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ToggleA insistência do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, de uma iminente invasão militar russa à Ucrânia recorda a tática de Josef Goebbels da mentira repetida, base de justificativa hitleriana para invadir a Polônia por Westerplatte em 1º de setembro de 1939 e começar assim a Segunda Guerra Mundial.
O preocupante é que a campanha cresce acompanhada de um movimento militar que não pode ser pior. As forças russas realizam a partir de suas duas bases, naval e aérea, na costa síria, os maiores exercícios militares que se recordem nas águas do Mediterrâneo e provaram com êxito novas armas dissuasivas, em resposta às ameaças da OTAN.
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Em Washington, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, convocou uma reunião de seu Conselho de Segurança Nacional em meio de uma intensificação de sua campanha sobre o presumível ataque de Moscou à Ucrânia. O chanceler russo, Serguéi Lavrov, qualificou todo esse noticiário do Ocidente sobre a “guerra fantasma” contra a Ucrânia de terrorismo informativo.
Os líderes das regiões separatistas de Donetsk e Lugansk, no leste da Ucrânia, executam uma mobilização geral, com a ativação militar total de seus efetivos e a transformação da economia, após a evidência de ameaça imediata de uma agressão das forças ucranianas que seria ordenada pelo presidente Volodymyr Zelensky e que já provocou uma evacuação em massa de seus habitantes para a Rússia.
Essa situação levou o ministro de Defesa bielorrusso, Víktor J Renin, a advertir que há um cheiro de pólvora muito forte na região e que a Europa se vê empurrada à guerra, motivos pelos quais a Rússia e a Bielorrússia decidem prolongar os simulacros conjuntos devido à escalada do conflito em Donbass.
The White House / Wikimedia Commons
Segundo ministro de Defesa bielorrusso, Víktor J Renin, há um cheiro de pólvora muito forte na região
Dúvidas razoáveis
A invasão à Ucrânia, prognosticada pelo chefe da Casa Branca, não se deu em 16 de fevereiro como sugeriam; segundo ele, os informes de sua equipe de inteligência o pospõe agora para as próximas semanas ou dias – sem data nem hora fixa como da vez anterior – com o que põe em dúvida a credibilidade de seu aparelho de espionagem e a identificação de seus sócios da OTAN com a estratégia que está seguindo, ou com o desenvolvimento de uma guerra.
Mentir assim não é novidade na Casa Branca. Aconteceu há muitíssimos anos com a auto explosão do vapor Maine em Cuba para tentar se apoderar dessa ilha do Caribe, então nas mãos dos espanhóis.
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Porém, mais recentemente no Vietnã, com os famosos acontecimentos do Golfo de Tonkin inventados por Lyndon B. Johnson em 1965 para invadi-lo, ou com o Iraque com as supostas armas de destruição em massa de Saddam Hussein que nunca apareceram, para justificar a invasão, a matança de milhares de civis iraquianos, deixar em ruínas o Iraque e todo seu patrimônio cultural e arquitetônico, entre os mais valiosos do mundo, ocupar esse país e roubar-lhe o petróleo.
Por certo, o Center for Public Integrity documentou posteriormente que o governo do presidente George W. Bush fez um total de 935 declarações falsas entre 2001 e 2003 sobre a suposta ameaça do Iraque aos Estados Unidos. Desconheço se tem alguém contabilizando as informações de Biden sobre a invasão russa.
O xis do problema
A trama do assunto será conhecida a qualquer momento e se conhecerão totalmente os apuros de Biden para sair do buraco em que se meteu por seus erros políticos internos e vontade própria, e não empurrado somente pelos fracassos de seu governo nem pelas pressões de seus adversários trumpistas, mas sim por sua infeliz resposta a exigências do establishment de liderar as mudanças que enterraram para sempre o unilateralismo que norte-americanizada o mundo, e o temor a um retrocesso no hegemonismo surgido a partir do Plano Marshall para o qual é evidente que não estavam preparados nem material nem espiritualmente.
