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A luta pelo direito ao aborto em El Salvador, onde prática é ilegal até em casos de estupro

Manuela Martins

Tradução:

O presidente salvadorenho, Salvador Sánchez Cerén, dirigente da Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FFML) está aberto para transformações na rígida lei do aborto de seu país. É o que diz Jeremy Barth, ativista da Anistia Internacional.

“O presidente do país afirmou-se aberto para modificar as leis do aborto, no entanto, houve uma falta de compreensão da legislação”, diz Barth. Ele ressalta ainda a dificuldade de a legislação ser aprovada já que “uma maioria conservadora está tomando o poder”.

No governo desde 2014, Sánchez propôs uma reforma para permitir o aborto nos casos em que a vida da mãe está em risco ou que a gravidez é o fruto de um estupro, mas o projeto não prosperou no Congresso. A esperança dos apoiadores da medida era que a medida fosse votada até maio, antes da posse dos novos deputados que têm composição mais conservadora do que os anteriores.

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Marcha pelo direito ao aborto na Argentina | Foto: Wikicommons

“Esforços para rever as leis, não surpreendentemente, enfrentam forte resistência dessas organizações [autointituladas pró-vida], algumas das quais querem tornar as leis ainda mais duras: ao invés de 30 anos de prisão, passaria para 50, por exemplo”, destaca Barth. 

Legislação restritiva

 O aborto é totalmente criminalizado em El Salvador. A prática é considerada crime até em casos de estupro, de fetos deformados ou quando a saúde da mãe está em risco.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2008, 9% das mortes maternas na América Central foram relacionadas a procedimentos de aborto clandestino. Ainda sobre estimativas, de acordo com a organização Agrupación Ciudadana por la Despenalización del Aborto de El Salvador, 129 mulheres foram processadas por crimes relacionados ao aborto no país entre 2000 e 2011. Entre elas, 23 foram condenadas por terem feito um aborto ilegal e 26, por homicídio.

 Caso Teodora

Um dos motivos apontados por ativistas para que as leis do aborto sejam tão rígidas no país é o fato de a Igreja Católica ser muito forte.

Grupos ligados à Anistia Internacional foram precursores na denúncia do caso de Teodora Del Carmén Vasquez, uma salvadorenha que cumpriu 10 anos de prisão por ter sofrido um aborto espontâneo após ter sido estuprada. Ela foi condenada a 30 anos de detenção por “homicídio agravado”.

“Quanto a Teodora e outras mulheres detidas, a Assembleia Legislativa não teve nada a ver com sua libertação — sua sentença foi comutada, mas seu ‘crime’ não foi anulado pela Suprema Corte salvadorenha”, realça Barth.

Ainda há muitas mulheres cumprindo longas penas por aborto espontâneo. Recentemente, uma mulher, que não teve seu nome revelado, foi liberada após cumprir 15 anos de prisão. Sem muitas ONG’s que lutem pelos direitos das mulheres no país, as que discutem a situação são a Las17 e a CiudadMujer, criada pela brasileira Vanda Pignato.

Segundo a jornalista salvadorenha Evelyn Machuca do jornal La Prensa Gráfica, que cobriu o caso de Teodora, as organizações feministas são pequenas, de esquerda e lutam para o aborto ser permitido em quatro situações: quando a vida e a saúde da mulher correm perigo; quando a gravidez é fruto de uma violação sexual ou tráfico de pessoas; em casos de má formação do feto e em casos de pedofilia.

 Jornalista salvadorenha Evelyn Machuca, do jornal La Prensa Gráfica | Foto: Arquivo pessoal

Por outro lado, o grupo autodenominado pró-vida é mais poderoso, totalmente conservador e de direita e condena qualquer mãe que ouse pensar em interromper a gestação.

De acordo com a jornalista, os grupos pró-vida exibem cenas de vídeo descontextualizadas de fetos sendo extraídos do útero de mulheres para uma massa desinformada. Para ela, há uma ignorância na sociedade, já que até a educação sexual nas escolas é um tabu.

Estes grupos pró-vida, abrigados pela Igreja Católica, criticam e condenam qualquer tipo de educação sexual que inclua, até mesmo, o uso de métodos contraceptivos. 

Direito das mulheres  

“Vários anos atrás, o Ministério da Educação desenvolveu guias de educação sexual, cuja distribuição foi retardada por esses grupos. Portanto, El Salvador também não possui uma lei abrangente de educação sexual, mas é urgente”, ressalta.

El Salvador tem um amplo histórico de violação de direitos humanos. Nos anos 1980, durante a ditadura vigente no país, os salvadorenhos vivenciaram uma das mais cruentas violências contra as mulheres. Na época, um soldado chegou a arrancar as vísceras de uma grávida “colaboradora dos comunistas” em praça pública, tirando-lhe o feto e lançando-o ao alto.

Apesar do cenário negativo, Machuca considera que, “relacionando o papel que a Anistia desempenhou no caso de Teodora, há um precedente para que outras mulheres busquem ajuda”.

* Produzido para a revista Diálogos do Sul em parceria por alunos da U. P. Mackenzie.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.
Manuela Martins

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