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Política da ditadura de Pinochet é combustível para fogo que hoje destrói o Chile

Imprensa chilena mantém firme sua postura de silêncio e manipulação, com a intenção de adjudicar atual governo
Carolina Vásquez Araya
Diálogos do Sul
Cidade da Guatemala

Tradução:

Incapazes de deter o latrocínio dos bosques nativos e, muito pelo contrário, convertidos em cúmplices de sua destruição, os sucessivos governos do Chile protegeram e consentiram a invasão dos grandes proprietários de terras e suas manobras contra um dos intocados entornos naturais do nosso continente.

Nestes primeiros dias de fevereiro, mais de 250 focos de incêndio – presumidamente provocados – envolvem em chamas enormes extensões nas regiões de Maule, Ñuble, Bio Bio e da Araucanía, deixando à sua passagem desolação e morte.

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A pergunta é: a quem beneficia tanta destruição? Para começar a entender a origem da tragédia, é preciso remontar-se aos tempos da ditadura, quando o governo de Pinochet decidiu “incentivar a economia” por meio de um decreto, cujo objetivo era impulsionar a indústria papeleira destinando enormes extensões aos cultivos de eucalipto e pinho.

A iniciativa consistia em bonificar os proprietários de terra com 75% dos custos dessas plantações durante um prazo de 10 anos. Assim foi como iniciou o desaparecimento paulatino das espécies nativas com sua fauna associada, mas também a seca e a acidificação dos solos, onde já não resta sinal de nutrientes e onde não se pode cultivar nada mais. 

No entanto, é importante assinalar que os principais encarregados de levar a cabo o plano do governo eram também parte interessada das empresas beneficiadas.

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Presidência do Chile
Se os governantes se submetem diante do dinheiro e a imprensa cala, o povo deve falar




Alongamento dos prazos

Ao vencer o prazo outorgado pela ditadura, os presidentes da Concertação decidiram estendê-lo; entre eles Frei, Piñera y Bachelet, esta última que considerou importante mantê-lo por “sua contribuição contra os gases estufa”. Isto é, governos cujos princípios social democratas foram ignorados por pressões dos grandes consórcios empresariais. 

O que resta hoje nesse Sul magnífico povoado de Olivillo, Tepa, Ulmo, Arrayán, Alerce, Coigüe, Raulí, em cujos ramos habitavam abundantes colônias de aves e mamíferos próprios da região, é um campo carbonizado; aldeias queimadas até os alicerces; pessoas desaparecidas e outras mortas; a própria imagem da desolação, evidência de até onde pode chegar a cegueira das autoridades e a cobiça de seus grupos de poder. 

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Fazendo gala de sua cumplicidade com o sistema que ampara esses abusos, a imprensa chilena se mantém firme em sua postura de silêncio e manipulação, com a intenção de adjudicar ao governo atual a culpa sobre a tragédia que vivem essas regiões.

O poder das famílias mais acaudaladas do Chile, aquelas que fundaram seus grandes consórcios sobre as ruínas de uma democracia que não lhes era propícia, foi o motor para impedir, entre outros fatos, um câmbio na Constituição desse país proposto com o objetivo de retomar os valores de um sistema capaz de trabalhar em benefício das grandes maiorias.

O Chile não só perde seus bosques milenares ao enriquecer um punhado de empresários incapazes de compreender o alcance de seus atos; também o continente perde um paraíso de biodiversidades irrecuperáveis, a incalculável variedade de sua fauna e a beleza de seu entorno. O sul do Chile, essa paisagem longínqua e inspiradora, não poderá recuperar sua integridade nas próximas centúrias, a menos que a depredação se detenha hoje.

Se os governantes se submetem diante do dinheiro e a imprensa cala, o povo deve falar. 

Carolina Vásquez Araya | Colaboradora da Diálogos do Sul na Cidade da Guatemala.
Tradução: Beatriz Cannabrava.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Carolina Vásquez Araya Jornalista e editora com mais de 30 anos de experiência. Tem como temas centrais de suas reflexões cultura e educação, direitos humanos, justiça, meio ambiente, mulheres e infância

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