Aqui está o xis do problema e talvez a razão mais profunda do que acontece na Ucrânia, o que está sendo tomado pelos Estados Unidos para tentar dobrar a Rússia em suas demandas relacionadas com os compromissos da OTAN na década dos 90, após a queda da União Soviética, de não se estender para o leste, violados abertamente, e debilitar a aliança entre a China e a Rússia.
Fatos muito parecidos a Yalta
A ideia posta em prática na cúpula de Yalta, em 1945, no fim do nazismo, após uma reunião privada entre Roosevelt e Churchill em La Veletta, capital de Malta, para tentar que Stalin dissesse o que eles queriam, ressuscita agora entre Biden e alguns líderes da OTAN para obrigar Putin a que faça o que convém a eles, e desgraçadamente o que parece lhes interessar é a guerra com todos os riscos que isso significa.
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É provável que as discrepâncias internas – que algum dia serão conhecidas – na União Europeia e na OTAN diante de tais ideias, tenham atrasado uma espécie de Westerplatte na Ucrânia, enquanto Washington incrementa as pressões sobre o Kremlin e cria condições para que o governo de Kiev, do presidente Volodymyr Zelenski lhe faça o jogo, mesmo quando negue três vezes que a Rússia não atacará, esperançado em que os Estados Unidos lhe ajude a cumprir seu objetivo de controlar a região de Donbass e integrar-se à aliança atlântica
Sem evidencias da unidade proclamada pelos EUA
Há dúvidas de que Biden tenha conseguido unidade em tudo isto ou que foi uma panaceia a vídeo chamada da sexta-feira, 18 de fevereiro, com o chanceler alemão Schultz, o canadense Justin Trudeau, os mandatários da França, Emmanuel Macron, da Itália, Mario Draghi e do Reino Unido, Boris Johnson, representantes da Comissão Europeia e seu Conselho.
Chama a atenção que os únicos que aventuraram a replicar o anúncio feito por Biden em entrevista coletiva premeditadamente convocada pouco depois da videochamada, de que a Rússia atacaria a Ucrânia, foram seu secretário de Estado, Antony Blinken, e o chefe da OTAN, Jens Stoltenberg, o que poderia ser interpretado como a existência de uma crise no flanco Oriental da OTAN e em suas pretensões de liderança na Europa.
Há um artigo muito ilustrativo desta situação recentemente escrito por Jack F. Matlock, ex-embaixador dos Estados Unidos em Moscou (1987-1991), o qual qualificou de farsa a campanha desatada contra a Rússia e seus presuntos planos de invadir a Ucrânia. Adverte que estamos assistindo a uma elaborada farsa, grosseiramente magnificada por destacados meios de comunicação estadunidenses, para servir a um fim político interno.
O que o presidente Vladímir Putin exige, o fim da expansão da OTAN para o leste e a criação de uma estrutura de segurança na Europa que garanta a segurança da Rússia junto com a dos demais, é eminentemente razoável, diz o ex-diplomata.
Matlock deixa bem claro as coisas: Putin nunca ameaçou reabsorver os países bálticos nem reclamar nenhum de seus territórios. Se a OTAN não tivesse se expandido para o leste após o final da guerra fria, ou se a expansão se houvesse produzido em harmonia com a construção de uma estrutura de segurança na Europa que incluísse a Rússia, esta crise não existiria.
Ex ministro da defesa alemão e o embaixador da Rússia nos EUA
São muito importantes neste contexto as recentes declarações de Willy Wimmer, ex-secretário de Estado do Ministério da Defesa da Alemanha (1985-92), o qual alertou que a expansão da OTAN para o leste da Europa gera uma justificada sensação de ameaça na Rússia, devido a que contraria as promessas feitas pela própria aliança.
Vamos por muito mal caminho, advertiu ao comentar a recente publicação pela revista Der Spiegel de um documento desclassificado que confirma que a OTAN não cumpriu a promessa que fez a Moscou em 1991, de não se expandir para o leste.
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Recordou que já em 1989 expôs ao então chanceler da Alemanha, Herman Kohl, sua postura sobre a participação das forças da Bundeswehr na OTAN e sua presença no Europa, “os pontos da qual entraram em sua totalidade nos acordos sobre a reunificação alemã”.
