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ToggleAo concluir este complicado ano de 2022, voltou à ordem do dia um dilema que assumiu conotação decisiva nas últimas décadas do Peru: Quem vence quem? A nova oligarquia alimentada pelo empresariado, a “Grande Imprensa”, o Ministério Público e outros entes do Poder Estatal, ou o povo, que se bate em distintos rincões do país e luta em condições adversas, mas possui uma força colossal.
Olhando bem, esta contradição que hoje agita a sociedade peruana se incubou com força há mais de 240 anos, quando José Gabriel Túpac Amaru se levantou em armas contra o Poder Imperial.
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Poderia ter vencido, o que teria mudado a história, mas isso não ocorreu. Foi derrotado, o que fez com que a vida nacional fluísse quase sem grandes confrontos, pela égide de uma Classe Dominante que nunca foi capaz de construir um modelo de país, nem estimular seu bem-estar, nem o seu desenvolvimento.
Houve vislumbres no registro histórico. Ramón Castilla, que aboliu a escravidão, foi um deles. E Andrés Avelino Cáceres, na sua primeira época, foi outro. Mas só no século vinte o confronto tomou um signo definido. Foi a experiência de Velasco Alvarado que mostrou o caminho e marcou uma rota que hoje seguem os povos.
Em nosso tempo, o confronto que se perfila no cenário peruano adquiriu forma em 2011, quando o povo ungiu como mandatário Ollanta Humala. Independentemente de seus méritos – ou deméritos – pessoais, personificou uma demanda popular legítima, que foi adquirindo dimensão crescente desde então.
Em 2016, ela se expressou na derrota de Keiko Fujimori, símbolo vivente de um passado vergonhoso, e em 2021 adquiriu um novo viés com a vitória de Pedro Castillo.
Ponto a ponto: as falhas e ilegalidades do Congresso e da Justiça do Peru contra Castillo
A resistência da classe dominante tornou ingovernável sua gestão. Desde o início – e ainda antes – não houve um dia em que a oligarquia superada e em derrota clamasse pelo fim de sua administração. Para conseguir esse propósito, todos os recursos foram válidos.
Houve desde as campanhas midiáticas alimentadas pela imprensa lixo, até as acusações mais truculentas, como aquela do heliporto privado de Castillo no campo vizinho à sua casa em Muña e o plano sinistro para “assassinar o Promotor da Nação”. Tudo unido a testemunhos de presumidos “colaboradores eficazes” contribuía para enlodar o professor chotano, o qual se busca mimetizar como uma espécie de Al Capone mestiço.
Reprodução – Twitter
Lisa Kenna, embaixadora dos EUA no Peru, e Dina Boluarte, atual Presidenta peruana
A farsa de 7 de dezembro
No auge dessa ofensiva, foi possível construir a farsa de 7 de dezembro. Hoje, com mais elementos para julgar, pode-se ter uma ideia do que aconteceu então e o que desencadeou a crise. Castillo teria recebido duas mensagens definidas: sua sorte estava lançada no Congresso da República, motivo de sua decisão de fechá-lo; contaria com o respaldo imediato das Forças Armadas. Convencido disso – e talvez também ameaçado – finalmente optou pela declaração que gerou sua queda.
A partir de então abriu passo o verdadeiro Golpe de Estado que acabou com a vontade cidadã consagrada em junho de 2021. Quem pode estar atrás destas ações perversas? Em diversas ocasiões falamos das tarefas e ações da Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos.
A CIA é uma estrutura sólida que tem política própria e opera no mundo ao seu livre arbítrio. Suas linhas grossas respondem aos interesses do complexo militar-industrial que tem em suas mãos as rédeas do Poder na pátria de George Washington; mas tem uma ação relativamente autônoma.
Obra, inclusive, às costas do Poder formal que se expressa na Casa Branca e no mandatário que a ocupa circunstancialmente. Assim ficou demonstrado em diversos episódios da vida internacional.
Embaixada ou “aparelho”?
A atual embaixadora dos Estados Unidos no Peru foi, durante nove anos, agente da Agência Central de Inteligência, e trabalhou sob as ordens de Mark Pompeo, então chefe da entidade, que seria posteriormente Secretário de Estado desse país.
Seguramente por razões de Estado, Lisa Kenna foi designada para trabalhar na representação diplomática dos Estados Unidos no Iraque militarmente ocupado. Depois de tão nutritiva experiência, foi transferida para operar em Lima, e nomeada para esse efeito pela administração de Donald Trump.
Peru está destinado a conquistar um governo do povo e para o povo
Talvez a única atividade oficial que cumprira o general Gustavo Bobbio, à frente do Ministério da Defesa em 6 de dezembro passado, foi recebê-la em seu escritório, fato que ficou registrado para a história. Quando Dina Boluarte assumiu o cargo, a primeira saudação que recebeu veio do Salão Oval, para que ninguém duvidasse da vontade do Amo do Norte.
A segunda presença da senhora Kane nesta crise foi registrada no Palácio de Governo e ocorreu em 12 de dezembro. Um dia depois, foi decretado o Estado de Emergência e a ocupação militar de aldeias e cidades, com a dolorosa sequela que todos conhecemos. Imediatamente depois ocorreria a afetuosa chamada do Secretário de Estado dos EUA. Tudo se tornou evidente.
Agora se inicia 2023. As organizações populares anunciam para amanhã, 4 de janeiro, o reinício da luta. Os Ministros do Interior e da Defesa asseguram ter “tudo previsto”. Tomaram – dizem – todas as medidas e contam com os aparatos necessários para impor “a ordem pública” e “resguardar a propriedade”. Em outras palavras, a paz de cemitérios.
Novamente assume no cenário peruano a mesma interrogação: Quem vencerá quem? A um lado, a Oligarquia armada; e do outro, o povo em combate. Nessas circunstâncias, o poema de Gonzalo Rose adquire uma nova dimensão:
“Feliz ano, fuzil
ensina-me a cantar os anos novos…”
Gustavo Espinoza M. | Colaborador da Diálogos do Sul em Lima, Peru.
Tradução: Beatriz Cannabrava.
As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul
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