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Colômbia: Após breve trégua, violência contra esquerda escala às vésperas da posse de Petro

Somente no início de julho, dois militantes e dirigentes do processo de paz e reincorporação à vida civil foram mortos a tiros
Michele de Mello
Brasil de Fato
São Paulo (SP)

Tradução:

Faltando duas semanas para Gustavo Petro e Francia Márquez assumirem a presidência da Colômbia, o país voltou a registrar assassinatos de ex-guerrilheiros de esquerda, que deixaram as armas após os Acordos de Paz de Havana. 

Somente no início de julho, dois militantes e dirigentes do processo de paz e reincorporação à vida civil foram mortos a tiros. Maicol Andrés Lozano Rojas, um dos dirigentes do Espaço Territorial de Capacitação e Reincorporação do departamento de Caquetá, foi executado em 6 de julho, durante uma chacina que vitimou três pessoas no município de La Montañita, na região amazônica do país.

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Um dia antes, Ronald Rojas, conhecido como “Ramiro Durán”, foi assassinado dentro de casa em Palermo, no sudoeste do país. Durán foi comandante das extintas FARC-EP e era o presidente da Associação de Desmobilizados pela Paz no departamento de Huila.

Somente em 2022, 23 ex-guerrilheiros comprometidos com os Acordos de Paz de Havana foram mortos. Desde 2016, a soma é de 322 ex-combatentes e 1.326 líderes comunitários assassinados, segundo o Instituto de Desenvolvimento da Paz (Indepaz). 

Comissão da Verdade da Colômbia: Como foi construído relatório entregue a Gustavo Petro

A escalada de violência acontece no mesmo momento em que Petro dá declarações defendendo a retomada das negociações de paz com o Exército de Libertação Nacional (ELN)  – maior guerrilha em atividade na Colômbia  – e sinaliza para uma reforma das forças policiais e militares. 

“Vivíamos certa tranquilidade, durante dois meses não haviam assassinado nenhum ex-combatente, o que para a Colômbia é uma surpresa. Depois do recesso das hostilidades durante as eleições foram retomadas as disputas pelo território”, relata o presidente do Instituto de Desenvolvimento da Paz (Indepaz), Camilo González. 

Para o defensor de direitos humanos, apesar de ambos serem líderes regionais da implementação do processo de paz, há diferenças nos dois casos de homicídio. 

Segundo relatos da comunidade de La Montañita, em Caquetá, Maicol Rojas teria sido assassinado por dissidências armadas da extinta FARC-EP. 

“O chamado Comando da Fronteira, que controla a região de Putumayo, na fronteira com o Equador, quer expandir suas fronteiras para o departamento de Caquetá disputando com a Frente Sul-Ocidental, que era dirigido por Gentil Rojas, que foi morto recentemente”, relata.

Para ele, no caso de Maicol, seria um ato de retaliação, por ele se opor à ação das dissidências e sua expansão para além da zona de fronteira. 

As dissidências são setores que não aceitaram participar das negociações de paz em 2016 e se mantiveram em armas, controlando algumas regiões do país. “São grupos que estão recompondo sua influência e controle de território no sul do país, em Caquetá, Putumayo, Cauca e Nariño”, explica Camilo González.

Colômbia: Petro e Márquez oferecem propósito e valor a relatório final da Comissão da Verdade

Já no caso de Ronald, sabe-se que ele sofreu dois disparos de um franco-atirador, quando estava na sua residência. 

“Há muitas hipóteses sobre a responsabilidade. Há quem acredite que são militares, tendo em conta a precisão. São movimentações obscuras nas vésperas da posse de Gustavo Petro”, comenta González. 

Somente no início de julho, dois militantes e dirigentes do processo de paz e reincorporação à vida civil foram mortos a tiros

Opera Mundi
Para o presidente do Indepaz, Camilo González, é urgente ativar um novo plano de segurança dos ex-combatentes

Gestão sangrenta

O atual presidente Iván Duque deixará a presidência em alguns dias como a gestão mais violenta para líderes sociais e assinantes dos acordos. Segundo levantamento do Indepaz, 60% dos homicídios aconteceram durante a gestão de Iván Duque (Centro Democrático). Desde janeiro de 2022, já foram registradas 52 chacinas em distintas regiões colombianas. 

A Colômbia vive 58 anos de conflito armado que já causou 260 mil e 1 milhão de refugiados, segundo relatório da Comissão da Verdade, entregue na última semana.

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Petro e Francia foram eleitos com a promessa de cumprir integralmente os Acordos assinados em 2016, que tiveram menos de 30% do pactado implementado.

Mesmo antes de assumir, o presidente recém-eleito já parece governar o país. 

Petro compareceu à entrega do relatório final da Comissão da Verdade sobre o conflito, criada pelos Acordos de Havana; anunciou diálogos com a Venezuela para retomar a diplomacia; prometeu um cessar-fogo bilateral e negociações com o ELN; anunciou parte do gabinete ministerial; e reuniu-se com seus adversários políticos: Rodolfo Hernández (Liga), candidato de extrema-direita, derrotado no 2º turno, e Álvaro Uribe Vélez (Centro Democrático), ex-presidente e padrinho político de Duque.

Para o presidente do Indepaz, Camilo González, além das medidas já adotadas, é urgente ativar um novo plano de segurança dos ex-combatentes.

“Um plano propondo tratamento judicial especial, em troca da desarticulação desses grupos armados. Também uma grande aliança com o povo, abrir o diálogo nacional, criar acordos regionais, que devem ser incluídos no plano de investimento público. Esse é o grande desafio de uma nova estratégia que altere a dinâmica de guerra do governo atual”, conclui González.

Michelle de Mello | Brasil de Fato
Edição de Rodrigo Chagas


As opiniões expressas nesse artigo não refletem, necessariamente, a opinião da Diálogos do Sul

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