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ToggleEm 10 de dezembro passado, o vistoso presidente Javier Milei prometia estritas reformas ultraliberais para consolidar um novo modelo de país. Nos seis meses após a posse de La Libertad Avanza à frente do Executivo nacional, o mandatário nacional fez um violento uso de sua “motosserra” para conseguir o ajuste fiscal “maior da história da humanidade“, meta de seu cruel plano econômico, que mais do que afetar a “casta”, prejudicou a “gente de bem” que dizia proteger.
No entanto, nos últimos 183 dias, o Governo enfrentou várias contradições e situações que o obrigaram a retroceder. Quantas vezes retrocedeu a gestão ultraliberal desde que assumiu? Confira.
Proibição de reuniões de “três ou mais pessoas” em espaço público
As modificações da Lei Bases — depois da fracassada lei ônibus — são um claro exemplo dos retrocessos que teve que enfrentar o Governo nacional. Aquele megaprojeto original apresentado em dezembro, de 351 páginas e mais de 664 artigos, recebeu vários cortes em 2024, em função de questionamentos e negociações fracassadas com diferentes atores do poder.
Enquanto isso, um dos artigos excluídos mais lembrados é o 131, vinculado à criminalização das manifestações. A ministra de Segurança, Patricia Bullrich, teve que esclarecer em determinado momento que foi uma “má interpretação”, já que a norma propunha castigar as “reuniões” intencionais e temporárias” de três ou mais pessoas em espaço público“.
Em maio, a Câmara de Deputados aprovou, de forma geral e particular, o novo projeto oficialista reduzido e seu pacote fiscal.
Confira outras vitórias do povo argentino.
Aumentos de salários de Milei e outros cargos hierárquicos
Depois da enfática polêmica desencadeada em torno dos aumentos por decreto de até 48% nos salários do primeiro mandatário, da vice-presidente e dos membros do Gabinete, em março foi publicado no Diário Oficial outro decreto, o 235/2024, que derrogou “o artigo 4° do Decreto N° 206 de 28 de fevereiro de 2024” que autorizou os aumentos, ficando estabelecido que os salários retroajam aos valores de 2023.
Acontece que o Governo, que prega constantemente contra a “casta”, ficou em uma posição incômoda e teve que dar marcha a ré.
Convênios: desregulamentação, controles e nova liberação
A desregulamentação dos convênios e de outros serviços essenciais desde dezembro, somada à disparada de preços e à inflação, geraram um descalabro na economia dos setores médios e baixos.
Em consequência, quatro meses mais tarde, o ministro de Economia, Luis Caputo, mostrou sinais de um claro aborrecimento com as prestadoras de medicina privada, que ajustaram seus preços muita acima da inflação, e exigiu que retroagissem os custos aos valores de dezembro.
Naquele momento, o Governo apresentou o recurso judicial por meio da Superintendência de Serviços de Saúde (SSS) assegurando que “a ação dos convênios é um comportamento que evidencia um abuso contra os argentinos de bem”. Neste sentido, ressaltou que as empresas, “valendo-se de sua posição dominante, aumentaram as cotas acima de 70% do índice de inflação durante os últimos quatro meses”.
Não obstante, no final de maio, depois de várias idas e vindas, as empresas de medicina pré-paga tiveram que devolver, por meio de um plano de pagamentos de 12 cotas seguidas, uma parte do dinheiro cobrado acima da inflação a seus filiados entre janeiro e maio deste ano. A devolução se realizará a partir de julho, e também a partir desse mês, as cotas voltarão a ser fixadas “livremente”.
Privatização da YPF e do Banco Nação
Em abril, para fazer prosperar a lei ônibus no Congresso durante o debate em comissão, uma das questões em que teve que ceder o Governo de Milei foi a retirada do Banco Nação da lista de empresas públicas que podem ser privatizadas (nesse caso, em 49% das ações).
Mas a Administração libertária não se deu por vencida. Pouco depois, o então ministro do Interior (e agora chefe de Gabinete), Guillermo Francos, assegurou que insistirão nesta intenção mais adiante, e até adiantou que pensam em aplicar o “modelo Lula”, referindo-se ao presidente brasileiro, Luis Inácio “Lula” da Silva, que habilitou em 2010 o Banco do Brasil a cotizar na Bolsa de Nova York.
