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Reação da Frente Ampla surpreende no Uruguai e votos vão para recontagem

Corte Eleitoral não confirma vitória de Lacalle Pou, que somou apenas 30 mil votos de vantagem para a aliança conservadora
Felipe Bianchi
ComunicaSul
São Paulo (SP)

Tradução:

Em apuração apertada neste domingo (24), a direita venceu por uma diferença estreita o escrutínio primário no Uruguai, dando um passo gigantesco para voltar ao poder após 15 anos de governo da Frente Ampla, coalizão de partidos de esquerda. Apesar dos números apontarem o triunfo de Luis Lacalle Pou, do Partido Nacional, o resultado obtido não é definitivo e, portanto, haverá recontagem dos votos. Com 99,41% das urnas apuradas, Luis Lacalle Pou tinha 48,74% contra 47,48% de Daniel Martinez – cerca de 30 mil votos de diferença. Os resultados oficiais serão divulgados pela Corte Eleitoral entre terça-feira (26) e sexta-feira (29).

Apesar de sair derrotada desta primeira apuração, a Frente Ampla obteve um resultado surpreendente em relação ao que apontavam as projeções dos institutos de pesquisa para este segundo turno. De acordo com os informes, previa-se uma diferença entre 5 a 10 pontos percentuais de vantagem para Lacalle Pou.

A campanha de Daniel Martínez, se não derrotou a vigorosa aliança da oposição com partidos que vão da direita moderada à extrema-direita, surtiu um importante efeito. Com o resultado acirrado, o campo progressista deu uma demonstração de força fundamental para garantir lastro social caso assuma o papel de oposição. Analistas dos meios de comunicação uruguaios classificaram como uma derrota com D minúsculo, se confirmado o resultado da apuração deste domingo.

Corte Eleitoral não confirma vitória de Lacalle Pou, que somou apenas 30 mil votos de vantagem para a aliança conservadora

Telesur
Os candidatos a presidência do Uruguai Daniel Martínez e Lacalle Pou

O fator Manini Ríos 

Além de milhares de uruguaios residentes no exterior que se deslocaram ao paisito para sufragar, já que o Uruguai não oferece a possibilidade do voto fora do país, um dos motivos para a “ressurreição” da Frente Ampla às vésperas do segundo turno foi a manifestação controversa de Guido Manini Ríos. Candidato à presidência no segundo turno e senador eleito pelo Cabildo Abierto, um partido fardado muito similar à “Aliança pelo Brasil”, dos bolsonaristas, Ríos, que apoiou oficialmente Lacalle Pou, disseminou um vídeo exortando ˜militares de todas as patentes” a votarem contra a esquerda.

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A figura de Ríos evoca fantasmas de um passado vivo na história do Uruguai e da América Latina, remetendo aos horrores e ao obscurantismo das sangrentas ditaduras militares. O senador e militar exonerado é alvo de denúncias já que, comandando um Tribunal de Honra Militar, responsável por julgar possíveis crimes cometidos durante a ditadura, teria ajudado a encobrir a confissão do militar aposentado José Nino Gavazzo.

Em seu depoimento, Gavazzo teria assumido a responsabilidade por descartar o corpo do militante tupamaro Roberto Gomensoro nas águas do rio Negro, em 1973. Manini, responsável por dar prosseguimento ao julgamento, teria encoberto Gavazzo, mesmo após a confissão.

Esquadrão da Morte

Além disso, um membro do Cabildo Abierto, Juan Cardoso, que integrou a lista de deputados do partido, causou espanto ao declarar que “buscam-se voluntários para montar um Esquadrão da Morte˜, pois seria preciso “limpar o país”. O mal-estar da declaração causou a sua expulsão do partido apenas uma semana antes do segundo turno.

Até mesmo Lacalle Pou, que aceitou o reforço do Cabildo Abierto em sua campanha, reprovou publicamente as manifestações de cunho fascista por parte de seus aliados. A avaliação é de que o tiro saiu pela culatra, ajudando a converter uma boa porção de votos para a Frente Ampla na reta final.

Daniel Martinez: “Tentaram nos enterrar, mas não sabiam que somos sementes”

Às 23h30, o candidato da Frente Ampla discursou à multidão de militantes e apoiadores em frente ao hotel de onde acompanhou a apuração, em Montevidéu. A sua mensagem foi enfática: há que esperar o resultado final, mas celebrar, desde já, o incrível resultado. “Tentaram nos enterrar, mas não sabiam que somos somentes˜, afirmou, em meio a cânticos de “milicos nunca más” (“militares nunca mais) por parte da multidão.

imagem: Captura de tela

“A diferença ainda não garante o resultado. Temos de esperar. O que, sim, está claro, e o que nos deixa esta eleição, é que não haverá força política que seja eleita com 50% dos votos. O que indica que temos a tarefa histórica de buscar os entendimentos e as construções que nos permitam pensar em um só país, em um só Uruguai, governando para o povo”, salienta.

“Queremos agradecer aos militantes de todos os dias, de todas as horas e todos os anos, que fazem ser possível esta força política viva ter dinamismo. Agradecemos, também, dezenas de milhares de homens e mulheres que, independente de militar ou não, nos ajudaram com seu voto e a sair pela pátria, batendo nas portas, semeando nossas ideias, verdadeiros militantes desconhecidos”, complementou. “Aqui há um povo que diz: ‘Estamos presentes. Não queremos ser passivos na historia de nossa pátria, queremos ser protagonistas. Vamos esperar a recontagem com serenidade, evitando provocações. Somos defensores da paz. Queremos um Uruguai onde todos nos escutemos e respeitemos. Por ora, podemos comemorar o que fizemos”.

Lacalle Pou: “Formalmente, saberemos os resultados apenas dentro de alguns dias” 

À esquerda e de jaqueta bege, Guido Manini Ríos acompanha Lacalle Pou no palco. Imagem: Captura de tela 

Por sua vez, Lacalle Pou subiu ao palco para falar aos seus seguidores uma hora depois de seu oponente. O candidato do Partido Nacional contou com a companhia de presidenciáveis derrotados no primeiro turno, que formaram uma aliança conservadora de oposição, entre eles Ernesto Talvi, do Partido Colorado, e Guido Manini Ríos, do Cabildo Abierto. “Há várias formas de se aceitar um resultado. Formalmente, saberemos apenas dentro de alguns dias. Lamentavelmente, nosso adversário não nos reconheceu a vitória, que para nós é irreversível. O principal é que metade do Uruguai votou em um candidato e a metade, mais um pouquinho, votou em outro”. 

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As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Felipe Bianchi É jornalista e atua no Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé desde 2011. Também integra o coletivo ComunicaSul e faz parte do Fórum de Comunicação para a Integração de Nossa América (FCINA).

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