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“Que Paguem!“: Ativistas de 68 países lançam campanha para que grandes corporações compensem crise climática

É hora para que os grandes responsáveis pela crise climática paguem! Pelas reparações, por soluções reais; por uma transição justa!
Amyra El Khalili
Diálogos do Sul Global
São Paulo (SP)

Tradução:

“No deserto a verdade é a melhor camuflagem, porque ninguém acredita nela!”
Provérbio beduíno

A Cúpula de Líderes sobre o combate às mudanças climáticas, convocada por Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, coincidindo com a celebração do Dia da Mãe Terra (22 e 23 de Abril), foi realizada por videoconferência com a participação de 40 chefes de Estados, de Governos e altos funcionários de organismos internacionais como o secretário geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres.

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O encontro reuniu os representantes das 17 economias responsáveis por 80% das emissões dos gases do efeito estufa para preparar o terreno para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 26), a realizar-se em novembro na cidade de Glasgow, Escócia, no Reino Unido.

Na abertura da conferência, Joe Biden declarou estar empenhado em reduzir em 50% as emissões de carbono dos Estados Unidos até o final desta década, buscando lugar de destaque na luta contra as mudanças climáticas, a fim de limpar a imagem desgastada de negacionista deixada por Donald Trump.

O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro pediu cooperação financeira e em contrapartida prometeu “neutralização climática” do Brasil, sinalizando seu alinhamento ao fracassado mercado de carbono com políticas de “compensação”, tendo como exemplo os acordos anteriormente firmados entre os Estados do Acre (Brasil), Califórnia (EUA) e Chiapas (México), duramente criticado por várias lideranças indígenas e movimentos sociais na Amazônia. 

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Desde quando assumiu o poder em janeiro de 2019, organizações governamentais e ambientalistas denunciam o negacionismo de Bolsonaro e a recusa em demarcar terras indígenas com suas promessas de abri-las para exploração por madeireiros e mineradores, entre outras violações dos direitos humanos e demais crimes ambientais, além do desmantelamento das estruturas de fiscalização como o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis (Ibama), assim como a legalização da grilagem e a posse indiscriminada de terras públicas, entre outros abusos. 

É hora para que os grandes responsáveis pela crise climática paguem! Pelas reparações, por soluções reais; por uma transição justa!

Senado Federal
É hora para que os grandes responsáveis pela crise climática paguem!

Manifestos e cartas a Joe Biden

Um grupo de 36 artistas do Brasil e Estados Unidos publicaram uma carta pedindo que Joe Biden rechace qualquer acordo climático com o governo Bolsonaro. “Instamos o seu governo a escutar o nosso chamado – que não firmem nenhum acordo com o Brasil neste momento”, diz a carta aberta das celebridades como o ator Leonardo DiCaprio, a estrela pop Katy Perry e os músicos Caetano Veloso e Gilberto Gil.

O texto aponta que Biden “continue o diálogo com os povos indígenas e com as comunidades tradicionais da Amazônia, com os governos subnacionais e com a sociedade civil, antes de anunciar qualquer compromisso”. O manifesto se agrega a outras petições enviadas a Biden nos últimos dias, enfatizando a importância de não se comprometer com o governo Bolsonaro sem “ouvir”, bem como permitir a participação da sociedade civil nas negociações. 

No encontro virtual anunciaram a criação da “Net Zero Asset Managers”, coordenado por um programa das Nações Unidas (ONU) para o Meio Ambiente. Trata-se de uma iniciativa de 43 bancos globais, organizada pelos gigantes financeiros como Deutsche Bank, Credit Suisse, BNP, Bank of America, HSBC, Morgan Stanley e Standard Chartered, firmando um compromisso no combate às mudanças climáticas. 

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Os banqueiros se comprometem a incluir em seus programas de financiamento, os objetivos de alcançar as metas de baixo carbono, zerando-as antes de 2050 aliados a mais de 160 empresas, cujos ativos somam 70 milhões de dólares para coordenar compromissos e ações em todo sistema financeiro, incluindo desenvolver ferramentas de análise e infraestrutura para o mercado com a qualificação, a quantificação e a precificação de créditos ambientais e auditorias nas Bolsas de Valores. 

Lançaram também a “Coalizão de redução de emissões aceleradas para financiamento florestal” (LEAF, em inglês), um fundo para a preservação das florestas tropicais em do mundo. A LEAF foi criada por corporações como Amazon, Salesforce, Airbnb, Unilever, Bayer, Boston Consulting Group, McKinsey, GSK, Nestlé, e inicialmente os acompanham os governos dos Estados Unidos, Noruega e Reino Unido. 

Prometendo mundos e fundos

Na contramão dos velhos e desgastados discursos governamentais e do lobby de corporações que costumeiramente repetem as mesmas promessas durante as conferências climáticas que se arrastam por quase três décadas (desde Rio de Janeiro – Carta da Terra em 1992), mas que prática eles retomam com mais vigor com os financiamentos e incentivos às atividades de mineração, de expansão do agronegócio, de extrativismo industrial e de reserva de mercados (como o patenteamento genético da biodiversidade), tendo como meta a “financeirização da natureza”, desponta no horizonte pacifista, para nossa esperança e glória, a “Campanha Que Paguem!”, idealizada no seio da sociedade civil, formada por uma ampla frente mundial pela emancipação dos povos em defesa da vida e de verdadeiros caminhos sustentáveis. 

