O ministro da Justiça Sergio Moro autorizou o emprego da Força Nacional na sede da Fundação Nacional do Índio (Funai), em Brasília, entre os dias 11 e 13 de março. A medida ocorre na mesma data em que uma delegação de 120 lideranças indígenas de povos do sul e extremo sul da Bahia e outra de 70 lideranças da bacia do Xingu se encontram na capital federal e cobre, basicamente, as datas em que os indígenas teriam agendas na Funai e no próprio Ministério da Justiça (MJ).
A determinação de Moro foi feita por meio de uma portaria publicada nesta quarta (11) – mesmo dia em a delegação dos povos Pataxó, Tupinambá, Pataxó Hã-Hã-Hãe e Kamakã fez um ato em frente ao MJ para tentar obter respostas sobre um pedido de agenda com o ministro. Depois de muita pressão, uma comitiva de lideranças foi recebida pelos secretários executivo e adjunto do MJ, mas sem a presença de Moro. O pedido de agenda com o ministro havia sido feito ainda em fevereiro.
A portaria garante o apoio da Força Nacional “nas ações de preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, na defesa dos bens e dos próprios da União” no prédio onde fica a sede nacional da Funai.
Tiago Miotto/Cimi
PM e Força Nacional aguardavam indígenas na frente do Ministério da Justiça e acompanharam de perto lideranças recebidas em reunião.
Também em fevereiro, a Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do extremo sul da Bahia (Finpat) havia solicitado oficialmente uma agenda com o presidente da Funai, o delegado Marcelo Xavier. No mesmo dia da portaria de Moro, obtiveram a confirmação de duas agendas: uma na tarde de quinta-feira (12), para atender aos povos Pataxó e Kamakã, e outra na manhã de sexta-feira (13), para atender ao povo Tupinambá.
O uso da Força Nacional e a divisão da delegação desagradaram os indígenas da Bahia. Ontem, ao chegar no MJ, as lideranças também encontraram forte policiamento, com a presença do batalhão de Choque da Polícia Militar e da própria Força Nacional, que acompanhou inclusive a comitiva de lideranças que foi recebida pelos secretários no interior do MJ.
“Isso é uma decisão arbitrária, porque já temos agenda marcada, e ficamos surpresos de ver esse governo truculento que nos recebe com a Força Nacional dentro da Funai”, critica o cacique Sival Tupinambá, da Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença. “A gente vê a divisão da nossa delegação como um processo de tentar dividir o povo e tentar enfraquecer os povos da Bahia, para não dar resposta sobre a demarcação de nossas terras tradicionais”.
Nas primeiras horas da manhã desta quinta-feira, funcionários da Funai registraram a presença de policiais da Força Nacional na entrada do prédio. No final da manhã, os indígenas dos povos Kayapó, Panará e do Território Indígena do Xingu, que tinham reunião agendada com o presidente do órgão, também ficaram indignados com a presença da barreira da Força Nacional.
“A Funai não recebe os índios que estão a favor da floresta, nem os índios que são contra mineração e contra o PL 191. Chegamos aqui e nos deparamos com a Força Nacional. Isso é certo? Antes, quando garimpeiros e madeireiros invadiam nosso território, a Funai acionava a Força Nacional para tirar os invasores. Mas hoje não, eles estão contra nós. Parece que a ditadura está voltando”, reclama Mydjere Kayapó, do Instituto Kabu e da Rede Xingu +.
Em nota de repúdio, o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) afirmou que o pedido de presença da Força Nacional feito pela Funai na semana em que o órgão recebe reivindicações de povos indígenas “contraria sua missão constitucional”.
“O CNDH repudia a solicitação feita pela Funai e a determinação de utilização da Força Nacional por parte do Ministro da Justiça e Segurança Pública como ação intimidadora da legítima manifestação dos povos indígenas”, afirma a nota.
Retrocesso nas demarcações
A TI Tupinambá de Olivença e a TI Barra Velha, esta do povo Pataxó, estão entre as 17 terras em estágio avançado de demarcação que foram devolvidas à Funai pelo Ministério da Justiça e pela Casa Civil, para que sejam reavaliadas com base no Parecer 001/2017 da Advocacia-Geral da União (AGU), considerado inconstitucional.
Os Pataxó e os Tupinambá cobram que as terras sejam devolvidas ao MJ e tenham suas portarias declaratórias publicadas. As duas terras tem decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF) retirando qualquer impedimento para a publicação das portarias e garantindo a posse do território aos indígenas.
*Com informações do Instituto Socioambiental (ISA)
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