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Paulo Cannabrava | Orçamento secreto virou sinônimo para esconder a corrupção

Governo Bolsonaro começa a perder o rumo diante de tanta esculhambação e já dá sinais de que deve mais do que pode pagar
Paulo Cannabrava Filho
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

Orçamento Secreto. O que é isso?

Chama atenção ser secreto e estar publicado.

Orçamento Secreto existe em alguns governos para questões de máxima segurança nacional, operações encobertas de inteligência necessárias para proteger a Nação e seu governante. Mas não é o caso. No país dos absurdos há um absurdo Orçamento Secreto para beneficiar o cara que ocupa a presidência e comprar parlamentares para que o apoiem.

Mensalão, mensalinho… aquilo virou brincadeira de criança. O Orçamento Secreto criado pelo governo de ocupação é de R$ 3 bilhões.

São vários crimes. Primeiro criar um orçamento secreto. O superministro da Economia, senhor Paulo Guedes, não tem autoridade para isso. O segundo crime é a verba ser usada para benefício pessoal e para comprar deputados. Um terceiro crime é la na ponta, o deputado comprar equipamentos e pagar serviços sobre-faturados.

R$ 1.6 bilhão só para festa de sua base de apoio, aonde aparecem os tratores super-faturados. O escândalo maior ocorre com a Codevasp -Cia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Paraíba, recebendo R$ 1 bilhão de orçamento secreto. É secreto, pode gastar a vontade, para segurança pessoal e da família.

Até os tucanos que apoiam o governo, estão estão espantados com o escândalo da Codevasp e o senador Roberto Rocha, do Maranhão, pediu que seja instalada uma CPI para investigar e apurar os possíveis crimes contra o erário.

Orçamento é coisa séria

Interessante, o Estadão publicou editorial, no dia de ontem, em que constata dados do tal do Orçamento Secreto. Qualifica de Escândalo e de Pouco Republicano e ponto. Editorial principal não é para dar notícia, é para dar opinião da direção do jornal, é para orientar os seus leitores. Nenhuma palavra.

A área técnica do TCU está examinando as contas das obras da Codevasp, mas os jornais apenas constatam. É muito cinismo. Comenta o escândalo da Codevasp como oferecendo a galinha, os ovos e a chave do galinheiro para vorazes raposas. E daí? É normal? Ninguém precisa ser punido? Vale lembrar que por muito menos que isso, a história das pedaladas que depois se comprovou não ser crime, pediram a deposição da presidenta Dilma Rousseff.

Orçamento é coisa séria. Tem que ser transparente. O orçamento deste ano é uma peça de antologia, ficará na história como mais um dos absurdos deste governo. Não tem dinheiro para as questões fundamentais como Educação e Saúde nem para as questões vitais como a compra da vacina contra a Covid 19, mas tem R$ 3 bilhões para farra dos deputados e para os comensais do palácio do planalto.

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Vergonha alheia

Sinto-me envergonhado.

Mais que corrupção é bandalheira, é tripudiar sobre a miséria de nosso povo, a maior vítima dessa tríplice crise -econômica-política-sanitária- que já se tornou uma crise civilizatória como vaticinara Darcy Ribeiro.

Auxilio emergencial reduzido não alcança para saciar a fome da população que novamente, virou flagelo. A fome é de novo a maior causa de morte no país. Desnutrição torna as crianças indefesas, morrem até por causa de uma gripezinha.

Betinho, o sociólogo Herbert de Souza, criou em 1993 o programa Ação da Cidadania, contra a Fome a Miséria e pela Vida, com o objetivo de elevar à condição de dignidade, 32 milhões de brasileiros que estavam abaixo da linha da pobreza.

Governo Bolsonaro começa a perder o rumo diante de tanta esculhambação e já dá sinais de que deve mais do que pode pagar

Adalberto Marques/Ministério do Desenvolvimento Regional
O Orçamento Secreto criado pelo governo de ocupação é de R$ 3 bilhões.

Começou no governo de Itamar Franco, atravessou o governo de FHC. Betinho morreu em 1997, mas o programa continuou sob a direção do Ibase, foi assumido por Lula em 2003 como Programa Fome Zero, em substituição ao Programa Comunidade Solidária criado em 1995 por FHC. 

Mas a Ação da Cidadania continua, hoje dirigida por Daniel de Souza, filho do Betinho, que declarou que nunca houve tanta fome no Brasil. E tem razão. Hoje a necessidade é levar comida para 60 milhões de pessoas. É urgente enfrentar a fome. 

Os produtos essenciais subiram 30% contra uma inflação assumida pelo governo de 7%. Inflação de 7%? Só se for para os generais ministros que ganham R$ 60 mil. Aí não tem inflação, o salário aumenta todos os anos.

Mas, para o povão, alimentação subiu 20%, bem mais que a inflação, combustível também 20%, também o gás de cozinha, a conta de luz e de água. No desemprego ou na informalidade amplos setores da classe média está mal alimentada, ficando obesa e predisposta a enfermidades.