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A “Campanha Que Paguem”, coordenada pelas Ongs Corporate Accountability International, Amazon Watch, Friends of de Earth Internacional, Indigenous Environmental Network, Corporate Europe Observatory, Global Forest Coalition, entre outras, firmada por mais de 300 Ongs e pelas principais instituições de 68 países, com mais de 200 mil assinaturas, coloca sobre a mesa uma contraproposta fundamentada como alternativa “à economia de mercado”, denunciando e combatendo o modelo de risco sistêmico que representam as falsas soluções dos mercados de carbono e seus derivativos.  

Eis o que propomos:

Screen Shot 2021-03-24 at 02.25.16.pngÉ hora para que os grandes responsáveis pela crise climática paguem!

As grandes corporações de combustíveis fósseis, da agroindústria e de outros setores extrativistas, com o apoio dos governos, estão interferindo, desviando e atrasando a ação climática durante anos, promovendo falsas soluções para seguir com suas operações e continuar lucrando com a destruição do planeta e do sofrimento de milhões de pessoas em todo o mundo. O pior de tudo é que agora estão colocando o futuro em perigo.

É por isso que devemos seguir unindo forças para fazer com que esses grandes contaminadores sejam sancionados e paguem pela crise climática!

Que paguem pelos danos e pelas perdas! Pelas reparações, por soluções reais; por uma transição justa!

Neste momento de pandemia virulenta, quando milhares e milhares tombam por consequência dos desatinos e insanidades política-institucional, há um sentimento de ceticismo entre as lideranças comunitárias e ativistas, acreditando-se que este encontro preparatório para a próxima COP 26 tenha sido “mais do mesmo” (business as usual).

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Porém, não será por falta de propostas e iniciativas emergindo do clamor das ruas e da ação proativa de nossas frentes que, mais uma vez, se justifique a omissão e a negligência de governos e das corporações no combate às mudanças climáticas por soluções justas, realistas e duradouras. 

Portanto, “adelante” exigirmos por justiça socioambiental. “Que Paguem!”

Para saber mais sobre a Campanha “Que Paguem” e assinar: aquí

Amyra El Khalili, Colaboradora com Diálogos do Sul. É professora de economia socioambiental. Foi economista com mais de duas décadas de experiência nos mercados futuros e de capitais. É editora das redes Movimento Mulheres pela P@Z! e da Aliança RECOs – Redes de Cooperação Comunitária Sem Fronteiras. É autora do e-book Commodities ambientais em missão de paz: novo modelo econômico para a América Latina e o Caribe.


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

Notas: 

(1) ENEDS – Encontro Nacional de Engenharia e Desenvolvimento Social. Depoimento de Amyra El Khalili, denunciando no ENEDS o que está por detrás da engenharia financeira do Mercado de Carbono e seus “derivativos”. Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). 17 de agosto de 2016.  Florianópolis, SC. EREDS-SUL. https://www.facebook.com/eredssul/videos/108703571377313

(2) TV Diálogos do Sul. LIVE com Amyra El Khalili e Paulo Cannabrava, editado por Vanessa Martina. A água começou a ser negociada como recurso (commodity) na bolsa de Nova York. Transmitido ao vivo em 10 de dezembro de 2020. https://www.youtube.com/watch?v=RHCN22Wy5B4


Fontes: 

BRITO, Gabriel. Entrevista com Amyra El Khalili: “Todos os instrumentos da economia verde obedecem à mesma lógica perversa da financeirização”. Jornal Correio da Cidadania. 08 de agosto de 2018.  https://www.correiocidadania.com.br/colunistas/amyra-el-khalili/13398-todos-os-instrumentos-da-economia-verde-obedecem-a-mesma-logica-perversa-da-financeirizacao

Cúpula de Líderes 2021. Washington, EUA. 22 e 23 de abril de 2021. Prensa Latina (https://www.prensalatina.com.br/);  Inter Press Service – IPS (http://www.ipsnoticias.net/); Campanha Que Paguem! (https://makebigpolluterspay.org/)

EL KHALILI, Amyra. O que se entende por “financeirização da natureza”? . Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). 31 de maio de 2016. https://mst.org.br/2016/05/31/o-que-se-entende-por-financeirizacao-da-natureza/

EL KHALILI, Amyra. Covid-19: Economia e Saúde são irmãs siamesas. Blog Combate ao Racismo Ambiental. 18 de abril de 2020. https://racismoambiental.net.br/2020/04/18/covid-19-economia-e-saude-sao-irmas-siamesas-por-amyra-el-khalili/


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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Amyra El Khalili Beduína palestino-brasileira da linhagem de Saladino e do Sheik Mohamed El Khalili. É editora das redes Movimento Mulheres pela P@Z!, e Aliança RECOs – Redes de Cooperação Comunitária Sem Fronteiras.

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