Do mesmo modo, houve uma proposta de privatizar a YPF incluída na primeira versão da lei ônibus que depois foi excluída para avançar no tratamento da Lei Bases no Congresso. Não obstante, em abril, na votação capítulo por capítulo, os deputados aprovaram um punhado de privatizações: a das Aerolíneas Argentinas SA, Energía Argentina SA, Radio y Televisión Argentina SE, e Intercargo SAU. Além disso, aprovaram a venda parcial de duas firmas mais que relevantes em setores chave da economia argentina, como a Nucleoeléctrica Argentina SA e Yacimientos Carboníferos de Río Turbio. Finalmente, o projeto aprovado na Câmara baixa estabelece uma série de empresas a serem dadas em concessão a firmas privadas: Agua y Saneamientos Argentinos SA (AySA), Correo Oficial de la República Argentina SA, Belgrano Cargas y Logística SA, Sociedad Operadora Ferroviaria SE (SOFSE), y Corredores Viales SA.
Corte orçamentário para as universidades
Depois da massiva mobilização da comunidade universitária de 23 de abril passado contra o ajuste orçamentário para as casas de altos estudos de todo o país, o Governo se viu na obrigação de remontar sua imagem negativa e realizar algumas mudanças em seu programa econômico.
Deste modo, as universidades conseguiram um aumento de 270% para gastos de funcionamento. No entanto, este aumento só representa 5 por cento do orçamento administrado pelas 60 casas de estudo no país. Por isto, na semana passada foram realizadas greves sem assistência aos locais de trabalho em todas as instituições de educação superior da Argentina.
Aumento dos trâmites do serviço do Registro Automotor
Uma das tantas promessas de Milei era terminar com os “currais“ dos registros automotores do país. No entanto, no começo de abril, o Governo aprovou mediante uma Resolução publicada no Diário Oficial um aumento de até 320 por cento nos trâmites que se realizam nesta dependência.
Mas poucos dias mais tarde, depois do escândalo gerado pela medida, o ministro da Justiça, Mariano Cúneo Libarona, anunciou que “depois de reavaliar a situação”, o Governo deixava sem efeito as duas resoluções que tinham sido publicadas, suspendendo o aumento.
A primeira resolução permitia um novo aumento dos formulários cobrados para os Registros de Propriedade Automotiva por cada transferência que se realiza na compra de um veículo novo ou usado. A outra resolução outorgava aumentos dos salários que recebem os encarregados dos registros, congelados desde outubro do ano passado.
Serviço de guindastes e assistência mecânica
Depois da onda de repercussões negativas e de uma ação coletiva iniciada pelos consumidores apresentada à Superintendência de Seguros da Nação (SSN), o Governo oficializou em 11 de junho a derrogação da medida que desde julho de 2023 liberava as companhias de seguros de fornecer os serviços de guindastes ou reboques e assistência mecânica em todo o país.
Dias atrás, o porta-voz presidencial, Manuel Adorni, defendera a decisão do Governo e assegurara que a medida seria aplicada tal como fora planejado, apesar das reclamações apresentados por consumidores, que incluíram uma ação coletiva da Associação de Consumidores e Usuários da Argentina (ACUDA).
Apresentação de Milei na Feira do Livro
Durante abril e maio aconteceu a última Feira Internacional do Livro. O contexto da organização foi um dos mais preocupantes dos últimos tempos. O presidente da Fundação O Livro, Alejandro Vaccaro, manifestou-se enfaticamente naquele momento contra a gestão ultradireitista, criticando duramente a participação do mesmíssimo Milei, que apresentaria seu livro Capitalismo, socialismo e a armadilha neoclássica (carregado de plágios) em um dos salões da Rural.
Em função do repúdio que geraria a presença do mandatário nacional na Feira, organizou-se uma mudança de lugar: apresentou sua obra no estádio portenho Luna Park com um show musical e a presença de distintas figuras.
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