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ToggleA tragédia que abala o Rio Grande do Sul tem que servir de alerta. É preciso uma estratégia de desenvolvimento integrado, com seus planos setoriais, para reconstruir as cidades. São 401 dos 497 municípios em estado de calamidade pública. É quase a totalidade e pode piorar. Na reconstrução não se pode incorrer nos mesmos erros.
Os mortos já somam 151 e são 104 os desaparecidos. 85% da população sem água, 25% sem eletricidade. Catástrofe climática, tragédia humana. A água baixa, fica a lama e as doenças: diarreia, tifo, leptospirose e, com a onda de frio, as doenças respiratórias.
Um terço da cidade de Porto Alegre, com 1,5 milhão de habitantes, inundada, inclusive o Aeroporto Salgado Filho está inoperante por estar coberto de água. Há 10 mil pessoas recolhidas em 100 abrigos. 42 estradas danificadas. A Câmara de Deputados decretou calamidade pública no Rio Grande do Sul.
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Sistema de comportas e bombeamento, feito para controlar as enchentes, colapsou por falta de manutenção. Sem isso a água fica lá, parada. O governo de São Paulo mandou algumas bombas da Sabesp para ajudar no escoamento da água, mas é pouco, adianta quase nada.
A Lagoa dos Patos subiu três metros, a enchente atingindo Canoas, Guaíba, Porto Alegre e São Leopoldo. Em Canoas, 70 mil casas submersas. Vão construir cidades provisórias para abrigar os milhares de desabrigados.
Linha de produção das montadoras de automóveis começa a parar no Sudeste por falta de peças que são produzidas por fábricas em território gaúcho. O turismo e o enoturismo paralisado começa a influir na economia nacional como um todo.
Crianças sem os pais, pais sem as crianças, compõem o drama humano em meio a catástrofe ambiental. 300 mil alunos sem suas escolas, 400 delas danificadas pelas enchentes.
Essa situação tem que ser vista como uma lição para os negacionistas e nas áreas urbanas para a indústria imobiliária controlada pelas grandes empresas, assim como os administradores que abandonaram o planejamento urbano.
Outra lição é que só o Estado tem condições de enfrentar e dar solução para o drama humano e o caos urbano. Capitalismo, neoliberalismo, matam mais que qualquer pandemia.
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O neoliberalismo abandonou as empresas públicas e deu no que deu. Sucateada, a Emae, empresa de águas e energia, em 2007 tinha 2.493 servidores, agora conta em torno de 1.050. Impossível atender a demanda.
Impressiona a solidariedade do povo gaúcho. Pessoas que foram salvas trabalham como voluntários nas diferentes frentes em atuação. Não existe desastre de esquerda nem de direita, por isso a unidade. Unidade é fundamental para encontrar soluções, atender as emergências.
O Congresso liberou R$ 800 milhões em Emendas Pix, aquela que não precisa prestar contas. Em contrapartida, aprovou R$ 4.9 bilhões para o fundo eleitoral, para gastar na campanha para eleições municipais, para eleger vereadores e prefeitos. Metade disso seria um grande alívio para os gaúchos.
Quem é que vai dizer agora que o aquecimento global nada tem a ver com isso, ao que se agrega a ocupação predatória do território? As matas ciliares deveriam ocupar no mínimo 30 metros de cada margem dos rios. Quase ninguém obedece isso, inclusive áreas urbanas onde deveria haver espaço para as águas.
As autoridades alertam que não é hora de voltar para casa. Imagina o desespero dessa gente que teve a casa invadida pelas águas até o telhado, perderam tudo, é um recomeçar dramático. É chocante. No meio dessa desgraceira, há oportunistas difundindo mentiras alarmistas e ladrões a assaltar as casas a roubar eletrodomésticos e outros bens.
A Força Nacional deslocou um contingente de 100 homens para colaborar no policiamento. A Marinha mandou seu maior barco, um porta-aviões com suprimento, e a Força Aérea está igualmente levando material que está sendo doado em todos os rincões do país.
No Legislativo: projetos bombas
Os ambientalistas apontam também os legislativos, nos três níveis, municipal, estadual e federal, como responsáveis por aprovarem pautas de flexibilização do controle ambiental. Não é um fenômeno natural e os legisladores insistem em negar, seguem com a ideia de “passar a boiada”.
