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Foto: Bernard Gotfryd / Wikimedia Commons

Fidel renasce a cada dia e ilumina o caminho de libertação dos povos

É esta revolução da cultura, que inquieta o poder hegemônico, um dos maiores legados de Fidel, que alenta a imaginação criativa de nossos povos
Stella Calloni
Capac - Club Argentino de Periodistas Amigos de Cuba
Buenos Aires

Tradução:

Beatriz Cannabrava

O Comandante Fidel Castro Ruz nasceu em Cuba há 98 anos e já não está fisicamente entre nós desde novembro de 2016, mas segue nascendo e renascendo nos que resistem e lutam em todas as frentes de batalhas nestes tempos quando estamos vivendo um processo de enormes mudanças e grandes ameaças. 

É o caso de ressurreição e do eterno valor de seu legado em nossa marcha para um futuro de dignidade para a humanidade. Cuca nos demonstra o que significa este legado que abre e ilumina os caminhos da libertação para os povos do mundo.

É um período histórico em que se joga o destino, o futuro e a possibilidade ou não da sobrevivência da humanidade, e a decisão do governo e do povo de Cuba, em um de seus mais difíceis momentos, foi comemorar o aniversário do nascimento do líder da Revolução Cubana em Birán, Holguín, em 13 de agosto de 1926, com eventos culturais que mostraram ao mundo a resistência de uma cultura viva, desafiante, diante dos obscuros labirintos do colonialismo que tenta regressar a Nossa América. 

É esta revolução da cultura o que inquieta o poder hegemônico, e é um dos maiores legados de Fidel, que alenta a imaginação criativa de nossos povos, capaz de despertar sociedades zumbificadas, vítimas do projeto de dominação e do colonialismo cultural de que continuamos sendo vítimas em nossa região, graças à dependência, que continua neste século 21.

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Uma dependência que já não basta às necessidades imperiais ante a nova realidade de um mundo em mudança acelerada, enfrentando os Estados Unidos e seus associados a potências como a China, a Federação Russa e uma quantidades de países onde vive 60% da população mundial em enormes e ricos territórios. 

O poder hegemônico, cada vez mais desgastado, avança violentando tudo ao seu passo porque necessita assegurar o controle dos países da América Latina e do Caribe e move suas cartas de poder para nos silenciar, nos confundir, acelerar a dominação colonial de nossos territórios. Através de toda sua história colonial nos consideraram seu “quintal”. 

Destruir nossa cultura, nossa identidade, é um passo indispensável. Apagar nosso passado de resistência à expansão imperial é nos roubar o futuro como países independentes e livres por fim. O povo cubano nos mostrou também o caminho, ameaçado como nunca, celebrando a vida sob os terrorismos do poder hegemônico.   

O submetimento só se pode lograr se nos afundam na pobreza, na fome, na ignorância, se nos apagam identidades e culturas, para o que necessitam destruir todo governo que legisle e atue em favor do povo, que resgate as glórias do passado e do presente para armar um futuro de paz e de justiça. 

Para isso há que arrancar pela raiz a ignorância e tudo o que ata as mãos dos povos e lograr que o ser humano recupere sua humanidade, entendendo esta como dignidade. Faz-se muito difícil agora quando só lograr a sobrevivência parece um sonho inalcançável, mas não impossível. Já não nos dominam com espelhinhos coloridos, necessitam ferramentas de novas e sofisticadas tecnologias, que eles manejam e que mudam o eixo de nossas sociedades. 

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Lograram, com o controle dos meios de comunicação de massa — entre eles as redes sociais, que utilizam de forma massiva como uma arma muito bem lubrificada —, paralisar os setores de nossas sociedades. Os donos dessas novas tecnologias se converteram nos grandes magnatas só comparáveis com os fabricantes de armas de uma inimaginável sofisticação. 

Nestes momentos, nos falta como nunca o comandante Fidel Castro, embora sua visão de tão longo alcance nos permita, como um poderoso refúgio, acudir a seu pensamento que cavalga pelo mundo, seus discursos, escritos e sua voz que se adiantam a todos os tempos. 

