Numa sacada ousada, o ministro da Fazenda reiterou seu objetivo de zerar o déficit público já em 2024. Para os céticos do mercado financeiro, conseguir o feito depende da redução dos gastos e nada há na proposta orçamentária nem nas leis complementares que aponte nessa direção.
Para os otimistas, adeptos do desenvolvimentismo e do próprio governo, depende do aumento de arrecadação e do desenvolvimento da economia, ou seja, a retomada da atividade econômica produtiva, com ênfase na reindustrialização.
Os céticos apostam na manutenção do status quo, que é uma economia paralisada por décadas, apoiada unicamente no agronegócio e na exportação das commodities. Os otimistas apostam na retomada do setor industrial, como dissemos, na economia produtiva. Capitalismo produtivo versus capitalismo financeiro.
Vai funcionar se houver uma retomada do investimento em infraestrutura, seja investimento direto do Estado seja pela iniciativa privada ou as parcerias público-privadas e foco na reindustrialização, com ênfase na indústria da construção (Minha Casa, Minha Vida, entre outros). Aí a economia começa a girar, o consumo aumenta, incorpora-se mão de obra, ou seja, entra-se no círculo virtuoso, superando, deixando pra trás o círculo vicioso da recessão que por décadas nos legou uma estagflação, agravada no último quadriênio em que a gestão pública ficou a cargo dos militares.
Alguns passos estão sendo dados corretamente, como, por exemplo, o anúncio da Transpetro (estatal do transporte do petróleo) de que lançará já em janeiro licitação para compra de 25 navios de grande porte, com capacidade para 80 mil toneladas de petróleo ou gás, com recursos do PAC, e que deverão ser fabricados nos estaleiros nacionais, recuperando a indústria naval.
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A indústria naval foi das mais prejudicadas, vítima das sabotagens à indústria nacional patrocinada pela Operação Lava Jato, orquestrada pelos Estados Unidos para acabar com a concorrência no setor de engenharia e de grandes obras.
Para a mídia isso é um horror, repetição de erros do passado.
O que querem os globalistas? Comprar na Ásia, onde é mais barato. Fizeram isso nos últimos seis anos, governo do ilegítimo Michel Temer e governo ilegítimo dos militares das forças armadas.
Foto: Leopoldo Silva/Agência Senado
Há avanços na questão tributária que penalizava o pobre e favorecia o rico. Uma inversão difícil com um Congresso hegemonizado pelos ricos
É muito controverso isso de mais caro ou mais barato. Comprar uma plataforma de petróleo em Singapura é mais barato do que comprar nos estaleiros do Rio Grande do Sul, dizem. Não consideram que comprando na Ásia se está pagando em dólares, gastando divisas, dando emprego e ajudando o desenvolvimento lá deles.
Comprando no Brasil, é mais caro, mas se paga em moeda nacional. Não é gasto, é investimento que gera empregos diretos e indiretos, faz a economia funcionar para felicidade geral da nação.
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Na campanha Lula dizia pretender colocar o pobre no orçamento e o rico no imposto. Também há avanços na questão tributária que penalizava o pobre e favorecia o rico. Uma inversão difícil, posto que o Congresso é hegemonizado pelos ricos. Mas, assim mesmo é um avanço o que se conseguiu.
Valorização do Salário Mínimo, isenção do Imposto de Renda para quem ganha até dois salários, taxação dos fundos privilegiados e das aplicações no exterior. É um começo em direção a uma maior justiça tributária que ainda está por vir.
Taxação de algumas fortunas podem render R$ 45 bilhões ao governo.
Os fundos exclusivos são aqueles que possuem um único investidor e somam R$ 756,8 bilhões e contemplam 2,5 mil investidores. Os fundos offshore, que são as aplicações no exterior, notadamente em paraísos fiscais, somam nada menos que R$ 1 trilhão. A ideia é cobrar de 15% a 20% sobre o rendimento. Se o capitalista optar por valer já este ano. será cobrado apenas 10%.
Dia 22 de agosto os deputados aprovaram o Novo Arcabouço Fiscal, margem folgada de 379 a favor com 64 votos contra. Este acaba com o famigerado Teto de Gastos, mas está também amarrado. Autoriza despesas acima da inflação, um crescimento de 0,6% a 2,5% do PIB dos gastos desde que no limite de 70% do aumento da arrecadação. 0,6% do PIB destinado a investimento em 2024 fica em 68 bilhões. O PAC, até o fim do mandato, projeta R$ 249 bilhões. Pode ser mais que isso, dependendo da arrecadação
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O PAC projeta R$ 612 bilhões do setor privado, R$ 343 bilhões das estatais, além dos R$ 362 bilhões em financiamento.
A aprovação custou 5,3 bilhões em Emendas Pix, ou seja, cheque em branco. O dinheiro vai para estados e municípios para gastar à vontade.
Despesas com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação – Fundeb –, e Fundo Constitucional do Distrito Federal ficam fora do limite de gastos.
Paulo Cannabrava Filho, jornalista editor da Diálogos do Sul e escritor.
É autor de uma vintena de livros em vários idiomas, destacamos as seguintes produções:
• A Nova Roma – Como os Estados Unidos se transformam numa Washington Imperial através da exploração da fé religiosa – Appris Editora
• Resistência e Anistia – A História contada por seus protagonistas – Alameda Editorial
• Governabilidade Impossível – Reflexões sobre a partidocracia brasileira – Alameda Editora
• No Olho do Furacão, América Latina nos anos 1960-70 – Cortez Editora
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