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Foto: Times Of Gaza / X

Para os EUA, não há evidência de que Israel viole Direito Internacional Humanitário

Ainda segundo John Kirby, porta-voz da Casa Branca, ataque contra comboio humanitário em Gaza na segunda-feira (1) não foi deliberado
Jim Cason, David Brooks
La Jornada
Washington, DC

Tradução:

Beatriz Cannabrava

O assassinato de sete trabalhadores de assistência humanitária da Organização World Central Kitchen (WCK), sediada nos Estados Unidos, provocou o presidente Joe Biden a expressar condolências. No entanto, seu porta-voz, John Kirby, ousou declarar que, neste ataque, assim como em todos os outros nos últimos 5 ou 6 meses, o governo estadunidense não detectou nenhuma ação de Israel que tenha violado a lei internacional.

Na semana em que o governo de Joe Biden admitiu estar enviando a Israel mega bombas de quase uma tonelada, capazes de destruir bairros inteiros, e está considerando enviar mais aviões de combate F-15, o ataque de Israel, que matou trabalhadores humanitários que viajavam em veículos claramente marcados e cujo movimento tinha sido previamente relatado aos militares israelenses, provocou raiva e condenação.

O fundador da WCK, o chef espanhol José Andrés, é bastante conhecido no circuito de elite de Washington, onde estão localizados alguns de seus restaurantes mais populares. À medida em que o número de mortos na guerra em Gaza aumentava, os seus esforços para levar ajuda àquela região foram amplamente cobertos pelos meios de comunicação social juntamente com as condições que testemunhou.

O Presidente Biden emitiu um comunicado no qual expressou a sua indignação pelas mortes de trabalhadores humanitários, descrevendo-as como uma tragédia. Exigiu uma investigação completa por parte de Israel e sublinhou que este não foi um incidente excepcional, uma vez que morreram demasiados trabalhadores humanitários em Gaza. Acusou Israel de não ter feito o suficiente para proteger os civis nesse conflito.

No entanto, evitou declarar que o ataque foi um crime ou que mudaria a sua política em relação à guerra de Israel. Acrescentou que conversou, na segunda-feira (11), com o seu amigo José Andrés, para expressar as suas condolências e apoio aos esforços heroicos da sua organização em Gaza. Ele não abordou a exigência da WCK de que Israel deve parar com a matança indiscriminada na área.

Na Casa Branca, perguntaram a Kirby se disparar um míssil contra trabalhadores humanitários e matá-los não é uma violação do direito internacional. Kirby respondeu: Sua pergunta pressupõe que foi um ataque deliberado… não há evidências disso”. Isto, apesar do fato, como observado por vários especialistas em direitos humanos, de os veículos terem grandes logótipos WCK pintados nas suas coberturas e de estarem separados por dois quilômetros quando os mísseis foram disparados e de terem sido atingidos múltiplas vezes.

Mas o porta-voz da Casa Branca para Assuntos de Segurança Nacional não parou por aí. Ele declarou: Continuamos a observar os incidentes quando eles ocorrem. O Departamento de Estado tem um processo em vigor e, até o momento, não encontrou nenhum incidente em que os israelenses tenham violado o direito humanitário internacional.

Leia também | Massacre contra ONG em Gaza revela: Netanyahu quer afundar Oriente Médio na guerra

Nessa ronda com a imprensa, outro repórter incrédulo perguntou então se os Estados Unidos concluíram que os israelenses nunca violaram o direito humanitário internacional nos últimos cinco ou seis meses. Kirby respondeu que o Departamento de Estado monitora essas questões em tempo real e não encontrou nenhum incidente que tenha violado o direito internacional.

Mas, como comentou Trita Parsi, vice-presidente executivo do Instituto Quincy em Washington, os Estados Unidos forneceram as armas que mataram os trabalhadores humanitários, juntamente com mais de 30 mil outras pessoas em Gaza. E como noticiou o Washington Post na sexta-feira passada (29), enquanto a administração Biden expressava publicamente preocupação com o crescente número de mortos em Gaza e a possibilidade de uma nova ofensiva israelense, juntamente com estas mortes recentes, o Pentágono aprovava a transferência de 1.800 bombas de mais de 900 kg, 500 bombas de mais de 220 kg e a possível transferência de aviões de combate. Essas bombas de 900 kg causaram baixas massivas, como relata o Post, durante a ofensiva de Israel em Gaza.

Bruce Finucane, um antigo advogado do Departamento de Estado que agora é conselheiro sênior do Grupo de Crise Internacional, disse na terça (2), num tweet, que quando um grupo armado apoiado pelo Irã mata cidadãos americanos num ataque de drone na Jordânia, os Estados Unidos respondem com ataques com mísseis contra grupos iranianos. Mas, quando Israel mata um cidadão num ataque de drone em Gaza, a resposta dos Estados Unidos é enviar mais armas para Israel.

Como acontece frequentemente nos Estados Unidos, a morte de um cidadão americano poderia forçar alguma mudança na política mais do que a morte de 30 mil palestinos. E certamente intensificará ainda mais os crescentes protestos que Biden enfrenta devido à sua política de cumplicidade com Israel. Nas primárias em quatro estados que se aproximam – Nova Iorque, Wisconsin, Connecticut e Rhode Island – espera-se que muitos eleitores do Partido Democrata votem sem compromisso ou deixem votos em branco em protesto contra Biden, aumentando o custo político do apoio à guerra de Israel contra Gaza.

La Jornada, especial para Diálogos do Sul – Direitos reservados.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Jim Cason Correspondente do La Jornada e membro do Friends Committee On National Legislation nos EUA, trabalhou por mais de 30 anos pela mudança social como ativista e jornalista. Foi ainda editor sênior da AllAfrica.com, o maior distribuidor de notícias e informações sobre a África no mundo.
David Brooks Correspondente do La Jornada nos EUA desde 1992, é autor de vários trabalhos acadêmicos e em 1988 fundou o Programa Diálogos México-EUA, que promoveu um intercâmbio bilateral entre setores sociais nacionais desses países sobre integração econômica. Foi também pesquisador sênior e membro fundador do Centro Latino-americano de Estudos Estratégicos (CLEE), na Cidade do México.

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