Estamos ante a possibilidade de uma guerra com o uso de armas nucleares. Há muitos anos já o advertia Fidel (em 2007). “Hoje o mundo conta com dezenas de milhares de bombas nucleares, 50 vezes mais poderosas, com portadores várias vezes mais velozes que o som e uma precisão absoluta, com as quais nossa sofisticada espécie pode se autodestruir”. Isso é algo queo líder cubano levava anos denunciando.        

O mesmo fazia quando abordava o tema do aquecimento global, advertindo “como a terrível espada de Dâmocles que pende sobre a vida da espécie”, o que não era conhecida “pela imensa maioria dos habitantes do planeta e, ainda hoje existe grande ignorância e confusão sobre estes temas”.  Se escutamos os porta-vozes das transnacionais e seu aparelho de divulgação, “vivemos no melhor dos mundos” escreveu Fidel com ironia, e analisou o que nos vendia e vende a publicidade do império com toda essa linguagem da sedução colonizadora destinada a confundir, já que a população não pode aceder a outras vozes silenciadas pela ditadura midiática. 

O poder dos meios de comunicação, das redes sociais, dos aparelhos transmissores que invadem cada rincão de nossos povos, estão sob o mundo de generais midiáticos, com um grande poder de fogo, que misturam com o poder militar, aterrorizando, corrompendo e confundindo. 

Isso advertiu Fidel e o escutamos com essa paixão em sua voz, com a precisão de sua linguagem e a convicção com que nos mostrou e nos mostra a outra cara de um mundo, agora invisível e incerto, e nos mostrou o rumo para “outro mundo possível” e necessário para salvar a humanidade. 

Não houve um só período histórico em que Fidel Castro perdesse a visão estratégica, a advertência necessária, e se nós não tivéssemos perdido a possibilidade mais importante que tivemos — que foi o acontecido ao começar o século 21, quando havíamos logrado superar diferenças, diversidades, assimetrias para começar outro caminho de unidade em novembro de 2011, quando em Caracas, Venezuela, se pôs em marcha a Comunidade de Nações Sul-Americanas e Caribenhas (CELAC) — estaríamos hoje em outra situação. 

A unidade de então alertou aos Estados Unidos em seu projeto geoestratégico atual de recolonização da América Latina e do Caribe neste século. Uma unidade que era o sonho eterno e tantas vezes solitário de Fidel que se reavivou ao encontrar-se com o líder venezuelano Hugo Chávez, amparados pelas sombras de José Martí e de Simón Bolívar e de todos os heróis de cada país em Nossa América. Ainda restam rescaldos desse fogo, que há que se recuperar.  

 Carta de Fidel à UNCTAD

Ante todo isto resulta muito esclarecedora a carta enviada por Fidel à 11ª conferência das Nações Unidos sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) em 13 de junho de 2002, destacando as esperanças surgidas pela criação deste organismo da ONU, e advertia com cifras e precisões que era “quase impossível medir o prejuízo ocasionado” a nossos países pelo tipo de relações comerciais que, através das sendas sinuosas da OMC e os tratados de livre comércio, se impõem aos países pobres” incapazes de competir com a tecnologia sofisticada, o monopólio quase total de propriedade intelectual e os imensos recursos financeiros dos países ricos. Descrevia os labirintos do saque, da exploração, o roubo ou a mais brutal transferência de recursos financeiros dos países pobres aos países ricos. 

Mas também advertia que “o sistema imperialista que hoje impera, para o que inevitavelmente foi evoluindo a sociedade capitalista desenvolvida, chegou já a uma ordem econômica global e neoliberal tão desapiedadamente irracional e injusto, que é insustentável. Contra ele os povos se rebelarão. Já começaram a rebelar-se”.

