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Cadernos de Terceiro Mundo | A vida e o legado de Emiliano Zapata: o maior líder camponês da América Latina

Seu legado de luta ainda é presente no imaginário social de grande parte da sociedade latino-americana
Gabriel Rodrigues Farias
Diálogos do Sul
Rio de Janeiro (RJ)

Tradução:

No último sábado (10/04), completaram-se 102 anos da morte do líder revolucionário mexicano Emiliano Zapata.

Dentro da história mexicana, e da América Latina como um todo, é inegável a importância da figura de Zapata. Seu legado de luta ainda é presente no imaginário social de grande parte da sociedade em sua terra natal, principalmente para aqueles que ainda lutam por justiça social. Por conta disso, vamos resgatar uma importante reportagem, datada de 1977, sobre a história e o legado desse importante líder revolucionário.

Na reportagem, foram feitas algumas entrevistas com ex-combatentes do Exército de Zapata por Francisco Julião. Durante os anos em que viveu exilado no México, o famoso fundador das Ligas Camponesas fez um importante trabalho de resgate da memória das lutas dos camponeses mexicanos liderados por Emiliano Zapata, entrevistando dezenas de velhos combatentes, sobreviventes da revolução do início do século.

Reproduzimos a seguir trechos desse importante depoimento. Antes disso, devemos avisar que o texto original está disponível completo em espanhol, entretanto, em 1994, em um especial de 20 anos da existência da Cadernos, a revista fez um resumo da reportagem de 1977 em português.

Por isso, no final da postagem, vamos deixar os dois links, tanto da reportagem de 1977 quanto da do resumo de 1994. Segue abaixo o relato de Francisco Julião:

Seu legado de luta ainda é presente no imaginário social de grande parte da sociedade latino-americana

Clacso
102 anos da morte do líder revolucionário mexicano Emiliano Zapata.

O maior líder camponês do continente

‘’Quando cheguei ao México, exilado, me aconselharam por questões de saúde a me instalar na cidade de Cuernavaca, no estado de Morelos, terra de Zapata. ( … ) Pouco a pouco, fui descobrindo que lá ainda viviam velhos soldados que lutaram junto com o líder camponês e que inclusive conservavam as armas de 1910. 

Daí me veio a ideia de fazer um trabalho de sistematização das informações que eles guardavam em sua memória, para ajudar que o testemunho desses homens não se perdesse, gravando suas vozes, tirando suas fotos, entrevistando-os

( … ) Consegui entrar em contato com eles através do tenente- coronel J. Trinidad Machuca, homem de 86 anos, ao qual por sua vez fui apresentado por um escritor inglês, Cedric Belfrage 

Fomos visitar o coronel justamente no dia do aniversário da morte de Zapata, um 10 de abril. No que foi o seu quartel-general, hoje convertido em um museu, assistimos a uma cerimônia em homenagem ao general Emiliano. Ali, o tenente-coronel Machuca me conta que pertence a uma Associação de Veteranos Zapatistas, que funciona na cidade de Cuautla e se oferece para me apresentar a seus companheiros. A Associação reunia mais de 300 combatentes autênticos dos três períodos revolucionários

“Falando com os velhos combatentes, compreendi que o problema continuava sendo a terra. Me senti como um peixe na água …”

Já entrevistei mais de 200 zapatistas e faltam uns 30. Morelos é o berço do Zapatismo e a maior parte deles vive aqui. São homens pobres, não encontrei nenhum rico. E todos levam uma vida muito honrada. Quando jovens, em mais de 90% dos casos, eles trabalhavam como peões, levavam uma vida muito dura, em um regime de virtual escravidão. ( … ) E preciso entender uma questão: Zapata nunca saiu da legalidade.

Classe legalista

Se existe uma classe legalista é a camponesa. Zapata é o herdeiro e continuador de uma série de caudilhos que lutaram para que os títulos de propriedade das comunidades agrárias fossem respeitados. Os títulos tinham sido concedidos pelo vice-rei da Espanha, durante a colônia. Mas essas terras foram completamente ocupadas pelos latifundiários que cultivavam a cana-de-açúcar.

Zapata se rebelou para recuperar as terras das comunidades camponesas. Reivindicava a divisão das terras e sua entrega aos agricultores.

Terra, água, lei e justiça resumiam seu ideário.

Incorpora a água porque também os rios, açudes etc. estavam sob controle dos latifundiários, um fenômeno que se conhece desde a Idade Média

( … ) Através dos testemunhos que colhi, se poderia descrever Zapata a partir de três ângulos: a figura histórica, o homem Zapata e a figura mítica.

Os representantes do primeiro grupo – os “historiadores” – aos quais não considero os mais autênticos, se preocuparam em conhecer o que se escreveu sobre a epopeia zapatistaponto de vista histórico 

O segundo grupo, dos analfabetos, se divide em dois. Há os que falam da figura humana e os que se referem à figura mítica. Estes últimos não aceitam, sob nenhuma hipótese, que Zapata tenha sido assassinado. Inventam que um outro companheiro, muito parecido ao caudilho, morreu voluntariamente em seu lugar e que um compadre árabe o levou para a “Arábia”, onde teria morrido de velho depois de retornar algumas vezes à sua terra natal. . 

E uma lenda muito bonita, que faz lembrar o inconformismo dos primeiros cristãos, que não aceitaram a morte de Cristo e o ressuscitaram.

Isso acontece com os grandes líderes. Por seu carisma, identidade com os problemas das massas, por sua autenticidade, não morrem. ( … )

No coração daqueles que seguiram Zapata, ele continua sendo a grande esperança, já que muitos dos problemas vinculados à terra ainda se mantêm. ‘’

‘’Los veijos soldados de ZAPATA’’ por Equipe Cadernos do Terceiro Mundo

Memória

Tema complexo, que requer uma análise de longo prazo e a compreensão da geopolítica atual. Para uma visão histórica do tema, compartilhamos reportagem publicada na revista Cadernos do Terceiro Mundo de 1997.

A Diálogos do Sul é a continuidade digital da revista fundada em setembro de 1974 por Beatriz Bissio, Neiva Moreira e Pablo Piacentini em Buenos Aires:

A recuperação e tratamento do acervo da Cadernos do Terceiro Mundo foi realizada pelo Centro de Documentação e Imagem do Instituto Multidisciplinar da UFRRJ, fruto de uma parceria entre o LPPE-IFCH/UERJ (Laboratório de Pesquisa de Práticas de Ensino em História do IFCH), o NIEAAS/UFRJ (Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre África, Ásia e as Relações Sul-Sul) e o NEHPAL/UFRRJ (Núcleo de Estudos da História Política da América Latina), com financiamento do Governo do Estado do Maranhão.


Textos publicados originalmente na página Revista Cadernos do Terceiro Mundo – Acervo Digitalizado

TERCER MUNDO. Ciudad de México: Tercer Mundo Ltda., ano 2, n. 11, mar-abr. 1977, p. 92-112

As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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Gabriel Rodrigues Farias

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