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ToggleQueridos amigos e amigas,
Saudações do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social.
Quase três milhões de pessoas foram mortas pelo novo coronavírus (SAR-CoV-2) e mais de 128 milhões foram infectadas, muitas delas ficando com sequelas em sua saúde.
Até agora, cerca de 1,5% da população mundial de 7,7 bilhões foi vacinada, sendo 80% desse total em apenas dez países. Em fevereiro, o Instituto Tricontinental de Pesquisa Social fez um alerta em relação ao “apartheid sanitário” que marca a aplicação da vacina.
Desde 1950, a Organização Mundial da Saúde (OMS) comemora o Dia Mundial da Saúde no dia 7 de abril. A cada ano, a OMS escolhe um tema diferente para esse dia.
Ano passado foi “Apoiar enfermeiras e obstetrizes”. Este ano, o tema é “Construindo um mundo mais justo e saudável”, que aponta ao apartheid sanitário.
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No dia 1º de abril, a Semana Internacional de Luta Antiimperialista lançou o “Manifesto Internacional pela Vida”, que reivindicava “vacinas gratuitas para todas as pessoas”.
A carta desta semana abre espaço ao Alerta Vermelho n. 10, que – com a orientação de cientistas e médicos – analisa a necessidade de uma vacina para todos e todas.
Governo Federal
As vacinas não estão sendo distribuídas ao Sul Global em número suficiente.
O que é uma vacina?
As doenças infecciosas podem causar quadros graves e levar à morte. Aqueles que sobrevivem à infecção frequentemente desenvolvem proteção duradoura contra a mesma enfermidade.
Cerca de 150 anos atrás, os cientistas descobriram que as infecções são causadas por “germes” microscópicos (o que agora chamamos de agentes patógenos), que podem ser transmitidos de animais para humanos e de pessoa para pessoa.
Uma pequena amostra enfraquecida desses patógenos poderia desencadear mudanças no corpo que poderiam proteger as pessoas de infecções graves no futuro. Esse é o princípio por trás das vacinas.
Uma vacina, contendo moléculas microscópicas que imitam partes de um agente patógeno causador de uma infecção, pode ser injetada no corpo para ativar essa proteção preventiva contra a doença.
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Embora uma vacina proteja apenas um indivíduo contra apenas um patógeno, quando muitas vacinas são conjugadas em programas de vacinação organizados e em grande escala, elas se tornam cruciais para intervenções a nível comunitário.
Nem todas as infecções podem ser evitadas com vacinas. Apesar dos enormes investimentos financeiros, ainda não temos (e talvez nunca tenhamos) vacinas confiáveis para certas doenças infecciosas – como HIV-AIDS e malária – devido à complexidade biológica dessas doenças.
Foi possível que as vacinas contra a covid-19 ficassem prontas para uso rapidamente porque – na maioria das vezes – são baseadas em mecanismos biológicos bem conhecidos relacionadas a doenças menos complexas. As vacinas são uma medida fundamental para conter epidemias infecciosas.
No entanto, as alterações genéticas no micróbio infeccioso podem torná-las ineficazes e exigir o desenvolvimento e aplicação de novas vacinas.
Por que a vacina contra a covid-19 não está sendo fornecida a todas as 7,7 bilhões de pessoas no mundo?
Pouco depois do surgimento do SAR-CoV-2, as autoridades chinesas sequenciaram o vírus e compartilharam essa informação em um site público. Cientistas de instituições públicas e privadas correram para baixar as informações e entender melhor o vírus e encontrar uma maneira de tratar seus efeitos no corpo humano e criar uma vacina para imunizar as pessoas contra a doença. Nessa fase, nenhuma patente foi emitida para nenhuma das informações.
Em poucos meses, nove empresas dos setores público e privado anunciaram que tinham vacinas candidatas: Pfizer/BioNTech, Moderna, AstraZeneca, Novavax, Johnson & Johnson, Sanofi/GSK, Sinovac, Sinopharm e Gamaleya.
As vacinas da Sinovac e Sinopharm são produzidas pelo setor público chinês e a da Gamaleya pelo setor público russo, (em meados de março, China e Rússia forneceram 800 milhões de doses para 41 países).
Os outros são produzidos por empresas privadas que recebem grandes quantias de recursos públicos. A Moderna, por exemplo, recebeu 2,48 bilhões de dólares do governo dos EUA, enquanto a Pfizer recebeu 548 milhões de dólares da União Europeia e do governo alemão.
Essas empresas utilizaram dinheiro público na produção de uma vacina e, em seguida, começaram a obter enormes lucros – assegurados pelas patentes – com suas vendas. Esse é um exemplo de especulação pandêmica.
As informações sobre o número de vacinas vendidas e transportadas para diferentes partes do mundo mudam rapidamente. No entanto, agora se sabe que muitas nações mais pobres não terão vacinas para seus cidadãos antes de 2023, enquanto o Norte Global garantiu mais doses que o necessário – o suficiente para vacinar suas populações até três vezes mais.
O Canadá, por exemplo, tem vacinas suficientes para vacinar seus cidadãos cinco vezes. O Norte Global, com menos de 14% da população mundial, garantiu mais da metade do total de vacinas previstas. Isso é conhecido como acúmulo de vacina ou nacionalismo vacinal.
Os governos da Índia e da África do Sul abordaram a Organização Mundial do Comércio (OMC) em outubro de 2020 para pedir uma quebra temporária das patentes no âmbito do Tratado sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (Trips).
Se a OMC tivesse concordado com essa isenção, esses países poderiam ter produzido versões genéricas da vacina a baixo custo para distribuir e fazer campanhas de vacinação em massa.