Considerou que “são estúpidos os que afirmam que este é fruto de partidos, ideologias ou agentes subversivos e desestabilizadores de Cuba e Venezuela. Entre outras coisas esta evolução trouxe consigo, de forma igualmente inevitável dentro das bases e normas que regem o sistema imperante, as chamadas sociedades de consumo (…) Com elas, suas tendências desperdiçadoras e irresponsáveis envenenaram as mentes de grande número de pessoas no mundo, as quais em meio a uma ignorância política e econômica generalizada, são manipuladas pela publicidade comercial e política através dos fabulosos meios massivos que a ciência criou”. 

Referiu-se então ao 60º (agora 80º) aniversário do dia em que explodiu sobre Hiroshima a primeiro bomba nuclear, destacando que “hoje (2004) no mundo existem dezenas de milhares dessas armas, que são dezenas de vezes mais poderosas e precisas (…) que continuam produzindo e aperfeiçoando. Até no espaço são programadas bases de projéteis nucleares. Surgem novos sistemas de mortíferos e sofisticados armamentos. Pela primeira vez na história o homem teria criado a capacidade técnica para sua total autodestruição (…) inclusive se aplicam teorias relativas ao uso preventivo e de surpresa das armas mais sofisticadas para aplicar em qualquer escuro rincão do mundo que fazem empalidecer a barbárie proclamada nos dias tenebrosos do nazismo”. 

“Temos sido já testemunhas de guerras de conquista e sádicos métodos de tortura que recordam as imagens divulgadas nos dias finais da Segunda Guerra Mundial. O prestígio das Nações Unidas está sendo socavado até os alicerces. Longe de aperfeiçoar-se e democratizar-se, a instituição foi ficando como um instrumento que a superpotência e seus aliados pretendem usar unicamente para coonestar aventuras bélicas e crimes espantosos contra os direitos mais sagrados dos povos”, afirma.

“Não se trata de fantasias nem produtos da imaginação. É muito real o fato de que, em apenas meio século, surgiram dois grandes e mortais perigos para a própria sobrevivência da espécie: o que emana do desenvolvimento tecnológico das armas, e o que vem da destruição sistemática e acelerada das condições naturais para a vida no planeta”. 

Refere-se também a que, diante à disjuntiva a que foi levada a sociedade, “não há outra alternativa para a humanidade: ou muda-se a situação atual mundial, ou a espécie corre o risco real de extinção (…) não existem métodos repressivos, torturas, desaparecimentos, nem assassinatos em massa que possam impedi-lo. E na luta pela sobrevivência, a de seus filhos e os filhos dos seus filhos, estarão não só os famintos do Terceiro Mundo; estarão igualmente todas as pessoas conscientes do mundo rico, sejam trabalhadores manuais ou intelectuais”, e sustenta que os povos serão ingovernáveis. 

Ante esta “crise inevitável, e muito mais cedo que tarde, sairão pensadores, guias, organizações sociais e políticas da mais diversa índole que farão o máximo esforço por preservar a espécie. Todas as águas se unirão em uma só direção para varrer obstáculos” ante o que sugere a semeadura de “ideias, e todas as armas que esta civilização bárbara criou sobrarão. Semeemos ideias, e a destruição irremediável poderá ser impedida do nosso meio natural de vida”. 

É de uma extraordinária vigência o que escreveu Fidel há 20 anos nestes tempos de tentativas de retornos coloniais e quando se acabou o cepo de unilateralidade e se recuperou o equilíbrio necessário para uma Nova Ordem Mundial que está nascendo, entre mudanças que devem nos encontrar preparados e alertas, sem ambiguidades nem debilidades, como continua fazendo Cuba. E como estamos vendo hoje na Venezuela.


As opiniões expressas neste artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul do Global.

Stella Calloni Atuou como correspondente de guerra em países da América Central e África do Norte. Já entrevistou diferentes chefes de Estado, como Fidel Castro, Hugo Chávez, Evo Morales, Luiz Inácio Lula da Silva, Rafael Correa, Daniel Ortega, Salvador Allende, etc.

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