como governo nacional, uma gestão de crise, somada à própria crise interna da coalizão. O diagnóstico tem sido a falta de ideias, mas a nomeação de Silvina Batakis – terceira ministra mulher à frente de um ministério na Argentina atualmente –, apesar de tudo, surge para muitos como uma expectativa de novas propostas para enfrentar o difícil cenário atual.
Batakis inaugura uma nova gestão da economia
Além do contexto de inflação mundial, economias dolarizadas como a argentina padecem a pressão de preços com a especulação financeira. Após quatro anos do governo neoliberal de Mauricio Macri – que abriu as portas para a fuga de divisas dos grandes capitais e endividou o país em US$ 44,5 bilhões (R$ 240 bilhões) com o FMI –, a pandemia e a guerra agravaram o cenário do qual o governo peronista, eleito em 2019, não foi capaz de recuperar o país.
Há expectativas positivas sobre Silvina Batakis, especialmente pelo contraste que, de cara, a até então secretária de províncias do Ministério do Interior apresenta em relação ao seu antecessor.
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“O ex-ministro Guzmán tem uma formação acadêmica baseada na lógica do mainstream econômico, com uma certa perspectiva progressista sobre algumas variáveis econômicas, mas sem sair das noções básicas da economia tradicional”, destaca o economista Emiliano López. Ele descreve esse tradicionalismo com a política fiscal restritiva, o balanço do equilíbrio fiscal como chave central e a percepção da inflação apenas como um fenômeno monetário, como emissão de moeda. Em outras palavras, a gestão de Guzmán pode ser caracterizada por seguir o manual, mas ineficiente no cotidiano da população.
“Batakis tem outro perfil”, continua López, morador da província de Buenos Aires, onde Batakis foi Ministra da Economia provincial entre 2011 e 2015. “Suas ideias se baseiam mais em trabalhar acordos por setores e ramos de atividade que permitam aumentar a produtividade e relançar a atividade econômica com acordos tripartites, entre Estado, sindicatos e empresários.”
Nos últimos dias, Batakis tem sido apresentada como uma alternativa que encontra um balanço entre os problemas macroeconômicos e a crise social vivida cotidianamente na mudança de preços sobre produtos básicos. Nesse sentido, a doutora em sociologia Luci Cavallero, feminista lésbica e integrante do movimento Ni Una Menos, destaca ao Brasil de Fato alguns pontos de atenção sobre os próximos passos da condução econômica do país sob comando da nova ministra.
“É necessário pôr a lupa sobre a economia do dia-a-dia das pessoas, o que exige uma reformulação das metas pautadas com o FMI, inclusive porque a guerra alterou todas as variáveis econômicas”, afirma. “Como ministra da província de Buenos Aires, Batakis sancionou o imposto sobre a herança e subiu os impostos a proprietários. Seria necessário que a ministra demonstre uma vocação política para avançar sobre a renda dos mais ricos, e que apoie explicitamente iniciativas desse tipo para obter arrecadação dos mais beneficiados de toda essa situação.” Além disso, Cavallero destaca que com Batakis, agora a terceira mulher à frente de uma pasta no governo nacional, ela leva adiante uma trajetória de militância popular e feminista.
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“Seria interessante um debate público sobre essa ideia de que não podemos direcionar todas as ações do Estado que tentam acalmar os mercados, porque isso não funciona nesses momentos de voracidade do capital”, propõe Cavallero. Ela menciona a gestão de Guzmán que, buscando não tocar os interesses do mercado, ainda assim o país sofreu três corridas cambiais.
Os passos da nova ministra
A expectativa é que ela responda às solicitações de grande parte dos movimentos sociais pelo avanço do projeto do Salário Básico Universal, uma prestação mensal para trabalhadores de baixa renda, em um contexto em que os salários perdem constantemente para a inflação.
Além disso, em seu primeiro pronunciamento como ministra, Batakis citou o alto potencial produtivo da Argentina com o reservatório de petróleo e gás não convencional de Vaca Muerta, cuja aposta está em exportar energia.
Outros temas que devem entrar em foco são o projeto de lei apresentado por Guzmán, para arrecadar, com uma contribuição única, a chamada renda inesperada dos grandes capitais que lucraram com a inflação devido à guerra na Ucrânia.
Fernanda Paixão | Brasil de Fato | Buenos Aires, Argentina
Edição: Arturo Hartmann
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