O mais grave é que tem muita gente que desistiu de procurar emprego e logo estarão engrossando a multidão de famélicos. A taxa de inatividade que em 2019 estavam em 7,6% para 11,8% em 2020, atingindo maioria de mulheres e de não brancos. Soma-se a isso os desempregados e os desalentados e a partir da desregulamentação do trabalho, cria-se uma enorme quantidade de precarizados, os uberizados.

Quem chama a atenção para esses dados são especialistas da OCDE, o clube dos países ricos, onde o Paulo Guedes quer inserir o Brasil. Para ingressar tem que atender a certos requisitos que o Brasil de maneira nenhuma pode cumprir. Um deles é a questão do emprego.

Nada menos que 60 ONGs enviaram carta denunciando que o governo está desmantelando as políticas ambientais, outra questão que impede o país de ingressar no clube.

O Brasil não pode trocar a OMC pela OCDE. Aliás, há que dizer, é uma grande burrice, apoiada pelo governo de Trump, o Brasil pretender entrar da OCDE. Lá o que valem são as regras impostas pelos Estados Unidos em seu benefício, claro.

O Brasil tem que permanecer na OMC, é uma organização multilateral das Nações Unidas onde os países em desenvolvimento desfrutam de alguns privilégios.

Culpado é um só. O governo de ocupação e da incompetência e da incúria. Governo que ri das 400 mil mortes.

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Será que o barco a deriva afunda?

Estão se multiplicado as deserções no barco governamental à deriva. Será que afunda?

Pelas dúvidas é melhor abandonar o barco. Os ratos são sempre os primeiros que saem. O contra-almirante Barra Torres, navegante que é, sabe disso. Mais uma deserção na direita. O PSD do Gilberto Kassab está a receber os desgarrados do DEM, gente de peso como o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes e o ex-presidente da Câmara dos Deputados, deputado Rodrigo Maia. Este, com seu pai, Cesar Maia, que já governou o estado e traz muita gente consigo.

Quem está indo embora são também os investidores. Ninguém mais confia neste governo que insiste nos mesmos erros que veem sendo perpetrados há quatro décadas. Investimento direto que em 2018 foi de US$ 78,16 bilhões, baixou para US$ 69,17 em 2019, US$ 34,17 em 2020. 

O Paulo Guedes em mais uma de suas fantasias anunciou que em 2021 teremos US$ 53 bilhões. Como? Impossível pois está aumentando o fluxo de desinvestimento. Inclusive grandes corporações transnacionais estão indo embora.

Por falta de confiança no governo, ou por perceber que não há futuro com os atuais gestores da economia, grandes corporações estão abandonando o país, aumentando o desemprego e o desalento. Só neste ano, já se foram: Ford Co.; as farmacêuticas Roche e Eli Lilly; a franco-suíça Laforge HJolrin, a atacadista estadunidenses Walmart; a espanhola Cabify; as L’Ocitane, a coreana LG celulares, automobilística alemã Audi, a Mercedes também está diminuindo sua presença.

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A tropa de choque está desarvorada

E diretor da Anvisa, será que desertou também? Ou vai ser desertado. Em depoimento à CPI do genocídio, digo CPI da Covid, o contra-almirante Antonio Barra Torres admite que o comportamento de Bolsonaro com relação à pandemia põe em risco a saúde da população.

Barra Torres, além de oficial da marinha é médico, saberá que colocar em risco a saúde da população é crime contra a humanidade? Crime inafiançável. Interessante que a tropa de choque armada pelo governo para defendê-lo na CPI ficou completamente desarvorada.

Também ficou pendurada na brocha diante da surra verbal que o Paulo Guedes levou na sessão de hoje na Câmara para defender a reforma administrativa. O superministro acovardou-se, ficou mudo, só disse coisas que nada tinha a ver com a realidade e ouviu tudo o que tinha que ser dito. 

Em resumo, a reforma que propõe só atinge os funcionários públicos que já estão sacrificados, com os salários congelados. Não se toca em nenhum dos privilégios dos que ganham acima do teto nem dos generais ganhando 60 mil. Encerrando.

À todas as denúncias aqui mencionadas, o chefe do governo de ocupação reagiu chamando de canalhas aqueles que denunciaram. Diz que em seu governo não existe corrupção e aquela gente em torno do chiqueirinho em frente ao Palácio da Alvorada, aplaude e o chama de mito.

A última pesquisa da XP/Ipesp dá 53% de desaprovação ao governo. Está melhorando o nível de percepção da população, mas ainda falta muito. Nessa pesquisa Lula e Bolsonaro continua empatados, 29% cada. Porém, a pesquisa da Data Folha dá 55% para Lula e 32% para Bolsonaro num segundo turno.

Paulo Cannabrava Filho é jornalista e editor da revista Diálogos do Sul.


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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Paulo Cannabrava Filho Iniciou a carreira como repórter no jornal O Tempo, em 1957. Quatro anos depois, integrou a primeira equipe de correspondentes da Agência Prensa Latina. Hoje dirige a revista eletrônica Diálogos do Sul, inspirada no projeto Cadernos do Terceiro Mundo.

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