E exercem a ditadura da maioria. Somente a Frente Agropecuária conta com 26 bancadas e 300 deputados e 44 senadores. Atuam não só com as pautas próprias como no desmonte das políticas ambientais.
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Apelidado de Novo Pacote da Destruição, 25 projetos de lei e três propostas de emenda à Constituição tramitam no Legislativo alheio à catástrofe ambiental. Segundo o Observatório do Clima, “causarão danos irreversíveis aos ecossistemas brasileiros, povos tradicionais, ao clima global e à segurança de cada cidadão”.
Um desses projetos, relatado pelo senador Márcio Bittar, do União Brasil, reduz de 80% para 50% as áreas de reserva legal no Amazonas; outro elimina a proteção aos campos nativos, como os pampas gaúchos, por exemplo.
O Novo Pacote da Destruição deixa desprotegida área de 48 milhões de hectares, equivalente às extensões somadas dos estados do Rio Grande do Sul e do Paraná.
População rechaça o negativismo
Ao contrário do legislativo, a população rechaça os negativistas. Segundo pesquisa da Genial/Quaest, quase 70% (68%), dos brasileiros aponta o governador Eduardo Leite (PSDB) como culpado pela catástrofe climática que mergulhou o Rio Grande do Sul no caos ambiental e drama humano. Aparece também como responsável (64%) a prefeitura de Porto Alegre, e o governo federal (59%). A população começa a entender que o aquecimento global não é natural, é produto da ação predadora dos humanos e poderia ser evitado com medidas apropriadas.
O único ser vivo que destrói seu próprio habitat.
E não existem soluções de curto prazo. A solução começa com comunicação e educação, que cada criança venha a cobrar dos pais um comportamento de respeito à natureza, e que em cada município se faça o planejamento urbano sustentável.
Amazônia em chamas
As queimadas na Amazônia aumentaram 154% em relação ao mesmo período de 2023. Em todo o país, o aumento foi de 81%. Parte desse desastre é consequência do El Niño, que provocou seca em grande parte do território. Não obstante, parte substancial é consequência do desmate e da mineração ilegal e não menos culpa da expansão predatória da fronteira agrícola.
No Cerrado o desmatamento aumentou em 43%, enquanto 9 mil km² foram desmatados na Amazônia, longe das promessas de Lula de desmatamento zero.
Guerra dos EUA
Não há como negar que a guerra que se trava na Palestina é uma guerra dos Estados Unidos terceirizada para os sionistas de Israel. Preocupado com a repercussão em seu território, o presidente Biden, em plena campanha para se reeleger, ameaça Israel com cortar o fornecimento de armas e munições. Se realmente o fizesse, acabaria a guerra.
Com intuito de obrigar Israel a não invadir Rafah, que já vem sendo sistematicamente bombardeada, Biden reteve envio de 1,8 mil bombas MK 82 de 907 kg, 1,7 mil bombas de 227 kg, e anunciam que analisam a possibilidade de suspender outras transferências, inclusive kits de orientação teleguiada para bombas não errarem o alvo.
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Entrementes, o Departamento de Estado autorizou a transferência para Israel de 25 jatos de combate e motores para os caças F-35 A.
Comemorando 79 anos da vitória sobre os nazistas alemães, no que os russos chamam de “Guerra Mãe”, Vladimir Putin anunciou que a Rússia está pronta para a guerra mundial. É o que quer a Otan, segundo explicitado pelos dirigentes da hoje Europa ocupada. Ocupada pelos Estados Unidos.
Paulo Cannabrava Filho é autor de uma vintena de livros em vários idiomas, destacamos as seguintes produções:
• A Nova Roma – Como os Estados Unidos se transformam numa Washington Imperial através da exploração da fé religiosa – Appris Editora
• Resistência e Anistia – A História contada por seus protagonistas – Alameda Editorial
• Governabilidade Impossível – Reflexões sobre a partidocracia brasileira – Alameda Editora
• No Olho do Furacão, América Latina nos anos 1960-70 – Cortez Editora