Em tempos de discurso controlado, xiitas do controle ambiental, feminazis castradoras, pretos abusados, trabalhadores mal criados e bichas alegres, inaugura-se no mais belo país do mundo, uma nova forma de turismo capaz de oferecer uma experiência única e de intensidade indescritível, capaz de extravasar toda a raiva e recalque devidamente alimentados pela ignorância: a caça ao pobre.
A implementação desta indústria, que o governo entende capaz de reativar a economia e colocar o Brasil em evidência no mundo, se deu após um projeto de longo prazo que visou uma meticulosa estruturação do projeto de modo a fornecer ampla variedade de caças ao mesmo tempo em que assegura a todos os ávidos turistas segurança física e jurídica contra a violência e contra possíveis complicações de processos judiciais inerentes ao encerramento de uma vida humana.
Centro de Estudos Victor Meyer
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Inicialmente, dirigindo-se a assegurar a profusão de presas, paulatinamente se obstaculizaram as oportunidades aos jovens através de uma educação sofrível, que é responsável por uma das mais baixas produtividades do trabalhador do mundo associado a mais completa ignorância da realidade pela população. Assim, toda uma geração de uma das nações mais populosas do mundo passaram a alternar sentimentos cada vez mais fortes de desesperança e desespero, sem a capacidade de traduzir em alternativas viáveis de mudança de sua realidade.
Outro elemento de longo prazo muito importante ao processo foi a completa renúncia dos interesses estratégicos nacionais. Com a alienação de ativos e de conhecimento especializado, com a abertura internacional sem proteção das empresas brasileiras, as perspectivas de emprego tornaram-se cada vez menores.
Já no médio prazo, aprofundou-se o quadro, com a deterioração dos empregos existentes, atribuindo-se ao trabalhador a causa da perda de dinamismo econômico. Sucessivamente, repetidas restrições à proteção à velhice e à invalidez foram adotadas nos últimos anos de modo a tornar o idoso arrimo de família, deixando o jovem, a nossa melhor caça, por mais tempo ocioso e sem perspectiva.
Atualmente o processo encontra-se em sua última fase de implantação, com o aprofundamento das medidas de longo prazo e, por fim, a iminente concessão de licença para matar para as forças de segurança e a completa apropriação pelas corporações de serviços públicos do orçamento destinado à prestação do serviço. Assim, como há policiais bem remunerados, mas não há condições operacionais de investigar; há médicos, mas sem condição de prestar serviços de saúde, se terá o caldo perfeito em que o desespero e desesperança levaram à informalidade e à agressividade, justificando que, a pretexto de defesa, se possa caçar livremente.
Não podemos esquecer é claro da demonização do ensino libertador e de culpar o professor por todos os problemas. Assim pode-se dar início à fase de implantação irrestrita de ensino à distância, que a pretexto de reduzir custos e melhorar a eficiência, na verdade tira do pobre até mesmo o uniforme de estudante, evitando imagens sensibilizadoras de crianças assassinadas com uniforme escolar. Agora é simples: é pobre, tá morto, é bandido.
O início da temporada está marcado para 02.01.2019. Os governadores mais empolgados com o projeto mostraram-se em polvorosa na ânsia de trazer mais receitas e turistas. O de São Paulo já prometeu os “melhores advogados” para os assassinos de farda, assegurando que a partir de janeiro “a polícia vai atirar para matar”. Possivelmente, como mediaman, já está imaginando um a montagem de um reality show judicial de casos selecionados para manter o ânimo da população com a atividade. O do Rio de Janeiro foi ainda mais longe, disse que colocaria atiradores de elite apontados para a favela para que colaborassem com a caça, o que deu garantia de salvo conduto para qualquer particular que queira brincar de tiro ao alvo com favelados. Afinal, se não há investigação, a posse de arma é legal e a polícia já está com os fuzis apontados, é impossível a verificação da autoria dos disparos.
Preocupado com possível concorrência entre os estados, o futuro ministro da defesa declarou que adotará a proposta nacionalmente. Para justificá-la, afirmou que foi utilizada com êxito no Haiti. É, Caetano e Gil já avisavam: O Haiti é aqui!
Como tudo no país é grande, a temporada, depois de iniciada, não tem previsão para acabar. Os organizadores entretanto assumem que podem interromper o projeto caso o povo se conscientize da própria história e declare a situação como uma versão híbrida de genocídio, ou a avant garde do Holocausto.
*Advogado em Brasília, colaborador de Diálogos do Sul
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