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Foto: Logan Abassi - ONU / Flickr

Instabilidade no Haiti faz crescer violência sexual, que atinge 300 mil mulheres e meninas

Segundo a ONU, violência sexual no Haiti é usada como tática para controlar o acesso de mulheres e meninas deslocadas a ajuda humanitária
Redação IPS
IPS
Nova York

Tradução:

Ana Corbisier

A instabilidade está alimentando o crescimento da violência sexual no Haiti e afeta em particular 300 mil mulheres e meninas deslocadas de suas casas e sem acesso a serviços básicos de segurança e saúde, afirmou, em 17 de julho, um novo informe da agência ONU Mulheres.

Sima Bahous, diretora-executiva da entidade, disse em um comunicado que “segundo nosso informe, não tem precedentes o nível de insegurança e brutalidade, inclusive a violência sexual, que enfrentam as mulheres nas mãos das gangues no Haiti”.

“É preciso deter isso imediatamente”, afirmou.

As mulheres e as meninas representam mais da metade das 580 mil pessoas deslocadas no Haiti buscando fugir da violência, protagonizada por gangues criminosas que controlam grande parte de Porto Príncipe, de áreas ao sul desta capital e do departamento de Artibonite, a noroeste.

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A pesquisa da ONU Mulheres mostra que os acampamentos improvisados com pessoas deslocadas carecem de serviços para atender as necessidades básicas da população, e que as mulheres e as meninas em particular estão expostas a riscos de violência sexual e de gênero.

Segundo a agência, na maioria dos campos se perpetram ataques contra mulheres e meninas e, mais concretamente, violações, como tática deliberada para controlar o acesso das mulheres a uma ajuda humanitária muito limitada.

Uma pesquisa da ONU mulheres revelou que mais de 88% das entrevistadas não têm nenhuma fonte de renda nos acampamentos.

Como resultado, mais de 10% delas teve que recorrer à prostituição pelo menos uma vez ou pensou em fazê-lo para satisfazer suas necessidades de subsistência, e outras 20% conheciam pelo menos uma pessoa que tinha se prostituído.

Cerca de 16% das mulheres entrevistadas disseram que se sentiam intimidadas, assediadas ou traumatizadas por gangues armadas violentas, e quase 70% disseram que estavam mentalmente abaladas pela escalada de violência.

Só 10% das entrevistadas informaram ter acesso a serviços de saúde nos campos de deslocados internos.

Entre as mulheres entrevistadas, só 2% indicou ter assumido um papel de liderança na gestão dos locais para deslocados internos.

Portanto, segundo a entidade da ONU, existe uma necessidade urgente de garantir a participação ativa das mulheres e das meninas na tomada de decisões nos acampamentos, e de implementar nos lugares medidas de proteção imediata para mulheres e meninas que correm risco todos os dias.

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A pesquisa, realizada nos seis locais de deslocados internos mais povoados e diversos da capital, mostra que a maioria dos acampamentos não tem iluminação. Os espaços essenciais, como dormitórios e banheiros, não dispõem de fechaduras.

Nessas condições, as pessoas que vivem ali “sofrem ameaças diárias por parte de gangues armadas. A exposição constante a balas perdidas e outros riscos para a segurança mostra a urgência de melhorar a proteção nos campos”, indicou o informe da ONU Mulheres.

Violência tira vidas e paralisa Haiti

A ação das gangues contra a população não se interrompeu e em 15 de julho, por exemplo, morreram quatro pessoas e 11 ficaram feridas em um tiroteio, quando habitantes de uma comunidade de Artibonite apoiaram a polícia para evitar que um grupo atacante capturasse um posto policial.

Segundo dados da ONU, no ano passado, 4.450 pessoas morreram devido à violência no Haiti e 1.668 ficaram feridas. Nos três primeiros meses de 2024, outras 1.500 pessoas foram assassinadas ou lesionadas pela mesma razão.

Para apoiar a sobrecarregada polícia haitiana – 10 mil efetivos em um país de 28 mil quilômetros quadrados e 11,5 milhões de habitantes – as Nações Unidas deram luz verde ao envio de uma Missão Multinacional de Apoio à Segurança, que deve contar com até 2.500 efetivos.

Os primeiros 400 já chegaram a Porto Príncipe, em dois contingentes policiais do Quênia, país que aceitou liderar a missão, contribuindo com mil efetivos. Depois, se somarão uniformizados de outros países africanos, do Caribe de fala inglesa e de Bangladesh.

O governo provisório do primeiro-ministro Gary Conille deu as boas-vindas à missão internacional, em busca de derrotar as gangues, e junto com agências da ONU continua solicitando ajuda humanitária para seu país.

A violência paralisou o setor agrícola, fonte chave de renda para as famílias, e interrompeu a educação e a atenção sanitária. Mais de 900 escolas fecharam desde janeiro, e 40% dos centros de saúde estão fora de serviço.

As agências da ONU calculam que 4,5 milhões de pessoas no Haiti necessitam de ajuda alimentar urgente.

Existe um plano de assistência humanitária de emergência para 2024, mas dos 674 milhões de dólares necessários para implementá-lo só se obteve uma quarta parte.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Redação IPS

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