Recentemente, Dina Boluarte evocou uma sinistra figura do terror. O tema surgiu porque à precária inquilina do Palácio não ocorreu outra coisa senão comparar as demandas da oposição com as travessuras de Chucky, o estranho personagem criado pela fantasia. A história não é propriamente nova.
Foi idealizada por Don Mancini há alguns anos, à luz de uma ficção. Segundo ela, o detetive Mike Norris matou a tiros o assassino Charles Lee Ray. Este, antes de expirar, mediante procedimentos de magia Vodu, conseguiu transferir sua alma para dentro de um boneco que ele chama de Chucky, que Karen Barclay comprou para seu filho, o pequeno Andy.
Quando Chucky – iniciando uma série de crimes – matou a babá de Andy, o menino percebeu que o boneco tinha vida própria, razão pela qual informou o fato, para evitar se tornar a próxima vítima desse boneco monstruoso.
O tema abordado pela írrita “mandatária” não tem relação alguma com a imaginação maléfica desse curioso autor de relatos fictícios. Nem a imaginação mais prolífica poderia vincular esse assassino em série ao que hoje os observadores políticos do nosso tempo questionam. O que se demanda de Dina Boluarte não é que ela dê vida a bonecos, pratique a magia Vodu, nem se internalize na alma de ninguém.
Simplesmente que deixe que as investigações em torno de seus atos fluam naturalmente e não sejam obstaculizadas por ações que, no final, não fazem outra coisa senão desqualificar ainda mais sua própria e já deteriorada imagem.
Por exemplo, quando a senhora pede que a Promotoria não investigue mais as matanças de peruanos ocorridas entre 2022 e 2023 em distintos locais do país; ou que sejam canceladas as denúncias referentes ao uso de relógios Rolex e outras joias.
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E isso se torna ainda mais evidente quando se trata de investigações sobre os veículos presidenciais e a presença nas proximidades de Pisco do “Cofre”, em 24 de fevereiro passado.
Afirmar que isso não pode ser informado porque se trata de atividades vinculadas à “intimidade pessoal da mandatária” é simplesmente abrir uma Caixa de Pandora, um convite à especulação desenfreada em um país de engenhosa curiosidade.
Poderia ser compreensível que as autoridades competentes não explicitem a rota que um veículo oficial seguirá no futuro em seus deslocamentos formais, mas sustentar que isso não pode ser revelado quando se refere a um incidente ocorrido há oito meses, carece completamente de sentido.
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Nenhuma “razão de segurança” poderia justificar uma objeção desse caráter.
E proibir que o motorista desse veículo preste depoimento em investigações formais, só confirma a ideia de que o que se busca é ocultar fatos e negar evidências. E no extremo, pedir que as perguntas sejam formuladas “por escrito” para elaborar as respostas conforme a conveniência, exigindo ademais que não estejam vinculadas à atividade “pessoal” de Dina Boluarte, é francamente ridículo.
Há coisas importantes a investigar em um país como o nosso. Mas, no caso destes dias, o assunto é ainda mais sugestivo. Os incêndios florestais que se alastram por nossa Amazônia fazem parte desse quadro geral.
A senhora Boluarte disse sem rodeios que isso deve ser atribuído aos próprios moradores. São eles que queimam os pastos e geram o fogo que arrasa as florestas, tem afirmado, exigindo em voz alta que “apaguem seu fósforo”.
Foi essa uma maneira de reincidir em uma prática usada por esta administração: culpar as vítimas por tudo o que acontece, para salvar a responsabilidade das autoridades, ou seja, dos algozes.
Algo similar pode ser dito em relação ao crescente “caso” das extorsões e da corrupção. Como o governo não tem nenhuma proposta para encarar essa crise, salvo incrementar as penas e encarcerar pessoas, recorre ao mesmo: a cidadania não denuncia, não colabora, só critica, a culpa é “das pessoas”.
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Nesse caso, teríamos que concordar que, em todo caso, o mais parecido com um boneco falante seria o governador de Ayacucho, Wilfredo Oscorima. A noiva de Chucky – Tiffany – poderia muito bem ser a senhora que hoje fala desde o Palácio do Governo, sem ideias, sem respaldo cidadão e que desapareceu no dia da Greve dos Transportes, talvez por razões de sua “intimidade pessoal”.
A senhora Boluarte não tem influência, prestígio, credibilidade, autoridade, nem apoio cívico; por isso, é incapaz de esboçar qualquer política que garanta algo à população.
A Noiva de Chucky é tão inútil nesse assunto quanto é a “wuayki” do senhor Oscorima no Palácio.
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