No entanto, o Norte Global liderou a oposição a esta proposta, argumentando que tal quebra – mesmo em meio a uma pandemia – sufocaria a pesquisa e a inovação (apesar do fato das vacinas terem sido desenvolvidas em grande parte com dinheiro público). O Norte Global freou com sucesso o pedido de quebra na OMC.
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Em abril de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS), com outros parceiros, instituiu o Acesso Global a Vacinas da Covid-19 ou Covax. O objetivo da Covax é garantir o acesso equitativo aos imunizantes. O projeto é liderado pela Unicef, The Vaccine Alliance (Gavi), Coalizão para Inovações de Preparação para Epidemias (Cepi) e a OMS.
Apesar do fato de que a maioria dos países do mundo assinaram a aliança, as vacinas não estão sendo distribuídas ao Sul Global em número suficiente. Um estudo de dezembro de 2020 descobriu que, durante 2021, quase setenta países do Sul Global só serão capazes de imunizar uma em cada dez pessoas.
Em vez de apoiar o pedido de isenção entre Índia e África do Sul, a Covax apoiou uma proposta de pool de patentes chamada Covid-19 Technology Access Pool (C-Tap). Esse processo envolveria dois ou mais detentores de patentes concordando em licenciar suas patentes um para o outro ou para terceiros. A Covax não recebeu contribuições até o momento de empresas farmacêuticas.
Em maio de 2020, a OMS propôs estabelecer uma experiência internacional solidária com a vacina da covid-19, na qual a OMS coordenaria os locais de ensaio clínico em vários países.
Isso teria feito os imunizantes candidatos a entrar em fase de ensaio clínico de forma rápida e transparente; eles teriam sido testados em várias populações e as comparações poderiam ter sido feitas para detectar possíveis pontos positivos e limitações de cada vacina. Tanto as grandes farmacêuticas quanto os países do Norte sufocaram essa proposta.
O que seria necessário para produzir vacinas para 7,7 bilhões de pessoas?
A produção de vacinas varia de acordo com a plataforma tecnológica necessária para recriar uma “imitação” da infecção em particular que deve ser usada na vacina em questão.
Para imunizantes contra covid-19, existem muitas plataformas de sucesso. Duas dessas ocorrências foram as vacinas de RNA (caso da Moderna) e as vacinas de adenovírus (caso da AstraZeneca).
Essas plataformas são robustas, o que significa que se o know-how (incluindo segredos comerciais para a produção de vacinas) e pessoal qualificado estiverem disponíveis e as linhas de fabricação forem ampliadas e eficientes, a vacina poderá ser produzida para o povo.
A palavra “se” está em itálico porque esses são os impedimentos mais importantes que derivam da lógica capitalista dos direitos de propriedade intelectual e do impulso de longo prazo para minar um setor público centrado no bem comum.
Uma abordagem intermediária para a produção de vacinas tenta a fabricação em larga escala de proteínas miméticas em tanques de fermentação (a vacina Novavax, por exemplo, é fabricada dessa forma). Para esta plataforma, a capacidade de absorção e pessoal especializado são mais generalizadas. O controle de qualidade e questões de segurança variam mais de lote para lote nessas plataformas, o que é um obstáculo para a produção descentralizada generalizada.
Existe uma maneira muito mais simples de produzir as vacinas: cultivar o agente infeccioso, inativá-lo (ou seja, torná-lo não perigoso) e injetá-lo no corpo (como a Covaxin, a vacina desenvolvida pela farmacêutica Bharat Biotech na Índia). Mas há problemas aqui, uma vez que nem sempre é fácil inativar o patógeno prejudicial e, ao mesmo tempo, mantê-lo inteiro para desenvolver os anticorpos.
O que seria necessário para administrar vacinas a 7,7 bilhões de pessoas?
Para administrar amplamente os imunizantes contra a Covid-19 em todo o mundo, precisamos considerar três elementos:
1. Sistemas de Saúde Públicos. Programas de vacinação eficazes requerem sistemas de saúde públicos robustos. Mas estes foram sucateados por políticas de austeridade de longo prazo em muitos países em todo o mundo. Portanto, não há número suficiente de pessoal qualificado e com prática para administrar a vacina; uma vez que se trata de vacinas sensíveis, a preparação e a administração dos imunizantes devem ser feitas por profissionais de saúde pública treinados (tanto para garantir que a vacina seja administrada de forma otimizada quanto para prevenir efeitos colaterais).
2. Transporte e cadeias do frio. Como as linhas de produção de vacinas regionais e nacionais não estão disponíveis, as vacinas precisam ser transportadas por longas distâncias. Alguns imunizantes requerem uma cadeia de ultra frio que são simplesmente impraticáveis em grande parte do Sul Global.
3. Sistemas de monitoramento médico. Finalmente, é necessário que haja sistemas bem desenvolvidos para monitorar o impacto da vacina. Isso requer acompanhamento de longo prazo e tanto pessoal como tecnologias que muitas vezes faltam nas nações mais pobres, que há muito tempo estão em desvantagem na ordem econômica global.
Vale a pena ler e circular a Declaração de Alma-Ata (1978) sobre cuidados primários de saúde e a Carta do Povo para a Saúde (2000), ambas fortes declarações para uma abordagem sólida e humana aos cuidados de saúde.
Esta última pede a rejeição de “patentes de vida”, que incluem vacinas. Não há alternativa que não seja uma vacina popular para colocar a vida acima do lucro.
Cordialmente,
Vijay.
Edição: Poliana Dallabrida
Vijay Prashad é historiador e jornalista indiano. Diretor geral do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social.
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