Essas afirmações acabam de ser confirmadas pelo embaixador da Rússia nos Estados Unidos, Anatoli Antonov, em uma entrevista à cadeia CBC e em posteriores declarações à imprensa, quando assegurou que “não pretendemos apoderar-nos de nenhum território estrangeiro”, e “eu gostaria de confirmar que Donetsk e Lugansk formam parte da Ucrânia”. “O problema atual não é a Ucrânia, o problema é qual será o futura ordem mundial, se podemos elaborar conjuntamente garantias firmes de segurança para todos sem violar o importantíssimo princípio da indivisibilidade da segurança”.
O plano de Biden não se deteve
A partir dessa realidade inescusável se entendem claramente certos antecedentes até agora um pouco obscuros, como o ocultamento por parte dos Estados Unidos da resposta ao porque Washington começou a se retirar dos tratados de controle de armas que haviam provocado uma irracional e perigosa corrida armamentista, básicos para pôr fim à guerra fria, como o de Mísseis Antibalísticos (Tratado ABM).
Também se entende a resistência de Zelenski de não querer se sentar para negociar os acordos de Minsk como lhe pede insistentemente Putin para terminar o conflito interno, e que nos cadernos de negociações da Casa Branca e do Pentágono nem sequer apareça o nome dessa cidade capital da Bielorrússia como uma alternativa para evitar a escalada do conflito quase de forma imediata..
O plano de Biden não se deteve, nem parece que se deterá apesar de todas as suspeitas expressadas por Matlock e outros muitos analistas.
A evacuação de civis do leste ucraniano à Rússia é consequência direta do terror midiático com o qual Biden se revela como grande goebbeliano, e não de um teimoso do Kremlin como diz o próprio presidente dos Estados Unidos. É resultado específico da gravidade e do alto temor que geram suas declarações e as ameaças de “severas respostas” se Moscou invadir, repetidas agora como papagaio pela vice-presidenta Kamala Harris, a qual ameaçou com uma resposta “rápida, severa e dura”.
Tais declarações são recriadas em um entorno belicoso preconcebido para tentar revesti-las de credibilidade, como fizeram no Iraque. Ao mesmo tempo, revelando o jogo de Zelenski, o exército ucraniano bombardeia a região e inclusive o território russo, sob o argumento estadunidense da presumida invasão.
Ao mesmo tempo, como nos filmes de Hollywood em seu clímax, uma conversação telefônica do chefe do Pentágono, Lloyd Austin, com o titular da Defesa da Rússia, Serguei Shoigu, é enfocada mentirosamente como uma frustrada tentativa diplomática da Casa Branca de evitar a guerra.
Diferenças entre Biden e Goebbels
Há uma diferença importante entre o sentido das mentiras de Biden e as que elaborou Goebbels para Hitler em 1939, e é que enquanto Alemanha estava então convencida de sua força quando preparou o golpe de mão que lhe permitiria tomar a Westerplatte polaca e seus cálculos de vitória os estimava como muito reais, no caso atual dos Estados Unidos nenhum general, por muitas estrelas que tenha em seus ombros, pensaria a mesma coisa.
Não se trata somente da medição matemática que indica uma superioridade militar da OTAN e seus aliados 80-20 sobre a da Rússia, mas sim que nesta ocasião existe uma espoleta atômica inexistente em 1939 que pode ser acionada automaticamente, e uma depressão econômica potencialmente mais severa que a do crack bancário de 1929 ou a imobiliária de 2008 que pôs o mundo de cabeça para baixo.
Ambas, além disso, transcorreram sem pandemia e sem a crise do espírito como agora, de uma sociedade perigosamente dividida e distanciada de seu presidente, a qual permite que um golpista que provocou mortes e danos esteja livre e, embora tenha rompido a ordem institucional, aspire regressar à Casa Branca como presidente eleito. Algo anda muito mal nesse país.
Luis Manuel Arce Isaac, jornalista Prensa Latina
Tradução Beatriz Cannabrava
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